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As vidas que a vacina poderia salvar. Veja histórias de quem morreu às vésperas da imunização

Muitas das 9.357 vítimas da Covid-19 no DF perderam a batalha contra a doença dias antes de estarem aptas a tomar o imunizante

atualizado

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Material cedido ao Metrópoles
Francisco Maia e a filha Valéria
1 de 1 Francisco Maia e a filha Valéria - Foto: Material cedido ao Metrópoles

Faltava um mês para o então presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio-DF), Francisco Maia Farias (foto em destaque), entrar na fila da vacina. A expectativa pelo recebimento do imunizante, no entanto, foi ceifada pela Covid-19. Contaminado em janeiro de 2021, Chico Maia morreu em 17 de fevereiro. Ele deixou a esposa – Solange Pinheiro Farias, com quem compartilhava a vida há 44 anos –, três filhos e seis netos.

“Ele estava numa expectativa grande pela vacina. Um mês após a morte dele, começou a imunização para a faixa etária dele. É uma dor muito grande”, desabafa a empresária e filha de Chico Maria, Valéria Farias, 45 anos.

Francisco Maia e a filha Valéria
Francisco Maia e a filha, Valéria Farias

Francisco Maia faz parte das quase 9,4 mil vidas perdidas para a Covid-19 em todo o DF, e cerca de 530 mil em todo o país. A doença chegou à capital brasileira em março de 2020, com o primeiro caso de infecção confirmado em 5 de março.

Brasília começou a vacinar sua população em 19 janeiro de 2021 e iniciou, no sábado (10/7), o agendamento para imunização de pessoas com 41 anos.

“Meu pai tinha tanta esperança, era tão confiante. Ele queria comprar vacina, colocar o Sesc à disposição para que as pessoas se imunizassem contra essa doença. Ele queria acelerar a vacinação e morreu sem a vacina. Não tenho revolta, acredito no universo, mas o destino dele poderia ser diferente”, afirmou Valéria. “Uma vez eu conversei com ele e disse que o turismo seria muito afetado pela pandemia. Ele disse: ‘Nós vamos vacinar e tudo vai voltar ao normal'”, lembrou a empresária.

Sem vacina e sem UTI

A saga da família de Antônio Gilmário Antunes Marques começou com o agravamento da Covid-19, uma semana antes de o imunizante ser disponibilizado para a faixa etária dele. Em 4 de março, o administrador aposentado de 68 anos foi fazer um exame no Hospital Regional de Taguatinga (HRT) e acabou sendo contaminado pelo coronavírus.

Antônio teve os sintomas da doença agravados; precisou ser internado, mas não havia disponibilidade de vaga em unidade de terapia intensiva (UTI) no DF. Ele necessitava de oxigênio para viver, porém teve de contar com a luta dos filhos para que a hospitalização fosse consolidada via ação judicial.

A filha, Bruna Marques, 40 anos, acompanhou todo processo. Viu o pai ser internado em um hospital público da capital e conseguir leito em UTI somente três dias depois. “Meu pai foi internado em 22 de março. Dias antes, eu mandei mensagem sobre uma matéria que tinha saído, e comentei: ‘Olha, pai. Você já, já vai vacinar’. E ele respondeu que, depois que vacinasse, retomaria as atividades na Portuguesa para complementar a renda”, lembra a filha de Antônio Gilmário.

No dia 26 de março, ele foi intubado. Esperou três dias por UTI. Bruna viu a mãe ser vacinada contra o coronavírus na mesmo data em que o pai foi intubado no hospital, no estado mais crítico da doença. “Eu chorava. Estava muito feliz pela minha mãe, mas chorando pelo meu pai”, lamentou. Foram 27 dias de internação e Antônio não resistiu.

“Se a vacina tivesse chegado em janeiro, em fevereiro, uma semana antes, ele poderia estar vivo. É uma dor sem fim. Eu não pude enterrar meu pai; ele foi enterrado num saco preto. Era uma dose, uma vacina, uma esperança. Mas ele morreu”, disse Bruna. O pai da jornalista e empresária morreu em 18 de abril. A vacinação para idosos de 67 e 68 anos no DF começou em 26 de março.

