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Dona de casa é a principal ocupação de candidatas nas Eleições 2020

Os registros apontam que 11,8% das concorrentes declararam essa atividade como profissão, segundo levantamento do Metrópoles

atualizado

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Igo Estrela/Metrópoles
Donas de casa candidatas nas eleições 2020 Tia Ana cidade ocidental 2
1 de 1 Donas de casa candidatas nas eleições 2020 Tia Ana cidade ocidental 2 - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

Dona de casa, a jovem Laíne Souza, de 24 anos, é mais uma mulher que tenta entrar na carreira pública. Ela cursou pedagogia, mas não atua na área. Abdicou do sonho de lecionar para poder cuidar do filho autista, um menino de 5 anos.

Laís não está sozinha. Dos afazeres domésticos e dos cuidados com a família, elas se lançam na disputa política. Dona de casa é a ocupação mais comum entre as candidatas nas Eleições 2020. Os registros mostram que 11,8% delas declararam essa atividade como profissão. O que corresponde a 22 mil das 185 mil postulantes.

Há quatro anos, 24,4 mil candidatos se enquadravam nessa profissão, o que representava 4,9% do total de concorrentes. Já neste ano, o índice caiu para 3,9% do total. Somente 179 homens se declararam como donos de casa em 2020.

Os dados fazem parte de um levantamento do Metrópoles baseado em informações registradas e divulgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Laíne, a personagem que o leitor conheceu no início da reportagem, sabe: não é fácil conciliar a rotina doméstica e o trabalho político. Mas, ainda assim, ela defende essa necessidade. “O dia precisaria ter mais de 24 horas. É um desafio ser mãe, mulher, jovem e candidata”, brinca.

Foi das experiências pessoais que nasceu o desejo de concorrer a um cargo público pelo PT em Mogi das Cruzes, na região metropolitana de São Paulo, onde mora. “Decidi me posicionar politicamente porque na minha cidade temos mais de 90 mil pessoas com deficiência e não conseguimos os atendimentos essenciais, básicos. Somos muitas mães, famílias e vozes”, explica.

Representatividade

A eleição deste ano tem recorde de mulheres concorrendo a uma vaga. Segundo o TSE, 33% dos pedidos para candidaturas em 2020 foram feitos por pessoas do sexo feminino. Em 2016, 641 mulheres foram eleitas para o cargo de prefeita. No mesmo pleito, outras 7,8 mil se elegeram vereadoras.

O ranking de profissões mais comuns declaradas por elas é composto ainda por servidoras públicas municipais (7%), agricultoras (5%) e professoras de ensino fundamental (4,3%).

Aos 65 anos, a carioca Maria Hilda Gomes se lançou como candidata a vereadora em Valparaíso de Goiás, município goiano distante 30 km do Plano Piloto. Ela é uma das postulantes que se registraram como donas de casa no TSE. Hilda da Morada, como é conhecida, disputa pelo PSB.

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“Ninguém da família nunca se interessou por política. As minhas filhas acham diferente, mas me apoiam muito. Onde eu moro são muitas donas de casa e idosos. Essa luta pelo social e pela cidadania me motivou a disputar”, conta.

Além disso, Hilda acredita que candidaturas como a dela trazem renovação para o campo político. “As pessoas que eu abordo reforçam que precisamos de nomes novos na política para fazer a diferença”, conclui.

Reconhecer dificuldades

Assim como Hilda da Morada, Ana Maria Rodrigues de Jesus, 57 anos, se lançou na carreira política. Na Cidade Ocidental, município distante 45 km do centro de Brasília, ela é uma das concorrentes a vereadora pelo PT.

Nas urnas, ela se identifica como Tia Ana (foto em destaque), que é mãe de três professores. Uma de suas bandeiras é a educação. “Sei da importância da educação para mudar a realidade das pessoas”, enfatiza.

Para ela, as donas de casa não podem ser vistas como “inferiores” na corrida eleitoral. “Conheço as dificuldades de ser mãe e administrar o lar. É muito importante ter a dona de casa na política porque ela saberá onde o calo aperta na economia doméstica, eu faço isso há 40 anos”, defende.

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Candidaturas efetivas

Por lei, cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. Dessa forma, o percentual mínimo de concorrentes do sexo feminino por partido é obrigatoriamente de 30%. A Justiça Eleitoral exige também a divisão dos recursos para campanha.

É para esse aspecto que o consultor e cientista político da Universidade de Brasília Leonardo Barreto chama a atenção. “Temos sempre que avaliar esses dados e pensar o quanto são candidaturas efetivas”, pondera.

De acordo com o especialista, os tribunais eleitorais são rígidos para o cumprimento da cota mínima. É onde nasce o problema. “Muitos partidos criam candidaturas só para preencher essas vagas. Muitas vezes as postulantes declaram que são donas de casas, mas foram plantadas ali para cumprir o mínimo legal”, detalha.

Apesar da prática discriminatória e ilegal, há bons exemplos. “Existem partidos que fazem recrutamento, cursos e investem na capacitação e na qualificação da candidata”, aponta. Essa seria uma maneira de aumentar a competitividade das concorrentes.

Leonardo salienta que para uma mudança de representatividade na política, o sistema de cotas não é o melhor caminho. Para ele, o ideal seria o número de cadeiras, ou seja, de cargos reservados para mulheres. “Definir o número mínimo de vagas que deveriam ser preenchidas por mulheres. Contudo, os donos das cadeiras hoje não veem essa ideia com boa intenção”, critica.

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