Por que gruta em SP pode ter desabado em acidente que deixou 9 mortos
Segundo geólogo, material que constitui a Gruta Duas Bocas, em Altinópolis, é muito poroso, suscetível à passagem de água
atualizado
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A formação geológica da Gruta Duas Bocas, em Altinópolis, no interior de São Paulo, pode ter contribuído para o desabamento do teto do local, onde nove bombeiros civis morreram durante um treinamento no domingo (31/10). A estrutura é constituída de arenito Botucatu, mesmo material encontrado no Aquífero Guarani, um dos maiores do mundo, na América do Sul.
Em entrevista ao Metrópoles, o geólogo Renato Ramos, professor do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explicou que o arenito Botucatu é derivado de um deserto de milhões de anos. Com ajuda da água e de elementos químicos como o ferro, os grãos de areia se unem e formam rochas.
O estudioso reforçou, porém, que essas pedras são muito porosas e permeáveis, pouco resistentes a chuvas. No momento do desabamento, chovia bastante na região, o que, para Renato, contribuiu para a queda do teto da gruta.

O desmoronamento aconteceu na Gruta Duas Bocas, próxima à Gruta de Itambé, ponto turístico na região Divulgação

O teto de uma gruta caiu quando um grupo de pessoas fazia um treinamento em Altinópolis (SP) Reprodução

Bombeiros trabalham no resgate Reprodução

O local é de difícil acesso Reprodução

O desmoronamento na caverna aconteceu na madrugada deste domingo (31/10), entre 2h e 3h30 Reprodução

Grupo de pessoas foi atingido por desabamento do teto da Gruta Duas Bocas, em Altinópolis Reprodução

Segundo o Corpo de Bombeiros, 75 agentes e 20 viaturas trabalharam na ação Reprodução

Os bombeiros temem que novos desmoronamentos aconteçam na gruta Reprodução

Mulher é resgatada sem vida após desmoronamento na Gruta Duas Bocas, em Altinópolis Reprodução

Além das equipes de bombeiros, a Defesa Civil está no local do acidente Reprodução
“É como areia de praia, só que endurecida. Os grãos estão todos unidos por elementos químicos, como óxido de ferro, carbonato de cálcio e sílica. Não se sabe ainda a causa do desabamento, mas, provavelmente, a chuva teve influência para desintegrar o arenito”, ressaltou o especialista.
Este material é diferente do calcário, por exemplo, mais resistente. “[A rocha] pode dissolver, como o calcário em grutas de Minas Gerais e Goiás. Mas outras grutas, formadas por arenito e quartzito, a exemplo da região de Ibitipoca, se formam muito pela queda mecânica dos fragmentos. O teto vai caindo aos poucos e abrindo espaço ao longo dos séculos”, afirmou.
Local fragilizado
Presidente da Associação Profissional dos Geólogos do Estado do Rio de Janeiro (APG-RJ), Ramos ressaltou que apenas uma parte do teto da Gruta Duas Bocas caiu – no ponto onde estavam os bombeiros que acabaram soterrados. Outras 18 pessoas escaparam sem ferimentos. De acordo com o profissional, isso pode ter acontecido porque esta área específica deveria estar mais fragilizada que as demais, em decorrência dos efeitos do tempo.
“Parece que havia muitas fraturas, quebras na rocha. Então, o arenito já é poroso, a água penetra facilmente nele, e ainda existe muitas fraturas, é muito perigoso ficar dentro de um lugar desses”, definiu.
O grupo de 28 bombeiros civis passaria a noite no local, no âmbito de um treinamento para resgate em cavernas, mas foi surpreendido pelo desabamento na madrugada. Renato Ramos considera a possibilidade de o espalhamento da areia ter causado as mortes, além do próprio impacto da queda da estrutura.
“O teto da gruta, que tinha cerca de 30 centímetros de arenito, desabou e voltou a ser areia quando bateu no chão. Muita gente pode ter morrido sufocada com a areia e até menos pelo impacto. Na natureza, tudo é cíclico: de deserto, virou rocha, e com o passar dos anos, inevitavelmente volta a ser areia”, explicou.
“Foi uma infelicidade eles terem entrado na gruta e permanecido lá com chuva, e também uma fatalidade, justamente por uma parte dos bombeiros ter deitado em um lugar mais instável. De maneira geral, não é recomendado ficar em uma gruta quando estiver chovendo, ainda mais sendo de arenito”, disse Renato Ramos.