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Mulher que inspira política antirracismo faz apelo: “Falem, denunciem”

Simone Diniz denunciou empresa que não a contratou por ser negra. Hoje, ela é símbolo de discussões e políticas antirracismo no Judiciário

atualizado

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Luiz Silveira/Agência CNJ
Simone Diniz, mulher negra, com camisa roxa, em seminário contra o racismo no ambiente de trabalho
1 de 1 Simone Diniz, mulher negra, com camisa roxa, em seminário contra o racismo no ambiente de trabalho - Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

Às vésperas do Dia da Consciência Negra, comemorado em 20/11, uma mulher, vítima de racismo, expôs a ferida do preconceito no mercado de trabalho em seminário voltado para a conscientização de um meio majoritariamente branco: o Judiciário.

Ex-doméstica e hoje empresária, dona de uma oficina mecânica, Simone André Diniz, 45 anos, palestrou em seminário que leva o nome dela por determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e fez um apelo a quem presencia casos de racismo: ““Filmem, falem, denunciem, não façam vistas grossas. Se engajem na luta daqueles que precisam ter suas vozes ouvidas. Vidas negras importam”, afirmou.

Durante dois dias (entre 17 e 18/11), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), realizou o Seminário Nacional Simone André Diniz: Justiça, Segurança Pública e Antirracismo. Políticas, posturas e diretrizes foram conversadas e expostas no encontro.

Inspiração

O nome que se dá ao evento não é por acaso. Ele é inspirado na batalha de uma mulher, que representa milhares de brasileiros, vítimas do racismo. Moradora de Garulhos (SP), aos 45 anos, Simone é dona de uma oficina mecânica com o marido e tem duas filhas.

Mas a luta dela começou desde muito jovem. Em 1997, quando respondeu a um anúncio de vaga de emprego para trabalhadora doméstica, Simone foi informada de que a oferta valia apenas para mulheres brancas.

Na época, Simone procurou a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para denunciar a situação. “Sem instrução nenhuma, aos 19 anos, busquei ajuda jurídica, que, por meio de uma ligação, confirmou a violação dos direitos humanos naquele anúncio”, contou durante o seminário.

“Eu não me conformei”, disse Simone André Diniz. A denúncia foi realizada à Subcomissão do Negro da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo. Simone prestou queixa junto à então Delegacia de Crimes Raciais, tendo sido instaurado inquérito policial.

No entanto, embora o delegado de polícia tenha elaborado relatório sobre a notícia crime e enviado ao juiz, o magistrado de São Paulo arquivou o caso. O juiz seguiu manifestação do Ministério Público, que considerou haver falta de indícios, mesmo constando da denúncia anúncio de jornal em que já constava a exigência de cor branca.

Em 2006, quase 10 anos após a denúncia de Simone, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) proferiu Relatório de Mérito concluindo que o Estado brasileiro é responsável pela violação do direito à igualdade perante a lei, à proteção judicial e às garantias judiciais.

O seminário com o nome de Simone atende à recomendação feita pela Corte ao Estado brasileiro, após analisar o Caso 12.001: Simone André Diniz vs. Brasil e identificar violações de direitos humanos da mulher negra.

“Vidas negras importam”

Diante do reconhecimento e dos avanços que a denúncia gerou, Simone falou no evento que este momento é muito importante para todos os que fizeram do antirracismo uma batalha pessoal. “Esse momento é histórico, guardem no coração de vocês, homens e mulheres negras. Vidas negras importam. Necessitamos da ajuda de vocês do Judiciário para reverter esse quadro”, disse.

Pedido de desculpas em nome do Brasil

Durante o evento, um pedido de desculpas de uma juíza negra para uma mulher negra, vítima discriminação e omissão, emocionou os presentes. A juíza auxiliar da Presidência do CNJ e membro do Observatório de Direitos Humanos do órgão, Karen Batista de Souza, fez um desabafo.

“Simone, eu não queria estar aqui. Eu não queria que você tivesse sofrido o que sofreu naqueles dias, que você tivesse tido as portas fechadas por causa da cor da sua pele, que o Judiciário tivesse negado seus direitos, enquanto deveria ser instrumento para garantia de direitos. Não queria ser uma magistrada que faz parte desse Poder Judiciário”, disse.

“Quando fiz concurso, me disseram que juiz é órgão de Estado. Então, como órgão de Estado, quero pedir desculpas em nome do Estado brasileiro”, finalizou a juíza.

Mulher negra, Simone Diniz, abraça juíza do CNJ, Karen em seminário contra racismo
Simone Diniz e Karen Batista de Souza se abraçaram durante o evento

Contra o racismo institucional

Diante do caso, as discussões do seminário giraram em torno de soluções e políticas contra o racismo institucional. Os presentes se empenharam na construção de políticas públicas para igualdade racial, incluindo a formação antirracista continuada e Sistema de Justiça, o acesso à justiça e o enfrentamento ao racismo estrutural a partir de evidências.

A conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Jane Granzotto afirmou que o episódio Simone André Diniz é um caso contundente de racismo institucional. Ela enumerou algumas iniciativas que contribuíram para a construção de uma nova realidade na Justiça, entre as quais a Resolução CNJ n. 203/2015, que dispõe sobre a reserva de 20% a pessoas negras para ingresso na magistratura e nos quadros funcionais do Judiciário.

O presidente do TST, ministro Lélio Corrêa, reforçou que o seminário é resultado de um esforço coletivo e que obteve o maior número de adesões de toda a história do tribunal. Para o ministro, o tema, cujo debate é essencial para a sociedade brasileira, não pode ficar oculto, ignorado, mas, sim, deve ser enfrentado.

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