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Diante de denúncias, Temer gasta um terço do mandato se defendendo

Entre delações e acusações da PGR, Temer passou 162 dos seus 453 dias à frente da Presidência concentrando esforços para arquivamentos

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Joelson Miranda/metropoles.com
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1 de 1 ampulheta-abre - Foto: Joelson Miranda/metropoles.com

Anunciado como “o governo reformista”, a gestão de Michel Temer à frente da Presidência da República é marcada por escândalos de corrupção envolvendo aliados e o próprio presidente. A agenda econômica, apresentada ao mercado financeiro como o grande legado do peemedebista, deu lugar a articulações políticas entre parlamentares e prestações de conta à população. Como resultado, entre delações e denúncias, Temer gastou, até o momento, mais de um terço do seu mandato se defendendo.

O peemedebista é o terceiro presidente após a redemocratização a sofrer algum tipo de acusação formal no exercício do mandato. Enquanto Dilma Rousseff e Fernando Collor de Mello enfrentaram processos de impeachment, Temer foi o primeiro chefe do Executivo a ser alvo de uma denúncia por crime comum. O governante foi imputado por corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa.

A contar da publicação dos áudios envolvendo o empresário do grupo J&F Joesley Batista e Temer, em 17 de maio deste ano, quando o presidente veio a público para afirmar que não renunciaria, até este domingo (29/10), o peemedebista passou 162 dias defendendo-se das acusações levantadas a partir da delação. O intervalo corresponde a 35% dos 453 dias em que Temer permanece à frente da Presidência desde a sua posse oficial, em 2 de agosto de 2016.

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Na primeira denúncia contra Temer, enviada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 26 de junho, o trâmite, da apresentação à votação no plenário, durou 38 dias. Na segunda, 40. Entre as duas acusações, contudo, Temer manteve a articulação com deputados da base, bem como a divulgação de uma agenda positiva de crescimento econômico. Nesse intervalo, o governo não retomou a agenda reformista.

A pauta da equipe econômica estava pausada desde maio, quando uma conversa mantida entre Temer e Joesley, em um encontro fora da agenda no Palácio do Jaburu, veio a público. Na época, a reforma da Previdência, principal medida elencada pelo Planalto, já havia sido aprovada na comissão especial e estava sendo preparada para votação em plenário, onde necessitava do apoio de 342 dos 513 deputados.

“Todas as reformas foram engavetadas e ele ficou muito enfraquecido. É, como os americanos chamam, um ‘lame duck‘ (pato manco, em português), muito inviabilizado para terminar o mandato”, afirma o professor emérito do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer. Segundo ele, com o envio das denúncias, observou-se uma “paralisia” no governo, preocupado em rebater as acusações.

De lá para cá, as “flechadas” enviadas pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tornaram-se a principal preocupação do Planalto. Em público, Temer adotou um discurso incisivo contra as acusações feitas pela PGR. Divulgou notas, deu entrevistas e publicou vídeos em suas redes sociais com críticas ao Ministério Público e aos delatores nas quais se baseou a peça. Nos bastidores, investiu na distribuição de cargos, liberação de emendas e aprovação de matérias para agradar a determinadas fatias do Legislativo.

Entre elas, medidas polêmicas e que sofreram grande reprovação popular, como o decreto que permite a conversão de multas ambientais não quitadas em prestação de serviços e a portaria que flexibiliza as regras de fiscalização do trabalho escravo, acenos para a bancada ruralista.

Na Câmara, o governo contou com apoio para duas matérias importantes na estratégia para o arquivamento das denúncias: a aprovação da Medida Provisória (MP) que deu status de ministério – e, portanto, foro privilegiado – à Secretaria Geral, ocupada pelo também denunciado Moreira Franco, e a validação da MP do Novo Refis, programa de refinanciamento de dúvidas públicas. Este último, flexibilizado em troca de apoio entre os deputados devedores da União.

Para o professor do curso de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ) Michael Mohallem, o “alto custo” pago pelo Planalto para a interrupção das denúncias transformou o mandato de Temer em um “governo de bombeiros”, incapaz de desvincular-se da imagem de crise. “A gente teve uma profunda ruptura da vida política de Brasília. Se já é difícil ter de lidar com essas demandas (do Legislativo), o governo Temer tem o adicional de, por ser frágil, depender basicamente do Congresso”, explica.

Como efeito das denúncias, Temer observou sua popularidade cair a níveis inéditos. Segundo pesquisa da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) divulgada em setembro, apenas 3% da população consideram o governo ótimo ou bom. Já a avaliação do grupo Eurásia, especializado em análise de risco, coloca Temer como o presidente mais impopular do mundo, com apenas 7% de aprovação.

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Outros presidentes
Michel Temer foi o primeiro presidente da República a ser acusado de um crime comum. Na história recente do Brasil, contudo, outros chefes do Executivo tiveram de pausar a agenda governamental para concentrar esforços na defesa de seus mandatos. Os ex-presidentes Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff, apesar de serem objeto de processos distintos dos vivenciados por Temer, também enfrentaram dificuldades em tocar pautas e projetos.

Antes de renunciar ao cargo, em 29 de dezembro de 1992, Collor havia enfrentado, durante 120 dias, um processo de impeachment, que culminou com a sua inelegibilidade pelo intervalo de oito anos. Dilma, por outro lado, defendeu-se de seu impedimento por 244 dias – quase metade do seu segundo mandato. Em ambos os casos, o momento político foi marcado por fortes manifestações populares.

“O impeachment do Collor influenciou o andamento da política e também tivemos problemas na economia. As eleições municipais foram afetadas e o país parou à espera de resolução. No caso da Dilma, foi semelhante”, avalia o professor de Ciência Política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FespSP), Hilton Fernandes. A principal diferença entre Temer e os dois ex-governantes, aponta Fernandes, é que Collor e Dilma não mantinham forte apoio político no Congresso. Como consequência, perderam os mandatos.

Próximos passos
Superada a segunda denúncia enviada pela PGR contra Temer, aliados do Palácio do Planalto não demoraram a anunciar: é o momento de retomada da agenda econômica. A previsão de analistas, contudo, é que o presidente deve enfrentar dificuldades para reorganizar a base diante de medidas de forte resistência popular.

“Se aquele (delações da JBS) foi o pico da crise, agora, no pós-votação, a gente tem o momento de maior estabilidade desde então. O governo manda a mensagem de que não adianta mais enviar denúncia, que ele é capaz de vencê-las”, afirma Michael Mohallem. O professor aponta, contudo, que o resgaste da pauta econômica deve ser a custo de mais desgaste do Planalto.

Em ano eleitoral, o prognóstico é de que os parlamentares busquem se descolar cada vez mais da imagem de um “presidente impopular”. Na votação da segunda denúncia, o governo obteve doze votos a menos do que na primeira. Segundo Hilton Fernandes, as reformas aprovadas deverão ser “pontuais e de pouco impacto no mercado ou na vida do cidadão”. “O momento das reformas é ruim. O timming já passou e o custo de votar a favor de um presidente denunciado vai aumentando”, completa.

 

 

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