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“Conquiste seu espaço com confiança”, aconselha Ana Couto

CEO da agência Ana Couto elenca desafios de gerir uma empresa e aborda as dificuldades de ser mulher em cargo de liderança

atualizado

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Ana Couto
1 de 1 Ana Couto - Foto: Divulgação

Embora as discussões sobre as mulheres conquistando cada vez mais cargos de liderança no mundo corporativo estejam avançando, ainda há muito tabu para ser quebrado. De acordo com a Global Learner Survey, promovida pela Pearson em parceria com a Morning Consult, 74% delas acreditam que todos os tipos de preconceito e discriminação ainda são pontos difíceis na hora de buscar novas oportunidades de trabalho. O levantamento ouviu 6 mil mulheres nos Estados Unidos, Reino Unido, Brasil, México, Índia e China.

No Brasil, o estudo revelou que 30% da Geração Z pretendem tomar medidas necessárias para iniciar os próprios negócios no próximo ano; seguido das Millennials (33%), Geração X (37%) e Baby Boomers (41%).

Se empreender aqui no Brasil é uma façanha complicada, imagina ser mulher. Muitas vezes tendo de lidar com machismo estrutural, preconceito de gênero, piadinhas de mau gosto e falta de respeito e de confiança, tudo isso motivado pelo cargo que ocupa numa determinada empresa.

Para entender mais sobre a rotina cercada de desafios e perrengues e em referência ao mês da mulher, o Metrópoles entrevistou Ana Couto, CEO e Founder da agência Ana Couto, empresa que constrói valores para as marcas por meio de propósitos. “Estamos em um ótimo caminho e com certeza espero mais mulheres líderes, presidentes de empresas e de países, porque tenho certeza que a energia feminina faz o mundo melhor”, garante.

A profissional tem formação em Designer e mestrado em Visual Communication no Pratt Institute, em Nova York, com especialização em Branding na Kellogg School of Management. Em 2015, formou-se no curso OPM (Owner/President Management Program), na Harvard University. 

Como é a experiência de ser CEO da agência Ana Couto?

Como CEO e fundadora da agência, posso dizer que é um grande processo de amadurecimento. Primeiro na fase de empreendedora, você quer controlar tudo para garantir que todo aquele sonho se realize. Com o passar dos anos e com o amadurecimento, você percebe uma mudança do seu papel de empreendedor para o papel de CEO. Ao longo desses 27 anos como CEO, fui amadurecendo e entendendo essa transformação. E para isso fui buscar conhecimento e experiência, fiz o curso de OPM. Aprendi que o CEO precisa ter um olhar 360 sobretudo, entender sobre contabilidade, financeiro, crescimento e até desenvolvimento de liderança. Tem muito empreendedor que não fica na cadeira de CEO, no meu caso, eu gosto da energia de fazer acontecer, esse lado estruturante, de apontar o caminho, implementar a visão, pensar caminhos para o futuro. Essa capacidade de evolução é muito importante para um líder, ter essa característica de inovar, montar times complementares a você. Um CEO precisa entender que não faz tudo sozinho e que precisa contar com um time competente que complemente e compartilhe do mesmo sonho.

Quais foram os desafios para chegar onde está hoje?

Tiveram muitos desafios, desde o próprio negócio, como colocá-lo em pé e fazer acontecer. Depois o desafio do crescimento, quando é preciso criar estruturas, processos, fazer investimentos, ficar atenta às movimentações do mercado. Importante sempre é investir, melhorar, inovar seu negócio para se manter indispensável para o cliente. Assim você constrói ao longo dos anos relevância e credibilidade. O grande desafio foi trazer a metodologia de branding para as empresas brasileiras. Trabalhar junto das lideranças e com esse instrumental que muitas vezes é fora do campo de atuação deles. Trazer para as organizações a visão clara de propósito, para que trabalhem com um impacto positivo por meio do branding, gerar mais valor para todos os stakeholders. Estamos fazendo isso de forma consistente há 27 anos, temos um GPS claro, uma meta de onde queremos chegar. Em um mundo tão complexo, as organizações precisam ter o caminho claro de onde querem chegar.

Quais são os maiores obstáculos no segmento em que atua? O que pode ser melhorado?

Aqui na agência não temos um segmento claro, a gente compete em vários segmentos, desde consultorias de negócio até agências publicitárias tradicionais. No fim do dia, é importante olhar para todos esses CEOs e organizações e ter a percepção de que estamos ajudando a executar da melhor forma todo o potencial da organização. Nosso papel é criar instrumentos para que o CEO possa levar para sua organização diretrizes claras, alinhando marca, negócio e comunicação.

Como você tem superado esses obstáculos?

Como líder, tenho uma capacidade muito grande de me reinventar, experimentar, abrir ecossistemas e inovar. Aqui na agência, estamos sempre com nosso ecossistema de propósito, com clientes, cursos para alunos, projetos aplicados. Isso traz constantes aprendizados. Somos uma organização que está sempre se reavaliando e inovando, um lugar em que os projetos vão evoluindo, desafios diferentes vão surgindo, e isso dá uma energia para continuar. Com o objetivo claro de que precisamos trabalhar a partir de um propósito, aprendizado constante e com uma cultura de inovação. Pessoalmente, sempre faço a seguinte pergunta: Se você deixasse de existir, alguém sentiria sua falta? O mesmo se aplica para a sua organização. Se a sua organização deixasse de existir, alguém sentirá falta dela?

