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MPDFT: 6 promotores investigam reforma irregular de prédio da Educação

Melhorias estruturais foram realizadas com recurso do Pdaf, modalidade exclusiva para custear pequenas obras em escolas da rede pública

atualizado

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Ricardo Botelho/Especial para o Metrópoles
Fachada do Prédio do MPDFT
1 de 1 Fachada do Prédio do MPDFT - Foto: Ricardo Botelho/Especial para o Metrópoles

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) abriu procedimento para analisar possível irregularidade no uso de recursos para a reforma de um prédio da Secretaria de Educação localizado na 607 Norte, em Brasília. Pelo menos 6 promotores de diferentes frentes de atuação analisam a liberação de verba que seria exclusiva para autonomia de escolas da rede pública local.

O caso foi revelado pelo Metrópoles, na manhã desta quinta-feira (29/7), e envolve a destinação de ao menos R$ 5 milhões que eram previstos para o Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (Pdaf). Mesmo interditado judicialmente, o local passou por melhorias consideráveis para servir como sede da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto (Crepp).

“As despesas com o Pdaf foram selecionadas como prioridade pelas Promotorias de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodeps) e Promotorias Regionais de Defesa dos Direitos Difusos ( Proregs) para os anos de 2021 e 2022. Há uma equipe de seis promotores de Justiça trabalhando na análise das prestações de contas, das rotinas, dos normativos e das despesas. Todas as unidades escolares e gestores já foram alertados pelo MPDFT para que observassem as limitações das despesas”, informou o órgão de controle.

A deputada federal Paula Belmonte (Cidadania-DF) também representou no MPDFT acerca da denúncia da reportagem e pediu providência aos promotores para que o fato seja apurado.

“Caso comprovada as notícias veiculadas na referida matéria, poderá configurar, inclusive, burla e fraude do regular procedimento de licitação, visto que a prestação desses serviços deveria seguir o rito da Lei nº 8.666/93 (a época vigente), incorrendo, consequentemente, em crimes tipificados no Código Penal”, escreveu a parlamentar.

Procurada, a Secretaria de Educação informou que “crê na licitude” dos procedimentos para reforma do prédio da 607 Norte e “acha louvável” a apuração tanto por parte do Ministério Público quanto da Controladoria Geral do Distrito Federal e da própria Corregedoria da pasta.

“Por considerar essenciais todas as iniciativas em favor da transparência, a Secretaria de Educação vai apoiar todas as investigações. A sociedade do Distrito Federal tem  direito ao esclarecimento dos fatos”, pontuou.

Veja o documento:

Ofício 72_21_MPDFT_Representação sobre matéria sobre o PDAF by Metropoles on Scribd

Irregularidades

Embora se investigue o valor de R$ 5 milhões, o montante pode ser ainda maior, uma vez que o relatório de gastos do programa não identifica pontualmente o tipo específico de dispêndio e a finalidade.

O consolidado do primeiro quadrimestre deste ano (de 1º de janeiro a 30 de abril) apresenta despesas realizadas e quitadas no valor total de R$ 12.646.383,05, incluindo desembolsos com materiais pedagógicos. As compras necessárias para uso em salas de aula somam R$ 1 milhão desse montante.

A questão é que, na prática, a legislação impede a destinação orçamentária do Pdaf que não seja exclusiva para o custeio de pequenos reparos em unidades de ensino (pintura, consertos em telhados e pisos), além da compra de materiais permanentes, tais como computadores e impressoras, desde que incorporados ao patrimônio da unidade. Para obras consideradas mais engenhosas, seria necessária a abertura de uma disputa pública de preços.

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Autorização

Assinada pela coordenadora da Regional de Ensino do Plano Piloto, Edilene Maria Muniz de Abreu, a autorização das obras foi realizada sob uma “pseudo justificativa”: em março de 2019, a Justiça do Trabalho chegou a interditar o endereço, quando a decisão indicou riscos na estrutura e, portanto, ao bem-estar dos servidores públicos (veja abaixo). Ela foi indicada ao cargo pelo então secretário-executivo da Educação, Fábio Souza.

