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Abrigos para moradores de rua no DF têm ratos, percevejos, carrapatos e depredação

Condições sanitárias precárias em unidade do Areal fez o MPDFT pedir interdição e reparos urgentes: 3 instalações provisórias serão mantidas

atualizado

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MPDFT/Reprodução
Unidade para moradores de rua no DF têm ratos, percevejos e carrapatos
1 de 1 Unidade para moradores de rua no DF têm ratos, percevejos e carrapatos - Foto: MPDFT/Reprodução

Devido à pandemia do novo coronavírus, a unidade de acolhimento para a população em situação de rua e desabrigo por abandono no Distrito Federal está jogada aos ratos, percevejos, mofo e falta de estrutura sanitária. Localizada no Areal e criada para dar proteção social especial aos cidadãos em situação de vulnerabilidade, o abrigo tem uma série de problemas que representam risco de infecções e até de morte para quem não têm lar.

É o que aponta documento do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ao qual o Metrópoles teve acesso com exclusividade. Conforme o órgão, as outras três unidades de acolhimento para pessoas em situação de rua criadas ou reorganizadas pelo Governo do Distrito Federal (GDF), no Autódromo de Brasília, em Ceilândia e no Recanto das Emas, também precisam de reparos. Elas estavam com os dias contados. Seriam desativadas por serem provisórias, o que agravaria ainda mais a situação da unidade do Areal.

Hoje abrigando 155 pessoas consideradas socialmente vulneráveis, e com uma lista de problemas, a Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias (Unaf), do Areal, ainda teria que receber brasilienses que entraram em situação de risco devido à Covid-19.

De acordo com ação do MPDFT, em meio à pandemia do novo coronavírus, o fechamento das unidades provisórias aumentaria a desproteção vivenciada pelas pessoas em situação de rua, além de expor ainda mais esse público à contaminação pela Covid-19.

Em decisão liminar, proferida em 18 de dezembro, o MPDFT conquistou a garantia de manutenção das instalações provisórias do DF. Os abrigos criados em Ceilândia, Recanto das Emas e Autódromo deverão preservar, no mínimo, o número atual de vagas, até que seja possível a prestação de serviços de acolhimento em caráter permanente.

No entanto, o GDF deverá apresentar estudo técnico sobre a unidade Unaf-Areal, detalhando reformas em andamento, previsão de higienização para controle de vetores e outros meios que tenha elaborado para justificar a possibilidade de encerramento das atividades dos alojamentos provisórios.

Risco de infecções

Conforme informações da Ação Civil Pública impetrada pelo MPDFT, assinada por integrantes do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação (NED/MPDFT), a Unaf representa risco de infecções e até de morte para quem precisa ficar ali abrigado. Situação que levou o MPDFT a pedir a interdição da unidade, a reparação de problemas nos outros abrigos e o pagamento de multa de R$ 200 mil, em caso de desrespeito do Governo do Distrito Federal aos pedidos.

Em documento com 163 páginas, a equipe técnica do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação relata ter se deparado, durante vistorias realizadas entre setembro e dezembro de 2020, com a inexistência de requisitos técnicos mínimos a serem observados em edificações.

Em razão de denúncias recebidas, o MPDFT, por meio do NED, solicitou à Assessoria de Perícia em Engenharia (Apael/ MPDFT) a realização de duas perícias na Unaf-Areal, as quais apontaram que a unidade não atende aos requisitos técnicos mínimos no que tange à segurança de edificações e sanitárias. Em seguida, o Ministério Público realizou reuniões e expediu uma recomendação à Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) com pedido de providências. Todavia, essas medidas não foram suficientes para garantir segurança e conforto aos acolhidos.

Conforme demonstrado na ação civil pública interposta pelo MP, foram verificados diversos problemas na Unaf-Areal, como riscos de choques elétricos, vazamento e infiltração de água, mofo, infestação de percevejos, presença de ratos e pombos, entre outros.

Fora isso, o relatório técnico da Diretoria de Vigilância Sanitária, da Secretaria de Estado de Saúde, encaminhado ao MPDFT em novembro de 2020, também aponta uma série de irregularidades que põem em risco a integridade física dos acolhidos.

Proteção comprometida

Assim, para o MPDFT, a Unaf-Areal encontra-se em desacordo com os parâmetros da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, que normatizou, nacionalmente, como devem ser estruturados os serviços de Proteção Social Básica e Especial do Sistema Único de Assistência Social (Suas). As graves violações encontradas representam o descumprimento dos princípios e diretrizes da Política Nacional de Assistência Social (PNAS). Conforme o MPDFT, os direitos humanos dos abrigados – tanto em abrigos permanentes quanto em provisórios do DF – são desrespeitados.