Qual a sua visão sobre a inserção de mais mulheres em cargos de liderança no mundo corporativo?

A gente estuda muito sobre o assunto. A liderança feminina e a masculina têm aspectos e contribuições diferentes. A segunda possui maior agressividade, metas, visão mais rigorosa e disciplinada. Por sua vez, a primeira tem gentileza, harmonia, empatia, criatividade e vulnerabilidade. A junção e equilíbrio entre essas características resultam em uma boa liderança. A feminina deve estar em pauta, tanto quanto a masculina se faz presente. Eu acredito no coletivo de que ninguém faz nada sozinho, eu gosto e acredito que a união faz toda a diferença. Ao longo da minha carreira, apoiei e busquei a construção de times diversos. Isso traz riqueza, construção de valor e de um propósito. O nosso objetivo no fim do dia é não fazer distinção entre homens e mulheres. Como disse anteriormente, acredito e aplico na minha liderança que busque maior autenticidade. Fique confortável com a sua história e evolua a partir do que você pode trazer de melhor para as pessoas.

Como vê os movimentos de empoderamento feminino e a desigualdade salarial entre gêneros?

Eu acredito que historicamente o homem controlou toda a potência feminina. O controle não é formato, pois estamos saindo fora da caixinha. Qualquer lugar que não fale sobre direitos e deveres iguais é um problema. O salário é apenas um sintoma da falta de equidade, é preciso olhar para a questão estrutural e entender que ambos precisam estar em pé de igualdade na vida pessoal e profissional.

O que tem feito para quebrar os estereótipos sobre mulheres na liderança?

Somos uma agência equilibrada, com 57% das mulheres em cargos de liderança. Nascemos com a questão da equidade muito bem definida. Ter um grupo de mulheres na liderança ou em cargos importantes é natural para nós. Eu, como mulher e CEO, acredito que me colocar no lugar do outro, respeitar todos os momentos, é fundamental para chegarmos em um lugar de igualdade. Olhar o ser humano como um todo e dar exemplos é essencial. Esse mês na agência, estamos com a pauta voltada para as mulheres e vamos trazer histórias de mulheres inspiradoras, que mudaram o mundo pelo seu propósito.

Já ouviu alguma frase machista por ter conquistado algum cargo de liderança? Como foi?

Com certeza. Nenhuma mulher passa por esse caminho sem sofrer machismo. Ao longo do caminho, passei por situações constrangedoras com homens e mulheres. Certa vez com uma cliente, fomos fazer uma reunião on-line, porque eu estava de licença maternidade e ela disse que a agência ia acabar porque eu havia me tornado mãe. Aquilo me soou muito estranho. Já tive muitas situações em que homens me chamaram de tia no meio de uma reunião. Muitas pessoas me veem apenas como profissional, CEO da Ana Couto, mas não sabem do meu lado mãe, família. Ao longo desses anos, eu trouxe para mim que nunca iria me abdicar de alguma coisa para estar nesse lugar, como vi muitas mulheres fazendo. Um homem bem-sucedido tem uma grande carreira, respeito, filhos, casa, mas me parece que a mulher nunca pode conquistar tudo isso, algo sempre tem que ser deixado para depois. E levei isso pra mim para nunca abdicar de nada que me é importante ao longo do caminho.

Como incentivar as lideranças femininas?

É importante abrir conversas com mulheres, entender seus medos, fragilidades e seus momentos. Gerar empatia, mostrar que ela não está fora do jogo, que ela pode e vai conquistar seus objetivos. Além disso, é importante deixar a mulher se sentir com o poder de decisão. Primeiro, eu vejo e sinto que algumas acham que não estão prontas para esse cargo. Muitas vezes por insegurança, por medo de ser rejeitada, então é importante incentivá-las e mostrar a elas que estão no caminho certo. 

Já foi desrespeitada por algum colega de trabalho por estar em cargo de liderança?

Toda relação é um teste. A forma como você responde e lida com esse momento é que vai mostrar qual é o seu posicionamento e qual o seu lugar. Você pode se sentir constrangida, mas como você responde a isso pode imediatamente constranger o outro. Toda vez que passei por situações constrangedoras ou me colocaram em um lugar que eu não pertenço, nunca deixei passar despercebido, sempre respondi “essa forma que você fala comigo não é legal, se eu fosse homem você não falaria assim”. Ao longo da minha carreira profissional, isso aconteceu diversas vezes e sempre procurei me posicionar de maneira autêntica e educada. E passo isso para o meu time, eu as deixo à vontade para mostrarem suas opiniões e posições.

Qual o conselho para mulheres que estão entrando no mercado de trabalho agora?

Eu diria para todas elas conquistarem seu espaço com confiança. Acredite no seu talento, no seu potencial, no seu propósito. Sem travas. Eu acredito nessa conquista de maneira fluida, leve e com integridade. Faça o seu melhor profissionalmente.

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