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STF pune preso que saiu para trabalhar minutos antes de hora permitida

Homem voltou ao regime fechado após sair para trabalhar na roça às 4h40 e às 4h23. Ele deveria ficar em casa até as 5h

atualizado

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Marcelo Camargo/Agência Brasil
STF
1 de 1 STF - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Enquanto o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes luta para fazer valer as multas aplicadas ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), que descumpre decisão judicial e se recusa, há semanas, a usar tornozeleira eletrônica, a Primeira Turma da Corte puniu um preso em regime semiaberto que saiu para trabalhar, por duas vezes, minutos antes do horário permitido.

Morador de Queimadas, no interior da Paraíba, o pedreiro de 36 anos estava no regime semiaberto há mais de dois anos, monitorado por tornozeleira eletrônica, e a sentença determinava que estivesse em casa das 19h às 5h, de segunda a sexta-feira.

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No entanto, por duas vezes no início de fevereiro de 2020, o homem, que é pai de três filhos e mora de aluguel, saiu de casa para trabalhar às 4h40 e às 4h23, conforme registros da Secretaria de Administração Penitenciária da Paraíba. A Justiça não perdoou e apontou “falta grave”. Ele retornou ao regime fechado e, desde então, está na cadeia pública de Queimadas.

Inconformada, a Defensoria Pública da Paraíba levou o caso até o STF, que, no último dia 9, negou provimento ao agravo regimental.

Condenado a oito anos por estupro de vulnerável, o homem alegou que se atrapalhou nos horários ao sair de casa naqueles dois dias. Ele vinha cumprindo normalmente a condenação, segundo a defesa, desde que foi condenado, em maio de 2017. Segundo relatório da situação processual executória, ao qual o Metrópoles teve acesso, ele já cumpriu quatro anos e oito meses da pena. Restam ainda pouco mais de três anos.

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O relator do processo foi o ministro Alexandre de Moraes, cujas decisões têm sido ignoradas e desrespeitadas por Daniel Silveira. O parlamentar já participou até mesmo de uma festa na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, em 9 de abril. “Não há reparo a fazer”, assinalou Moraes, ao elogiar decisão do tribunal de origem, que afirmou que ʺtais faltas não podem ser relativizadas, sob pena de abrir precedentes muito mais complexos”.

Segundo a Defensoria Pública, esse retrocesso da pena ao fechado é totalmente desproporcional e sem a mínima razoabilidade. O órgão considerou a decisão do tribunal de origem, mantida pelo STF, “vergonhosa”.

“Totalmente antinatural, portanto, considerar falta grave a saída do paciente da sua casa para trabalhar pouco antes das 5 horas da manhã, considerar indisciplinado quem cedo madruga e que está se ressocializando pelo trabalho, até porque sair de casa pouco antes das 5 horas da manhã ou às 5 horas da manhã em ponto dá no mesmo, porque vai estar tudo escuro, e é comum a pessoa que tem responsabilidade acordar atordoada e se confundir nos horários, saindo antes para trabalhar quando poderia ficar em casa descansando mais um pouco”, afirmou a defensoria estadual.

A Defensoria narra que o apenado já estava em uma situação de extrema vulnerabilidade e precisava, especialmente em tempos de pandemia, “realizar milagres para conseguir algum trabalho e para retomar aos poucos a sua dignidade e a sua inserção no meio social”.

“Parece até piada: paciente deve ter sido motivo de caçoada… Foi recolhido ao regime fechado por sair para trabalhar na roça mais cedo quando poderia ficar de boa mais um tempo em casa descansando… Foi recolhido ao cárcere por excesso de responsabilidade com o trabalho, que é fator de sua ressocialização… Cara burro! É isso que vão dizer ao paciente”, afirmou o órgão.

A Defensoria Pública analisou também que a decisão desmotiva a ressocialização de presos.

“Qual o incentivo que este paciente terá agora para buscar sua ressocialização, se o próprio Poder Judiciário a obsta por causa de um excessivo rigor que, muitas vezes, a depender de quem esteja sendo julgado, é relativizado? Aliás, deveria o Poder Judiciário parabenizá-lo por acordar ainda durante a madrugada para buscar trabalho no campo, algo duríssimo, ainda mais em tempos de pandemia”, disse.

“Enfim, mais que determinar injusta regressão de regime, o que a Justiça faz com o paciente é inadmissível humilhação, concessa maxima venia”, prosseguiu.

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