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STF volta atrás: não há prazo para MP pedir ressarcimento ao erário

Corte já tinha maioria para aprovar entendimento contrário, mas dois ministros mudaram de opinião

atualizado

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Carlos Moura/SCO/STF
plenário STF
1 de 1 plenário STF - Foto: Carlos Moura/SCO/STF

Em uma reviravolta, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em sessão nesta quarta-feira (8/8), que são imprescritíveis as ações de ressarcimento aos cofres públicos em casos de improbidade administrativa. O entendimento só é válido, no entanto, para casos de atos ilícitos dolosos, ou seja, executados com má-fé.

O julgamento do tema teve início na última quinta-feira (2), com 6 votos a favor da prescritibilidade desse tipo de ação. No entanto, sofreu uma reviravolta nesta quarta: os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux mudaram de opinião e passaram a compor a maioria que votou pelo não estabelecimento de prazo para ações de ressarcimento, em casos de improbidade administrativa.

Na prática, o entendimento indica que o Ministério Público não possui limite de tempo para apresentar ação pedindo a agentes públicos para devolverem ao erário recursos desviados, na hipótese de improbidade dolosa.

De acordo com a lei atual sobre o tema, as outras sanções para esse tipo de ato ilícito só podem ser aplicadas caso seja apresentada ação pelo MP até 5 anos após o conhecimento do fato ilegal. Com a mudança de entendimento, as ações de ressarcimento aos cofres públicos estão excluídas desta regra.

O placar final foi de 6 votos a 5. Votaram pela prescritibilidade desses processos o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, e os colegas Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Já os adeptos da tese contrária foram os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Roberto Barroso e Luiz Fux. Esses dois últimos haviam votado junto com o relator, mas mudaram de opinião na sessão desta quarta.

Caso específico
O plenário analisou na sessão de hoje um recurso extraordinário proveniente da cidade de Palmares Paulista (SP). A ação civil pública foi movida pelo Ministério Público do estado contra um ex-prefeito da cidade, um técnico de contabilidade e dois ex-servidores municipais. De acordo com a acusação, em 1995, o grupo cometeu irregularidades na venda de dois veículos da prefeitura.

O MP alegou que os servidores e o prefeito avaliaram e repassaram os carros a preços inferiores aos de mercado. Por isso, à época da apresentação da ação, em 2001, o MP pedia ressarcimento aos cofres públicos no valor de R$ 7.938,41. Com a correção monetária, esse número equivale hoje a mais de R$ 51 mil.

O juiz de primeira instância condenou os quatro acusados ao pagamento de multa, devolução do prejuízo aos cofres públicos e suspensão dos direitos políticos. Três réus, no entanto, recorreram da decisão. Em segunda instância, a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) declarou que a ação estava prescrita, pois fora apresentada seis anos depois do suposto ato ilícito.

O Ministério Público de São Paulo, então, levou o caso ao STF, por entender que a decisão contraria a Constituição. Segundo o MP, a Lei Máxima é clara ao especificar: ações de ressarcimento ao erário não possuem prazo de prescrição.

Sessão anterior
Ao iniciar a análise do caso, na última quinta, oito ministros votaram. Seis entenderam que a prescritibilidade é a regra geral do regime jurídico brasileiro e, portanto, essas ações também deveriam ter prazo de prescrição.

O relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, afirmou: “Se todas as sanções estão prescritas, se não existe mais a possibilidade de ajuizamento de ação de improbidade, como seria possível se ajuizar uma pseudoação de improbidade administrativa pedindo somente uma sanção – o ressarcimento – sem necessidade de comprovação da improbidade, sem o rito correto, sem o devido processo legal correto?“.

No sentido contrário votaram os ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Na última semana, no entanto, o Ministério Público Federal (MPF) fez uma campanha para alegar que, se a decisão fosse confirmada, atrapalharia os trabalhos do MP no combate à corrupção. Em nota técnica encaminhada ao STF, o MPF destacou: “[a determinação] sinaliza para os agentes públicos ímprobos e empresas corruptoras que o tempo sana tudo. (…) Tem potencial, portanto, de motivar negativamente o comportamento dos agentes públicos, dos agentes do mercado e também das partes da relação processual”.

Nesta quarta, o ministro Marco Aurélio Mello votou pela prescritibilidade das ações de ressarcimento, enquanto os colegas Celso de Mello e Cármen Lúcia se manifestaram no sentido contrário. Os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux então decidiram mudar o posicionamento e fizeram com que o segundo grupo passasse a ser maioria.

Mudança
Barroso afirmou ter sido convencido por argumentos apresentados durante a última semana. Conforme ressaltou o ministro, em casos de improbidade, sanções como a perda de cargo público e a suspensão de direitos políticos continuam prescritíveis. “Agora, se um agente público ímprobo, que tenha praticado um ato de corrupção, tem consigo ainda o produto da improbidade, do desvio, e isso possa ser judicialmente demonstrado, não tenho conforto em dizer que ele possa conservar o produto do crime sem que o Estado possa pretender reavê-lo”, disse.

O entendimento da maioria também foi no sentido de o ato de improbidade precisar ser efetivamente comprovado para haver a determinação do ressarcimento. Ministros críticos à imprescritibilidade dessas ações afirmavam que a tese adotada permitiria a condenação de agentes públicos sem o devido processo legal e o direito de defesa.

Para o ministro Alexandre de Moraes, determinar a imprescritibilidade das ações de ressarcimento é “beneficiar a inércia do poder público”. Segundo o relator, não é o tempo o principal empecilho ao combate à corrupção, mas a “incompetência”. O ministro Gilmar Mendes também criticou o entendimento maioritário: “vai gerar uma série de problemas sistêmicos”. Ele condenou ainda a hipótese de a decisão atrapalhar o combate à corrupção ou a Operação Lava Jato.

“Isto nada tem a ver com combate à corrupção e nem com a Lava Jato. A Lava Jato se tornou uma entidade que blinda. Decidir contra ela é decidir contra uma deidade”, disse. Já o ministro Marco Aurélio Mello afirmou ter ficado “pasmo” com a determinação do Supremo Tribunal Federal.

Quanto ao caso específico do recurso extraordinário proveniente de Palmares Paulista (SP), o STF determinou o retorno do caso ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para a Corte, que havia rejeitado a ação por considerá-la prescrita, dar seguimento ao processo e analisar o mérito do caso.

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