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Bloco C: metade comida, metade negócio

Quando um restaurante inaugura na cidade, demoro um pouco a ir. Ainda mais quando ele chega meio incensado e com ampla divulgação. Desconfio quando vejo blogueiros achando tudo maravilhoso e perfeito

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Acervo Metrópoles
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Quando um restaurante é inaugurado na cidade, demoro um pouco a ir. Ainda mais quando ele chega meio incensado e com ampla divulgação. Desconfio logo quando vejo um bando de blogueiros “famintos” achando tudo perfeito, postando maravilhas nas redes sociais com 343 mil hashtags. Todos deslumbrados. E esse roteiro se repetiu com o Bloco C, desde sua estreia. Assessoria bombando, socialites comentando e políticos frequentando.

Confesso, me deu preguiça. Sou avessa a badalações. Deixei a poeira abaixar um pouco e lá fui testar horários e pratos. Almoço, jantar; jantar, almoço. Acompanhando os públicos, os comportamentos e, é claro, a comida. É meu compromisso com vocês aqui (e levo muito a sério), mas é pura diversão também. Muitas dondocas, muitos ternos e gravatas… Mas encontrei amigos e amigas que prezam pela boa mesa. Isso, definitivamente, é um forte sinal.

O chef e empresário Marcelo Petrarca sabe exatamente o restaurante que abriu. Escoltado pelos irmãos advogados, ele sabe que negócio é negócio e cozinha é cozinha. E aí, propôs à família o equilíbrio: metade cozinha, metade negócio. É uma equação que pode funcionar. No caso dele, procede.

Ao meio-dia, o singelo convite a experimentar o almoço executivo (entrada, principal e sobremesa) a R$ 51. Vem uma saladinha, com tomate assado, folhas frescas e panko – uma farinha de rosca japonesa metida à besta. Aqui, a primeira observação: a banda de tomate assado faz diferença. Sabe por quê? Porque demonstra que pode – e deve – haver carinho no preparo de uma simples salada.

No Bloco C, não tentam empurrar o tomate cru, grosseiramente picado sobre algumas folhas verdes, muitas vezes sem molho – como acontece na maioria dos restaurantes daqui. O tomate assado do Petrarca tem sabor, textura e confere à salada um calorzinho aconchegante. Como eu disse, faz toda diferença.

Ainda no executivo. Os pratos – peixe ou carne – são bem servidos e bem executados. Polenta e carne. Purê e peixe. E vice-versa. Carne e peixe gostosos, purê aveludado, tudo bem executado. O sabor fica impregnado. Isso conquista o paladar, exceto pelo purê de banana que acompanhava o peixe, doce além da conta para meu gosto. Para arrematar, o chef lança em pote transparente a sua mousse de chocolate amargo. Antes servida em uma mísera colher, a sobremesa ganhou mais uma porçãozinha para adular os chocólatras.

Aí, pergunto: dá vontade de voltar? Simmmmm….Vai bem para as papilas gustativas sem esvaziar a conta bancária. Bom, então, voltemos. À noite, o cenário é o mesmo? Não.

Muda. Lembrem-se, sou arquiteta. A luz suaviza, seduz. O concreto ganha outros ares, o azulejo vibra mais intenso e aguça a fome do brasiliense.

Vamos de quê? De pratos mais especiais, mais requintados. A noite pede isso. Pede a carta de vinhos e aí é festa. Equilibrada – mais uma vez – para bolsos mais conservadores ou mais soltos e empolgados. O atendimento, já atencioso de dia, melhora à noite incrivelmente.

Experimentei de entrada: burrata cremosa com passata de tomate (R$ 48) e steak tartar de filé com batatas crocantes (R$ 44). De principal, canelone de ragu de costela bovina gratinado com grana padano (R$ 57), filé com rapadura ao molho rôti com risoto de grana padano e rapadura e polvo grelhado com batatas crocantes e molho de vinho branco (R$ 82). Honestamente, poucos reparos. Pontuais. Excesso de doçura no filé incomodou e foi fora da curva.

Um ponto que me chamou a atenção, e que segue a tendência de bons chefs brasileiros, foi a seção de arrozes. Tem de polvo, de bacalhau, de pato. É de tirar o chapéu dar destaque a esse tipo de preparo típico da culinária brasileira. Mas aqui o equilíbrio, de que falamos lá no início de texto, cambaleia. O negócio fala mais alto. Sim, porque cobrar R$ 78 por um prato de arroz é caro, assim como são extravagantemente caros os camarões com arroz cremoso de curry e manga a R$ 95. Penso, é negócio. E lembro-me da ex-chefe do chef que, no Zuu – sua antiga casa –, cobrava o olho da cara por uma comida que não valia isso tudo.

É a hora que me sinto em Brasília, quando vejo que há granfinos de plantão dispostos a pagar R$ 95 por um prato que vale menos que isso. Tudo bem que é camarão, mas o atacante de Pelotas – senhor Petrarca (ex-jogador de futebol) – não desembolsaria tal quantia por esse prato, nem em euro – e olha que o chef, com menos de 30 anos, aperfeiçoou seus conhecimentos pela Itália e Espanha numa época que o euro não valia mais de 4 reais. Voltou à Brasília e passou pelo Zuu, Grand Cru e Gazebo, carimbando assim seu passaporte em restaurantes com veia de comida contemporânea.

Outra coisa que me incomodou foi o excesso de pratos com azeite de trufas. Contei seis. Ui…arrepio. Há um certo deslumbre com as trufas. São raras, caras e conferem sabor especial. Mas em seis pratos é excessivo. Desculpe, mas soa negócio para impressionar leigos atrás de status. Não precisa, chef.

E, para finalizar, um conselho… não ao chef, mas sim ao cliente: na sobremesa, vá de churros de banana (R$ 21). Genial, um dos grandes trunfos do Bloco C. Por mais enjoativo que pareça, vale cada garfada.

Cortês sim; omissa, não.

DEVO IR?
Vá sim. De preferência, de dia.

PONTO ALTO:
A qualidade dos ingredientes, a execução do chef.

PONTO FRACO:
Os preços desnecessários do cardápio de noite.

211 Sul, Bloco C, Loja 17, 3363.3062

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