“Me permitam neste espaço, que é pessoal, agradecer à minha equipe de trabalho, agradecer a todas da assessoria e chefia da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto. Mesmo em tempos difíceis, temos nos desdobrado e hoje particularmente me emocionei ao receber meus chefes, professor Fábio Souza e Leandro Cruz, para vermos juntos os últimos detalhes da nova sede da coordenação”, escreveu ela nas redes sociais ao legendar uma foto registrada no local.

“Além de ser um prédio que é registrado de “histórias” de vidas, de sonhos, será a primeira sede própria do Crepp. Gratidão à minha equipe pelo empenho, mesmo em tempos difíceis, e aos chefes. Gratidão por confiar e por quererem ver esse prédio novamente pulsando, por terem a ideia de executar uma ideia”, continuou a coordenadora. O texto publicado foi corrigido da versão original.

A cada quadrimestre anual, uma portaria é editada pela Secretaria de Educação para atualizar, pontualmente, os critérios a serem observados pelos gestores para a liberação de gastos pelo Pdaf. No caso da revitalização na Unidade II da pasta, as alterações foram publicadas no Diário Oficial (DODF) do dia 12 de fevereiro.

O ato foi assinado pelo então secretário de Educação, Leandro Cruz, mas apoiado pelo secretário-executivo da pasta à época, Fabio Pereira Sousa. Ambos foram exonerados por determinação do governador Ibaneis Rocha (MDB), sem justificativa aparente.

Embora pouco reconhecido pelos brasilienses, o edifício de concreto foi criado a partir da assinatura do arquiteto Oscar Niemeyer e projetado originalmente para abrigar o então Instituto de Teologia da Universidade de Brasília (UnB). Contudo, com o Golpe Militar de 1964, a orientação ecumênica que faria parte das grades universitárias foi extinta do currículo e o prédio foi vendido para a Fundação Educacional do DF, hoje patrimônio da Secretaria de Educação.

Interdição

Em março de 2019, acoplado de uma decisão da Justiça do Trabalho, um laudo pericial apontou falta de “condições mínimas de segurança”, o que motivou o Governo do Distrito Federal (GDF) a proibir o acesso e transferir as subsecretarias e, portanto, os servidores para outras localidades.

Nos moldes do que ocorreu com o Teatro Nacional Claudio Santoro, a Justiça também indicou “precariedade das instalações elétricas” e a inexistência de sistema de prevenção de incêndios, sinalização de emergência, extintores, hidrantes e alarmes, o que resultaria no “risco à vida de todos”. Um dos exemplos citados foi a falta de escada na instalação e ainda janelas inadequadas para facilitar evacuações em casos de situação de pânico.

O prédio tem três pavimentos e é caracterizado por pilares paralelos de concreto, que chamam a atenção de visitantes logo na fachada principal. Pelo projeto de Niemeyer, o espaço previa a construção de um edifício de moradia para a comunidade teológica, com dormitórios, refeitório, bibliotecas e oratórios para noviços, seminaristas, estudantes e padres.

O outro lado

Por se tratar de uma obra de Oscar Niemeyer, o Metrópoles procurou o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), tecnicamente responsável por autorizar alterações e revitalizações de obras consideradas históricas para Brasília.

Por nota, o órgão afirmou que o edifício não é tombado individualmente. “Portanto, segundo a normativa interna do instituto, não há obrigatoriedade de que o projeto de intervenção seja submetido à autarquia”.

Da mesma forma acionada, a Secretaria de Educação afirmou que estaria levantando as informações para encaminhá-las à reportagem. O esclarecimento não foi recebido pela coluna Janela Indiscreta até a publicação do texto.

O conteúdo poderá ser modificado no caso de alguns dos envolvidos atualizarem o posicionamento original.

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