Os bombardeios de quinta-feira (9/3) em toda a Ucrânia estiveram entre os mais pesados infligidos pela Rússia desde o início da invasão. Segundo Kiev, na ofensiva teriam sido usados mísseis hipersónicos.
As forças russas usaram esse tipo de equipamento balístico pela primeira vez em 18 de março de 2022, contra um depósito de armamentos e munição no lugarejo de Deliatyn. Na ocasião, o presidente americano, Joe Biden, admitiu que os mísseis eram “quase impossíveis de deter”.
Ao apresentar o arsenal nacional em 2018, seu homólogo russo, Vladimir Putin, já louvara as novas armas como “invencíveis”.
Pode ter sido uma descrição exagerada para fins de propaganda, mas contém um quê de verdade: mísseis hipersônicos diferem das armas balísticas convencionais de maneiras que os tornam extremamente difíceis de ser identificados e interceptados pelos sistemas de defesa. É sobretudo uma questão de velocidade e altitude.

A relação conturbada entre Rússia e Ucrânia, que desencadeou conflito armado, tem deixado o mundo em alerta para uma possível grande guerraAnastasia Vlasova/Getty Images

A confusão, no entanto, não vem de hoje. Além da disputa por influência econômica e geopolítica, contexto histórico que se relaciona ao século 19 pode explicar o conflito Agustavop/ Getty Images

A localização estratégica da Ucrânia, entre a Rússia e a parte oriental da Europa, tem servido como uma zona de segurança para a antiga URSS por anos. Por isso, os russos consideram fundamental manter influência sobre o país vizinho, para evitar avanços de possíveis adversários nesse localPawel.gaul/ Getty Images

Isso porque o grande território ucraniano impede que investidas militares sejam bem-sucedidas contra a capital russa. Uma Ucrânia aliada à Rússia deixa possíveis inimigos vindos da Europa a mais de 1,5 mil km de Moscou. Uma Ucrânia adversária, contudo, diminui a distância para pouco mais de 600 kmGetty Images

Percebendo o interesse da Ucrânia em integrar a Otan, que é liderada pelos Estados Unidos, e fazer parte da União Europeia, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, ameaçou atacar o país, caso os ucranianos não desistissem da ideiaAndre Borges/Esp. Metrópoles

Uma das exigências de Putin, portanto, é que o Ocidente garanta que a Ucrânia não se junte à organização liderada pelos Estados Unidos. Para os russos, a presença e o apoio da Otan aos ucranianos constituem ameaças à segurança do paísPoca/Getty Images

A Rússia iniciou um treinamento militar junto à aliada Belarus, que faz fronteira com a Ucrânia, e invadiu o território ucraniano em 24 de fevereiroKutay Tanir/Getty Images

Por outro lado, a Otan, composta por 30 países, reforçou a presença no Leste Europeu e colocou instalações militares em alerta OTAN/Divulgação

Apesar de ter ganhado os holofotes nas últimas semanas, o novo capítulo do impasse entre as duas nações foi reiniciado no fim de 2021, quando Putin posicionou 100 mil militares na fronteira com a Ucrânia. Os dois países, que no passado fizeram parte da União Soviética, têm velha disputa por territórioAFP

Além disso, para o governo ucraniano, o conflito é uma espécie de continuação da invasão russa à península da Crimeia, que ocorreu em 2014 e causou mais de 10 mil mortes. Na época, Moscou aproveitou uma crise política no país vizinho e a forte presença de russos na região para incorporá-la a seu territórioElena Aleksandrovna Ermakova/ Getty Images

Desde então, os ucranianos acusam os russos de usar táticas de guerra híbrida para desestabilizar constantemente o país e financiar grupos separatistas que atentam contra a soberania do EstadoWill & Deni McIntyre/ Getty Images

O conflito, iniciado em 24 de fevereiro, já impacta economicamente o mundo inteiro. Na Europa Ocidental, por exemplo, países temem a interrupção do fornecimento de gás natural, que é fundamental para vários delesVostok/ Getty Images

Embora o Brasil não tenha laços econômicos tão relevantes com as duas nações, pode ser afetado pela provável disparada no preço do petróleo Vinícius Schmidt/Metrópoles
Alta velocidade, baixa altitude
Mísseis hipersônicos alcançam de Mach 5 a Mach 10 – ou seja, voam de cinco a dez vezes mais rápido do que o som. O tipo usado para destruir o depósito de Deliatyn foi um “Kinzhal” (“adaga” em russo), de oito metros de comprimento.
Segundo certas fontes, ele alcança 6 mil quilômetros por hora, o que seria Mach 5, outros lhe atribuem velocidade Mach 9 ou até Mach 10. Seja como for, é rápido. Tanto, que “a pressão do ar na frente da arma forma uma nuvem de plasma que absorve ondas de rádio”, explicam os peritos armamentistas do website americano Military.com.
Isso dificulta muito a detecção dos Kinzhal e outras armas hipersônicas por sistemas de radar.
O segundo motivo para a baixa detectabilidade, é que eles voam muito mais baixo do que os mísseis balísticos convencionais, no que se denomina uma “trajetória balística de baixa atmosfera”. Isso implica que, quando um sistema de defesa baseado em radar os localiza, eles já estão tão perto do alvo que em muitos casos não é mais possível interceptá-los. Para completar, são capazes de mudar de direção em pleno voo.

Capitais europeias no raio de alcance
Os mísseis hipersônicos podem ser lançados a partir do ar e de navios e submarinos, e estão aptos a portar ogivas nucleares. Os Kinzhal atingem alvos a até 2 mil quilômetros de distância, enquanto outros armamentos semelhantes alcançam cerca de mil quilômetros.
Caso estacionados no exclave russo de Kaliningrado, no Mar Báltico, por exemplo, eles teriam em seu raio de alcance diversas capitais europeias. Berlim fica a menos de 600 quilômetros.
Na época das primeiras ofensivas hipersônicas, contudo, analistas sustentaram tratar-se de eventos isolados: apesar das vantagens perante os foguetes convencionais, Moscou não os empregaria indiscriminadamente na guerra contra a Ucrânia, até por não dispor de um grande número deles.
Em maio de 2022, o general da Força Aérea dos EUA Glen D. Van Herck afirmou a um subcomitê do Senado para serviços armados que a Rússia estaria tendo problemas com seus mísseis hipersônicos na Ucrânia, no tocante à precisão.