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Perfis contra Bolsonaro no Twitter pautam senadores na CPI da Covid

As contas que municiam os parlamentares têm em comum dois comportamentos: a oposição sistemática a Bolsonaro e a preferência pelo anonimato

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Hugo Barreto/Metrópoles
CPI da Covid
1 de 1 CPI da Covid - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Um conjunto de perfis no Twitter tem dividido o palco com senadores que compõem a CPI da Covid. Em comum, dois comportamentos: a oposição sistemática ao governo Jair Bolsonaro e a preferência pelo anonimato. Desde que Bolsonaro ganhou repercussão a partir de táticas massivas em redes sociais, publicações apócrifas e coordenadas tornaram-se alvo de críticas severas. Os opositores ao presidente atribuem a estratégia a “milícias digitais”. Agora, a oposição se vale de alguns destes métodos para desgastar o governo com ataques anônimos e estruturados.

A maioria das páginas que conquistou visibilidade no contexto da CPI da Covid foi criada antes do início dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as ações e omissões do governo durante a pandemia. Ultimamente, no entanto, os perfis Gabinete do Ócio (@GabineteOcio), Tesoureiros do Jair (@tesoureiros) e Jair Me Arrependi (@jairmearrependi) estão em franca evidência. Esse último mudou o nome fantasia para JaIrmer’s Vaccine Race. Em abril, estreou no Twitter o Camarote da CPI (@camarotedacpi), que, em um mês, já reúne 54,3 mil seguidores.

Embora a identidade dos proprietários que alimentam estas contas seja desconhecida do público, os codinomes ganharam protagonismo efetivo na CPI, inclusive com reconhecimento dos próprios senadores.

Esses perfis cobram posicionamento dos parlamentares, oferecem dossiês e chegam a ditar perguntas para os integrantes da CPI. No dia 11 de maio, por exemplo, a conta Tesoureiros do Jair fez uma postagem reproduzindo trecho de live em que o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), conta a uma interlocutora que tem recebido inúmeras contribuições da própria página em questão (Tesoureiros do Jair).

O parlamentar destacou “a grande contribuição” que dois ou três perfis têm dado sistematicamente à CPI e admitiu que os autores dessas páginas não aparecem: “Mandem perguntas para nós. Muitas perguntas que tenho feito aos depoentes vêm das redes sociais. Dois ou três perfis no Twitter têm colaborado muito. O pessoal do Tesoureiros do Jair – essa moçada é muito escondida, mas tem dado uma enorme contribuição”.

Tesoureiros do Jair

 

Numa outra postagem, JaIrmer’s Vaccine Race, em tom bem humorado, usa um meme da atriz Regina Duarte para chamar a atenção do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM): “Tô triste com o senhor, @OmarAzizSenador”. No que o senador responde afetivamente, dando explicações. Em seguida, JaIrmer’s Vaccine Race pede que o parlamentar siga conduzindo os trabalhos e diz que continuará colaborando e contribuindo para elucidação dos fatos. “Está ajudando mesmo. Muito obrigado pela colaboração.”

Também publicado pela conta JaIrmer’s Vaccine Race, um post comemora a utilização de informações levantadas por Tesoureiros do Jair: “Olha aí o dossiê de @Tesoureiros na CPI”. Trata-se de um vídeo em que o senador Randolfe Rodrigues mostra aos colegas parlamentares páginas de um documento em que se baseia para fazer suas interferências durante o depoimento do ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo.

O mesmo JaIrmer’s Vaccine Race marca Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, e Randolfe Rodrigues, em outra publicação, sugerindo que a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, seja provocada a falar “sobre os tapetes de Che Guevara e o pênis na porta da Fiocruz”. Os autores do perfil anônimo chamavam a atenção dos parlamentares para um assunto que poderia vir à tona a despeito do habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) à médica. O HC autorizava Mayra a permanecer calada sobre assuntos correlatos à falta de oxigênio em Manaus.

Na terça-feira (25/5), Randolfe seguiu à risca os conselhos da página JaIrmer’s Vaccine Race. O tema foi um dos pontos altos do depoimento de Mayra Pinheiro à CPI. O vice-presidente interagiu e curtiu ambas as postagens.

