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Se tem a Praça Leandro, por que não a Praça Marielle?

São tolos e falsos os argumentos de Ibaneis para vetar a lei que dava o nome da vereadora a uma área verde no Setor Comercial Sul

atualizado

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1 de 1 marielle3 - Foto: Natalia SG/Metrópoles

Que relação existe entre o cantor Leandro (da dupla sertaneja goiana) e Brasília? Ou entre Roberto Marinho e a capital dos brasileiros? Ou entre Zumbi dos Palmares e o quadradinho?

Que vínculo une Paris e Marielle Franco? E o que liga a vereadora brasileira negra a Lisboa?

Há muitas respostas possíveis, com argumentos que vão variar de acordo com as preferências culturais ou a matriz ideológica do interlocutor (e sempre há uma, não duvide). Quando o argumento é de um governador, no caso aqui o do Distrito Federal, era de se esperar uma coerência minimamente histórica e sustentada em informações comprováveis.

Ao vetar a lei que dava o nome de Marielle Franco a uma praça em frente à Galeria dos Estados, no Setor Comercial Sul, Ibaneis argumentou que “não há relação entre o nome da vereadora e o Distrito Federal” e que “a tradição é homenagear pessoas que tenham servido diretamente à comunidade do DF”.

Essa tradição de que fala Ibaneis é facilmente desmentida numa rápida consulta ao Sinj-DF (Sistema Integrado de Normas Jurídicas do DF), site de pesquisa de leis, decretos, portarias e outros atos normativos do Distrito Federal.

A decisão foi ideológica, do mesmo modo que foi ideológica a decisão do regime militar de dar o nome de 31 de Março à praça em frente à fonte luminosa da Torre de TV, em decreto de 2 de abril de 1969. E de Cristovam Buarque, à época filiado ao PT, de dar o nome de Zumbi dos Palmares à pracinha da Quadra 5 do Setor Comercial Sul. E, na mesma toada, a de Joaquim Roriz de sancionar a lei que deu o nome do Leandro, o sertanejo goiano, a uma praça próximo à sede da Administração Regional de Ceilândia.

Lucio Costa desaprovava a ideia de dar nomes de pessoas a lugares públicos. Sabia do risco de se ter uma praça em homenagem à ditadura militar ou uma ponte em homenagem a um ditador (Costa e Silva) na capital desenhada para um país democrático. A Esplanada dos Ministérios desemboca numa praça chamada Três Poderes, cujos vértices são as sedes do Executivo, do Judiciário e do Legislativo que, em condições democráticas, vigiam-se uns aos outros para, juntos, cuidarem da democracia.

Mas o próprio Lucio caiu na cilada da personificação: é nome de um bairro no Guará que ele projetou.

Já que não dá pra escapar da tradição, ter uma praça Marielle Franco no Setor Comercial Sul faz todo o sentido para quem defende o direito à vida, a luta em defesa dos favelados, contra os preconceitos de cor, orientação sexual e classe social – ou seja, para 30% dos eleitores brasilienses, visto que os outros 70% votaram no presidente eleito.

Ao contrário do que argumenta Ibaneis, há, sim, um vínculo forte entre Brasília e Marielle. A capital do país tem o DNA das boas causas humanitárias. Nasceu do desejo de integração dos Brasis e foi projetada por uma geração de arquitetos que sonhava em mudar o Brasil construindo uma cidade onde todos seriam minimamente semelhantes. Embora não tenha dado certo – Brasilia é a capital mais espacial e economicamente segregadora do país –, a cidade tem a democracia e o humanismo nas veias.

Marielle e Brasília têm tanto em comum quanto Marielle e o Brasil – e o destino de Marielle é a metáfora trágica do destino do Brasil. Uma praça com o nome dela nos faria sorrir um pouco.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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