No mês de julho, Bruna se vacinou. Com ela, estava um cartaz com o nome do pai e dos parentes de amigos que não tiveram a oportunidade de tomar o imunizante contra a doença. “Eu queria fazer uma homenagem. Foi um dia de esperança”, lembrou.

Fotos:

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Morte no Metrô

A vacina era uma esperança para Marcelle Motta, 42 anos. A empregada do Metrô-DF tinha obesidade e diabetes, fatores que aumentam o risco de complicações da doença. Ela chegou a tomar a primeira dose do imunizante, mas não deu tempo sequer de completar o esquema vacinal.

Marcelle foi a segunda vítima da categoria dos metroviários para a Covid-19. Ela era mãe de 2 filhos, de 5 e 23 anos. Morava sozinha e precisava sustentar a família. Trabalhou todos os dias da pandemia na função que exercia, como agente de estação.

Marcelle Motta Gordin, 42 anos
Marcelle Motta Gordin, 42 anos, tinha esperança na vacinação. Ela trabalhou todos os dias da pandemia, foi contaminada e não resistiu

“É lastimável termos mais uma perda. Nossa briga, como sindicato, era para que fôssemos incluídos no plano de vacinação como prioridade. Somos uma categoria que não parou em nenhum momento na pandemia. Não tem jeito de andar no Metrô sem aglomerar. A vacina diminuiria esses casos”, lamentou Meiry Rodrigues, diretora de comunicação e mobilização do SindiMetrô.

Vacinação reduz mortes

A campanha de vacinação contra a Covid-19 começou a mostrar sinais positivos. O efeito mais perceptível, neste momento, ocorre entre os integrantes dos primeiros grupos prioritários imunizados, de pessoas na faixa etária acima dos 60 anos, conforme mostra matéria do Metrópoles publicada em 7 de julho.

Dados do Sistema de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe) apontam que as internações para maiores de 60 anos caíram nas últimas semanas em todo o país. O levantamento foi feito pelo (M)Dados, núcleo de análise de grande volume de informações do Metrópoles, com base nos registros das hospitalizações documentadas, em que o desfecho para o quadro clínico do paciente, internado ou não, foi de óbito por síndrome respiratória aguda grave.

Entre 1º de maio e 10 de junho, a média móvel de internações para pessoas entre 60 e 69 anos caiu 46%. No mesmo período, a média para a faixa etária entre 50 e 59 anos subiu 23,3%. Já o mesmo indicador para pessoas entre 40 e 49 anos avançou 34%.

Foi considerado o período de 1º de janeiro deste ano até 10 de junho, porque os dados do Sivep-Gripe têm defasagem na atualização, e, em razão disso, quanto mais recente, mais incompletos estão.

Inversão da curva no DF

O Distrito Federal apresentou mudança na curva de mortes em decorrência da Covid-19. Primeiras a receber as doses de imunizantes na capital, as pessoas de 80 anos ou mais saíram do topo da pirâmide de óbitos, com redução de 20,4 pontos percentuais nas ocorrências.

De acordo com dados divulgados no fim de junho pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), a taxa de mortalidade entre a população acima de 80 anos acometida com Covid-19 era 31,4%, em junho de 2020. No mesmo mês de 2021, o percentual caiu para 11% – uma queda de 20,4 pontos percentuais. Isso significa dizer que, nesse período do ano passado, sem vacina, 175 pessoas morreram com coronavírus. Este ano, o número caiu para 39.

No que se refere a pessoas com idade entre 70 e 79 anos, também houve queda no índice registrado. Os óbitos reduziram de 133 (23,8%) para 49 (12,8%). O mesmo padrão segue para um terceiro grupo que começou a imunização a tempo de concluir as duas doses – o de idosos entre 60 e 69 anos.

De acordo com a infectologista Ana Helena Germoglio, é nítida a diferença da população que tem sido internada em hospitais do DF com Covid-19. “Em 2020, tínhamos basicamente idosos, hipertensos e pessoas com doenças pulmonares. Em 2021, tivemos um aumento importante de adultos jovens, geralmente com alguma comorbidade: hipertensos, diabéticos ou obesos”, afirmou a especialista, que atua no Hospital Regional da Asa Norte (Hran), referência no tratamento da doença pandêmica em Brasília.

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