Para o órgão, nem os funcionários dos locais estão seguros. Vários profissionais mostraram braços com picadas de percevejo (veja na galeria abaixo) e relataram o medo de trabalhar nessas condições.

Conforme a ação, que tramita na 6ª Vara da Fazenda Pública do DF, a precariedade das instalações abrangem a parte elétrica (riscos de choques elétricos) e hidráulica (com vazamento e infiltração de água pela estrutura), além de mofo, que pode comprometer a qualidade do ar e trazer riscos à saúde de usuários e funcionários.

Pombos, ratos e percevejos

Além disso, na unidade do Areal, espaços do refeitório estão tomados por pombos, sendo comum o aparecimento de ratos; e a rede de esgotamento sanitário não segue os padrões da norma ABNT NBR 8160/99.

“As irregularidades apontadas não param por ai: blocos recentemente reformados sequer estão sendo utilizados e presentam vícios de construção. O forro de PVC cedeu; aumentou-se a quantidade de quartos, mas não a de banheiros; janelas possuem aberturas insuficientes. Os banheiros estão em péssimo estado, com vazamentos, louças quebradas, quantidade insuficiente de guarda roupas e de materiais para os abrigados”, diz o documento do Ministério Público.

Veja fotos do local:

 

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Em setembro, o MPDFT encaminhou à Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) relatório sobre a necessidade de reparos nas unidades. No entanto, após diversas tentativas, o MPDFT considera que as violações aos direitos humanos persistem e, por isso, requisitou a interdição do local em caráter de urgência e o remanejamento de seus 155 abrigados.

Caso não seja determinada a imediata interdição da Unaf-Areal, o órgão requer que seja promovida a higienização/dedetização necessária a eliminar quaisquer tipo de infestações por insetos e animais peçonhentos, realizando-se o controle de vetores, a fim de permitir receber e abrigar pessoas na unidade sem violação de direitos humanos.

Veja parte do documento, disponibilizado no PJE:

MPDFT sobre abrigos no DF

Tal pedido de providências, que pontua a urgência das medidas a serem adotadas, está em conformidade com o anunciado pela procuradora-geral de Justiça do DF, Fabiana Costa, em entrevista à coluna Grande Angular, após ser escolhida para permanecer no cargo. Ela destacou que o papel do MDFT para reduzir a mazela social das pessoas em situação de rua não é só de fiscalizar, mas também de estimular a construção de políticas públicas voltadas à população de rua.

“Devido à pandemia, a atuação do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação (NED) nos últimos meses está pautada em assegurar medidas para evitar a contaminação pela Covid-19 e propiciar o acesso da população de rua aos centros de acolhimento, alimentação, saúde e condições básicas de higiene. Nesse sentido, o núcleo emitiu diversos ofícios, recomendações, relatórios técnicos elaborados pela equipe de assistência social, além de realizar perícias e participar de reuniões com órgãos do Governo do Distrito Federal e com a sociedade civil. O objetivo é garantir a implementação da Política Distrital para População em Situação de Rua”, destacou Fabiana Costa.

O outro lado

Por meio de nota, a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) informou que a notificação feita pelo Ministério Público do Distrito Federal e Território (MPDFT) foi referente à Unidade de Acolhimento para Adultos e Família, localizada no Areal. “A Sedes destaca ainda que todas as 62 unidades públicas de assistência social do DF, como também todas as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) parcerias da pasta, realizam, por ano, quatro ações de dedetização e sanitização em suas instalações”, disse no documento.

Segundo a Sedes, a Unaf passou por um serviço de controle de pragas no último dia 22 de outubro, seguindo os protocolos estabelecidos pela Vigilância Sanitária, com validade de 90 dias.

“É importante ressaltar que a unidade acolhe pessoas em situação de rua, que muitas vezes ficam dias sem qualquer tipo de higiene pessoal, o que pode deixá-los expostos a infestação de parasitas; bem como seus pertences pessoais”, disse a pasta.

A Sedes ressaltou ainda que a equipe da Gerência de Manutenção e Reparos tem “atuado a fim de manter o local limpo, roçado, livre de poças, buracos, entulhos e outros agentes causadores e facilitadores de infestações”, completou.

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