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Venezuelanos ricos buscam status de refugiados na Europa

ONU começará a enviar recursos para o país sul-americano, após concordância do presidente Nicolás Maduro

atualizado

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Ansa Brasil
Foto colorida do presidente da Venezuela, Nicolas Maduro - Metrópoles
1 de 1 Foto colorida do presidente da Venezuela, Nicolas Maduro - Metrópoles - Foto: Ansa Brasil

O advogado venezuelano Eliecer Jiménez chegou a Bruxelas há 13 meses como turista. Assim que pisou na Europa, fez um pedido de refúgio. Foi atendido e levado a um abrigo onde, para sua surpresa, teve de dividir beliches com sírios e líbios.

Jiménez engrossa uma lista de 200 mil venezuelanos que, em 2018, solicitaram refúgio pelo mundo. O número, segundo a ONU, já supera o de novos pedidos de sírios, que chegou a 42 mil no mesmo período. Os pedidos são duas vezes maiores que o volume de estrangeiros que cruzam o Mediterrâneo em direção à Europa.

Segundo a Organização Internacional de Migrações, 104 mil pessoas desembarcaram na Grécia, Itália e Espanha desde janeiro. “Foi um choque para mim”, disse Jiménez. “Logo entendi que a situação venezuelana é a mesma de algumas das maiores tragédias de hoje.”

O advogado alega ter sido alvo de perseguição por defender opositores na Venezuela. Jiménez ficou no albergue por sete meses e, após receber documentos de refugiado, passou a ganhar uma ajuda para alugar um apartamento modesto. Hoje, estuda idiomas para tentar voltar ao mercado de trabalho.

Migração
Ainda que existam 3 milhões de venezuelanos vivendo fora do país, grande parte é qualificada como imigrante econômico. Apenas são refugiados os perseguidos políticos. No total, 365 mil venezuelanos pediram status de refugiado no mundo desde 2014 O número mais que duplicou. No ano passado, foram 103 mil solicitações. Em 2018, mais de 205 mil em dez meses.

A grande maioria está na América Latina. Desde 2014, 150 mil fizeram pedidos no Peru e 65 mil, no Brasil. Nos EUA foram 72 mil pedidos. Os números ainda estão distantes dos mais de 5,4 milhões de refugiados sírios pelo mundo. Mas o auge do êxodo da Síria foi em 2014 e 2015. Hoje, os novos pedidos de venezuelanos superam os novos casos de sírios.

Jaime Santos, de 33 anos, não teve a mesma sorte de Jiménez. O dentista chegou a Madri há duas semanas, mas não conseguiu pedir refúgio. Pelo procedimento, ele tem de se apresentar a uma delegacia de polícia. “O problema é que, por dia, a delegacia atende a 99 pessoas”, disse. O resultado é que a fila começa a ser formada na noite anterior.

Santos contou que chegou ao local às 21 horas, na esperança de ser atendido quando o dia clareasse. “Na ponta da fila, havia pessoas vendendo o lugar por ¤ 200”, queixou-se. No dia seguinte, ao falar com a reportagem, Santos disse que não tinha conseguido ser atendido. “Dormi na calçada e não serviu para nada.”

O venezuelano David Placer, autor do livro Los Brujos de Chávez (“Os Bruxos de Chávez”), que também vive em Madri, afirma que a Espanha tem negado refúgio para a maioria dos venezuelanos. “Muitos alegam que, por terem participado de protestos, foram alvo de repressão e têm o direito de obter status de refugiado”, disse. “A piada que se faz é que a cada voo da Iberia, entre Caracas e Madri, volta para a Venezuela apenas o piloto e as aeromoças.”

Muitos chegam com muito dinheiro. Francisco Javier Rodríguez, que trabalha há dez anos como gestor de fundos de investimentos em Madri, aponta um fluxo importante de pessoas com investimentos de mais de ¤ 500 mil. Em Madri, a quantidade de venezuelanos levou o bairro de Salamanca a ser rebatizado de “Little Venezuela”.

Ali estão nomes como Miguel Ángel Capriles, magnata do setor imobiliário e primo de Henrique Capriles, líder opositor. O bairro tem um preço médio de ¤ 6 mil por metro quadrado, um dos mais altos da Europa. Prédios inteiros foram comprados por venezuelanos, como a família Cohen, dona da construtora Sambil, e o banqueiro Juan Carlos Escotet.

Ajuda humanitária
A ONU começará a enviar ajuda humanitária à Venezuela, numa tentativas de estabilizar o fluxo de refugiados que deixam o país. O anúncio foi feito depois do sinal verde dado pelo governo de Nicolás Maduro, que até então recusava qualquer ajuda internacional temendo que ela servisse de pretexto para uma intervenção militar no país.

Segundo a ONU, até o mês passado, Caracas rejeitava o termo “emergência humanitária” e, portanto, não permitia a atuação de agências internacionais. Após mudança de posição de Maduro, um pacote inicial de US$ 9,2 milhões (cerca de R$ 35 milhões) será liberado. O dinheiro ficará sob o controle de agências internacionais.

A crise na Venezuela resultou no êxodo de 3 milhões de pessoas, no que é considerado o maior fluxo migratório na história recente da América Latina. Apenas em 2018, mais de 205 mil venezuelanos solicitaram refúgio e centenas de milhares cruzam fronteiras como imigrantes.

A ONU acredita que o fluxo aumentará nos próximos meses e apenas uma melhora real das condições de saúde e de alimentação interromperá o fluxo.

Na próxima semana, a crise venezuelana entrará pela primeira vez na lista dos programas humanitários divulgados pela ONU. A entidade lançará um apelo global para crises em Iêmen, Síria, Líbia e outros países, entre eles a Venezuela.

Nutrição
Aprovados nesta semana, US$ 2,6 milhões serão destinados à Unicef para a “recuperação nutricional de crianças com menos de 5 anos, mulheres grávidas ou que estejam amamentando”. Oito Estados venezuelanos serão atendidos.

Um outro montante, de US$ 1,7 milhão, será destinado ao atendimento de mulheres e meninas, principalmente nos Estados de fronteira com Colômbia e Brasil. A maior parcela do dinheiro irá para a Organização Mundial da Saúde (OMS). A agência terá US$ 3,6 milhões para gastar no fortalecimento de hospitais, ajudar a pagar salários e comprar remédios.

Segundo uma fonte ouvida pelo jornal, as agências internacionais estavam lidando apenas “com os sintomas da crise”. Até o momento, elas atuavam apenas fora dos limites do país – 40 entidades têm atendido a população que deixou a Venezuela.

Manobra
Na ONU, fontes acreditam que este primeiro passo da ajuda humanitária marque o início de um processo que permitirá uma presença maior da entidade no país. Jorge Arreaza, chanceler venezuelano, durante visita recente a Genebra, indicou que o país não vivia uma “emergência humanitária”, que “todos tinham acesso a saúde” e garantiu que a crise era “manobrada” pelos americanos, em busca de fazer Maduro renunciar.

A Organização Pan-americana de Saúde (Opas) denunciou que um de cada três médicos venezuelanos já deixaram o país e informou o aumento nos casos de aids, malária, tuberculose, sarampo, difteria e de outras doenças.

Em 2014, por exemplo, existiam registrados 66,1 mil médicos na Venezuela. Em 2018, 22 mil foram embora. Segundo a Opas, em mortalidade infantil, o país regrediu 40 anos. Os índices de 2017 são equivalentes ao que se registrava na Venezuela em 1977.

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