metropoles.com

Uma dose é insuficiente para conter Delta, diz monitor de pandemia da USP

Infotracker, plataforma de pesquisadores da USP e da Unesp sobre a Covid, projeta que São Paulo terá explosão da variante no fim de setembro

atualizado

Compartilhar notícia

Hugo Barreto/Metrópoles
vinacao-covid-brasilia
1 de 1 vinacao-covid-brasilia - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

São Paulo – A variante Delta da Covid-19 está circulando pelo Brasil desde maio e ganhou força em São Paulo e no Rio de Janeiro nas últimas semanas. E de acordo com projeção do Infotracker, ferramenta de pesquisadores da USP e da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) sobre dados da Covid, a nova cepa deve explodir nas duas capitais nas próximas semanas.

Wallace Casaca, professor da Unesp e coordenador da plataforma, avalia que é “muito perigoso as pessoas se manterem com uma só dose da vacina com a chegada da Delta”. Isso porque, apesar da campanha de imunização ter se acelerado no país nos últimos meses, apenas uma minoria da população tem o esquema vacinal completo.

A plataforma projeta que, no fim de setembro, a cidade de São Paulo deve ver um grande aumento de casos de Covid-19, graças à variante Delta. Atualmente, o estado de São Paulo possui 231 registros da nova cepa, de acordo com dados do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE), sendo 171 apenas na capital.

No Rio, no estado e na capital, a situação é mais problemática: a Delta já é predominante. Nesta sexta-feira (20/8), o prefeito Eduardo Paes disse que nunca antes a cidade registrou uma taxa de contágio tão grande.

“Estamos, neste momento, com um pico de casos de Covid na cidade do Rio de Janeiro em todo o ano de 2021. Traduzindo aqui, nunca antes, no ano de 2021, nós tivemos tantas pessoas com Covid na cidade como neste momento agora”, falou.

O coordenador do Infotracker diz que o Rio de Janeiro já se encontra em fase de atenção, e os números devem piorar em breve. “As internações provavelmente vão continuar aumentando, lembrando que o Rio tem ocupação de leitos de UTI de mais de 90%. Está bastante saturado o sistema de saúde. Os óbitos ainda não começaram a subir, mas isso deve ocorrer por um reflexo das internações”, avalia.

0

Eficácia da vacina

A cobertura vacinal completa é importante porque, apenas com uma dose, a proteção contra a Covid é reduzida. Os dados de cidades como Londres e Nova York mostram uma explosão de casos com a chegada da variante Delta, mas os óbitos e internações não cresceram no mesmo ritmo.

Ainda há estudos em andamento sobre a eficácia das vacinas disponíveis no mundo atualmente contra a Delta, mas dados obtidos até o momento mostram que os imunizantes vão mostrando uma queda na eficácia contra a nova cepa. Ao mesmo tempo, pesquisas dizem que a Delta é mais transmissível do que as outras variantes identificadas até aqui.

Análise feita pela Universidade de Oxford explicou que as vacinas da Pfizer e da Astrazeneca, quando aplicadas as duas doses, são eficazes contra a variante descoberta originalmente na Índia, mas que a proteção é reduzida com o tempo. 

Em relação à Pfizer, a eficácia foi de 94% contra a Delta 14 dias após a segunda aplicação. Mas ela caiu com o passar do tempo, chegando a 90%, 85% e 78%, após 30, 60 e 90 dias, respectivamente. Já a AstraZeneca, 14 dias após a aplicação da segunda dose, apresentou eficácia de 69% contra a variante, mas o número baixou a 61% após 90 dias.

Quando se trata de apenas uma dose, ainda não há evidências conclusivas, mas estima-se haver uma eficácia de apenas 30% da Pfizer contra a Delta com apenas uma aplicação.

“Aqui, a gente tem boa parte da população com uma dose. No entanto, vemos a minoria da população com duas doses. Embora a eficácia das vacinas seja muito alta, a Delta tem um escape um pouco maior que as outras variantes”, explica Casaca. “Isso significa que vai ter uma redução na proteção. Em vez de ficar com sintomas mais brandos, pode ficar com sintomas mais graves. Mas é difícil mensurar”.

Comparação com outros países

Para fazer as projeções para as cidades brasileiras, o Infotracker realizou uma comparação com Nova York, Londres e Israel, cidades e país que têm populações semelhantes ao Rio e São Paulo. Chegou à conclusão que, a partir do momento em que a variante Delta começa a circular na região, os casos e internações aumentam cerca de 80 dias depois.

O Rio de Janeiro registrou os primeiros casos da Delta ainda em junho, enquanto São Paulo detectou a nova cepa a partir de julho. Enquanto na capital fluminense os casos começaram a se espalhar rapidamente, em São Paulo a cepa ainda tem uma incidência menor, mas que vem aumentando nas últimas duas semanas.

O Infotracker avalia que São Paulo possui cerca de um mês até que se comece a perceber o aumento de casos. “Lembrando que o município de São Paulo, em termos de índice, se encontra estagnado, no número de casos, internações e óbitos, mas estagnado num patamar muito elevado”, observa Casaca. No estado, morrem em média 250 pessoas por dia de Covid atualmente.

A plataforma projeta que as mortes por Delta não vão chegar ao patamar mais crítico da pandemia, de 3 mil mortes por dia, alcançado em março e abril deste ano no país, quando começou a circular a variante Gama (P1), a que prevalece no território nacional atualmente. Mas estima-se um aumento considerável.

“A gente avaliou três regiões, Nova York, Londres e Israel. Em todas estas regiões, já tem mais de 50% de cobertura vacinal com duas doses. E surge a seguinte pergunta, que gera um pouco de inquietação: por que essas cidades, mesmo com a cobertura vacinal tão elevada, tiveram surtos da Delta? Por que lá teve um surto e aqui não vai ter? É plausível inferir que a gente vai sofrer impactos bastante sérios da Delta”, afirma o coordenador do Infotracker.

O efeito da Delta, principalmente em São Paulo, que ainda tem uma circulação lenta da nova cepa, pode ser mitigado, avalia Casaca, com uma aceleração na aplicação da segunda dose e com a adoção de medidas restritivas, como uso de máscaras e limitações à mobilidade.

“Se hoje a gente fecha o comércio, não vai ver este surto daqui um mês, ele pode ser até mitigado, dependendo das medidas que vamos impor agora. O problema é que estamos flexibilizando de uma forma que parece que acabou a pandemia e isso preocupa”, pondera.

Compartilhar notícia