Trabalho em equipe

Outras duas páginas que também têm municiado os senadores são Desmentindo Bolsonaro (@desmentindobozo) e Bolsominions Arrependidos (@bolsoregrets). Junto aos perfis de oposição a Bolsonaro já citados na reportagem, eles somam 650,5 mil seguidores no Twitter. Na última terça (25/5), @desmentindobozo comemorou que, pela terceira vez, a página alimentou os senadores durante os depoimentos prestados na CPI.

O administrador do perfil Desmentindo Bolsonaro conversou com a reportagem do Metrópoles, sob a condição de anonimato. Ele diz que as interações dos seguidores com a conta são orgânicas. Afirma que não possui relação direta com os senadores. “Sabemos que alguns parlamentares seguem o nosso perfil, mas não passa disso”, relatou. O responsável pela página citou ainda que todo o material utilizado por ele pode ser encontrado em buscas no YouTube.

Com 105,2 mil seguidores, Tesoureiros do Jair é um dos principais elos da rede de perfis de oposição ao governo Bolsonaro. O autor também prefere não se identificar, alegando medidas de proteção. Ele confirmou ao Metrópoles que existe um grupo coordenado entre as contas engajadas em alimentar a CPI com informações. “Eu diria que é um grupo de amigos que se conheceram nas redes e, em sua maioria, ainda não tiveram a oportunidade de se encontrar pessoalmente. Começamos o contato pelo Twitter e fomos fazendo grupos no Telegram. A gente se coordena, pois vemos que, quando juntamos nossas vozes no mesmo discurso, a coisa pega mais tração”, disse.

O dono do perfil JaIrmer’s Vaccine Race (antes Jair me Arrependi) disse que a ideia de criar a conta no Twitter surgiu em outubro de 2018, logo após o segundo turno das eleições. Ele se inspirou no Trump Regrets, um perfil idealizado para confrontar os posicionamentos do então presidente norte-americano Donald Trump. “Começamos como uma paródia, fazendo zoeira com os eleitores do Bolsonaro desiludidos. Aos poucos, notei que o perfil tinha muito alcance para ser desperdiçado. Passei a usá-lo para repercutir notícias importantes, registrar deslizes do governo e ser mais combativo”, explicou o responsável pelo @jairmearrependi.

O administrador lembrou que o primeiro panelaço contra o governo, mirando o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante a crise de 2019 na Amazônia, foi liderado por ele. Sobre a participação dos perfis nos depoimentos da CPI, o autor do JaIrmer’s Vaccine Race contou que o perfil @tesoureiros foi o responsável por criar um grupo entre os tuiteiros para estabelecer uma conexão com os senadores. “Muitas das nossas provocações acabam chegando à CPI. Lembrando que nossos vídeos e qualquer documento que enviamos são registros públicos. Nenhum é fruto de hackeamento. Só damos contexto”, afirmou.

A administradora do perfil Bolsominions Arrependidos (@bolsoregrets) afirmou que o perfil tornou-se um repositório de dados. “A gente sempre teve essa faceta de depósito de informação. Na CPI das Fake News, percebemos que poderíamos ter ajudado se estivéssemos mais presentes. A gente sempre tem tentado entrar em contato com políticos”, diz a mulher que, assim como os colegas, prefere não ter o nome divulgado. Ela cita como um dos braços importantes para a divulgação de seus conteúdos um podcast comandado por Leila Germano, uma influenciadora que se notabilizou nas redes sociais por divulgar críticas ao governo Bolsonaro. “Como temos alcance razoável no Twitter, deu no que deu”, contou.

O Metrópoles entrou em contato com os senadores citados, que não responderam a tempo da publicação da reportagem. Ao Estadão, que, no dia 24 de maio, publicou matéria “‘Rede paralela’ de informações abastece senadores na CPI da Covid”, a assessoria do senador Renan Calheiros afirmou que, diariamente, o relator da CPI se mune com dados coletados das redes sociais. Cerca de 40 voluntários, entre estudantes, pesquisadores de dados e médicos, fornecem, segundo o staff de Calheiros, observações relevantes ao trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito.

Diante de um novo capítulo com potencial para agitar o palco da CPI – a convocação de nove governadores para depor –, os perfis antibolsonaristas já entraram em ação e convidaram a militância para municiar os parlamentares oposicionistas.

 

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