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SP: mapa do tráfico revela polícia focada na periferia e tímida em áreas nobres

Mapa do tráfico de drogas, elaborado pelo MPSP, mostra maior número de registros no centro e na periferia e poucas ações em áreas nobres

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Fábio Vieira/Metrópoles
Operação da Polícia Civil na Cracolândia, no centro de São Paulo
1 de 1 Operação da Polícia Civil na Cracolândia, no centro de São Paulo - Foto: Fábio Vieira/Metrópoles

São Paulo – Um mapa do tráfico de drogas, elaborado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP), revela que as ocorrências policiais estão concentradas na periferia e no centro da capital paulista. Já em bairros nobres, as ações registradas são tímidas e destoam das demais regiões.

A ferramenta compila, ao todo, 17.091 ocorrências de tráfico de drogas, registradas entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2023. A discrepância entre as regiões (imagens abaixo) fica evidente no mapa de calor que reúne todos os casos computados pela polícia.

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Pelo levantamento, os bairros campeões de registros são República (655 boletins de ocorrência) e Santa Cecília (547), na região onde fica a Cracolândia, além da Brasilândia (638), na zona norte, Sapopemba (552), na zona leste, e do Capão Redondo (525), na zona sul.

Qualquer um desses bairros supera, sozinho, as ocorrências nos 10 distritos mais valorizados da cidade, que, mesmo somados, não chegam a 400 registros de tráfico de drogas. No Brooklin, por exemplo, foram oito casos. Na região de Moema, outros 24. Já no Itaim Bibi, 37.

Fatores

Secretário especial de Políticas Criminais do MPSP, Arthur Pinto de Lemos Junior afirma que o objetivo da ferramenta é permitir uma análise mais ampla do cenário do tráfico na capital paulista e, a partir da mancha criminal, contribuir para “políticas públicas na área de segurança e urbanização”.

“O mapa permite visualizar que o mesmo local conta com mais de uma ocorrência ou que tem sido alterado em razão do policiamento ostensivo”, afirma o promotor ao Metrópoles.

Para Lemos Junior, as concentrações observadas no mapa devem ser analisadas “em conjunto a outros fatores”, como “densidade e perfil demográfico” e “presença de equipamentos públicos”. “Em suma, trata-se de análise multifatorial, exigindo análise dos diversos fatores de influência na realidade do consumo e da venda de entorpecentes”, diz.

Na visão do promotor, a ferramenta também poderia ser usada para “instruir investigações e ações penais” e até ser consultada durante audiências de custódia – quando um preso é apresentado a um juiz para decidir se deve ou não responder em liberdade.

Se o flagrante foi feito em um ponto recorrente de tráfico, a tendência deveria ser a manutenção da prisão.

Ação policial

Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o cientista político André Zanetic avalia que, como a ferramenta é feita com base em registros em delegacias, ela reflete mais os locais em que há resultado de ações policiais do que, de fato, os principais pontos de atuação de traficantes.

“Não necessariamente a área com mais ocorrências de tráfico é onde há mais tráfico”, pontua. “Muito mais do que a distribuição do crime, em si, pela cidade, o mapa indica onde a polícia está focada.”

Segundo Zanetic, o mapa tende a apresentar concentrações de tráfico em regiões em que é mais fácil realizar flagrante, como é o caso da Cracolândia, ou aquelas de rendas mais baixas.

“Em áreas de elite, as pessoas usam mais a droga dentro de casa e o tráfico não é feito a céu aberto. Esse tipo de consumo é também uma forma de proteção”, afirma. “Já em áreas periféricas, ainda que a mesma lógica se aplique, o respeito aos direitos é menor. Acontece, por exemplo, de a polícia atender um chamado do 190 e entrar na casa de alguém para fazer a prisão.”

Viés racial

Especialista em Segurança Pública e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), Rafael Alcadipani diz que o foco do combate às drogas historicamente acontece na periferia e também apresenta viés racial.

“Um negro tende a ser preso com uma quantidade de droga com a qual um branco, quando é pego, é considerado usuário”, afirma o especialista. “Existe uma desproporcionalidade no que diz respeito às prisões em relação ao local e à raça. Isso os estudos científicos mostram.”

Alcadipani afirma, ainda, que os bairros nobres são “mais estruturados e com mais presença policial”, o que dificulta o tráfico à vista de todos. “O custo do imóvel, para manter um ponto de tráfico, também é muito maior em bairro nobre e tende a ser mais regulado, com contrato e outras exigências”, diz.

Já José Vicente Filho, que é ex-secretário nacional de Segurança Pública e coronel reformado da PM, afirma que os patrulhamentos policiais são responsáveis pela menor parte das apreensões de droga.

“A grande apreensão ocorre justamente nos pontos onde chega a droga e a polícia alcança por meio do serviço de inteligência”, diz. “Em bairros nobres, as apreensões acabam sendo pequenas porque são consumidores que recebem a droga em casa, não tem o passador na esquina.”

Dados

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma que mantém “colaboração contínua” com outros órgãos e entidades, entre eles o MPSP.

“A pasta acredita que, quanto mais dados houver sobre a criminalidade, melhor será a adoção de políticas de segurança para o enfrentamento dela. Essa colaboração reforça o compromisso da gestão com a transparência e a prestação de contas à sociedade”, diz.

A SSP não respondeu por quais razões há um “vazio” de ocorrências em bairros nobres.

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