O prêmio Nobel da Paz de 2022 foi dividido entre um ativista da Belarus e dois grupos de defesa dos direitos humanos da Rússia e da Ucrânia. Além de chamar a atenção para a guerra entre os dois últimos países, a homenagem tem a intenção de mostrar a situação precária de liberdade civil existente em Belarus.
Ales Bialiatski (foto em destaque) está preso por suposta evasão fiscal desde julho de 2021. Um dos criadores do Centro de Direitos Humanos Viasna, ele nasceu em Vyartsilya, na Rússia, em 25 de setembro de 1962; já os pais do ativista são bielorussos. A família retornou a Belarus em 1965 e, desde então, Bialiatski não saiu mais do país. Formou-se em literatura pela Homiel State University em 1984 e, durante a graduação, começou a se aproximar da luta pelos direitos humanos.
Desde que criou o Viasna, em 1996, Bialiatski sofreu retaliações do governo de Belarus. No início, ele e os companheiros ajudavam pessoas presas por participarem de manifestações. Depois, a organização cresceu e, em 1999, tornou-se oficialmente um grupo organizado e reconhecido em âmbito internacional. A entidade tem como principal objetivo contribuir para o “desenvolvimento da sociedade civil na Bielorrússia, a partir do respeito aos direitos humanos, descrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Constituição da República da Bielorrússia”.
Bialiatski ficou preso entre 2011 e 2014, acusado de evasão fiscal, mesmo provando que o dinheiro em suas contas bancárias visava custear os trabalhos do Viasna. Livre, venceu o Right Livelihood Award, conhecido como o “Prêmio Nobel Alternativo”, em 2020.
Opositor ferrenho do governo de Aleksandr Lukashenko em Belarus, voltou a ser detido em julho de 2021, novamente sob a acusação de evasão fiscal. Não houve julgamento até hoje e, por isso, ele continua preso. O comitê responsável pelo Nobel pediu oficialmente pela liberdade de Bialiatski.
Guerra da Ucrânia
Lukashenko, contra quem Bialiatski luta, tem sido um dos principais apoiadores do presidente russo Vladimir Putin na invasão da Ucrânia. E aqui entram os outros dois grupos que dividiram o prêmio Nobel da Paz deste ano.
O grupo Memorial, da Rússia, foi fundado em 1987 por Andrei Sakharov, vencedor do Nobel da Paz, e Svetlana Gannushkina. O objetivo era impedir que as vítimas do regime comunista na antiga União Soviética caíssem no esquecimento. “Além de estabelecer um centro de documentação sobre as vítimas da era estalinista, o Memorial compilou e sistematizou informações sobre opressão política e violações de Direitos Humanos na Rússia. A Memorial tornou-se a fonte mais confiável de informações sobre prisioneiros políticos em centros de detenção russos”, detalhou a Academia do Nobel.
Conhecida como a maior organização de direitos humanos da Rússia, o Memorial foi proibido de existir pela Suprema Corte do país. Segundo o juiz que tomou a decisão, o grupo é considerado “agente estrangeiro” e corrobora com o terrorismo e o extremismo. Desde então, a organização e outras entidades internacionais lutam para que a sentença seja revista.

A relação conturbada entre Rússia e Ucrânia, que desencadeou conflito armado, tem deixado o mundo em alerta para uma possível grande guerraAnastasia Vlasova/Getty Images

A confusão, no entanto, não vem de hoje. Além da disputa por influência econômica e geopolítica, contexto histórico que se relaciona ao século 19 pode explicar o conflito Agustavop/ Getty Images

A localização estratégica da Ucrânia, entre a Rússia e a parte oriental da Europa, tem servido como uma zona de segurança para a antiga URSS por anos. Por isso, os russos consideram fundamental manter influência sobre o país vizinho, para evitar avanços de possíveis adversários nesse localPawel.gaul/ Getty Images

Isso porque o grande território ucraniano impede que investidas militares sejam bem-sucedidas contra a capital russa. Uma Ucrânia aliada à Rússia deixa possíveis inimigos vindos da Europa a mais de 1,5 mil km de Moscou. Uma Ucrânia adversária, contudo, diminui a distância para pouco mais de 600 kmGetty Images

Percebendo o interesse da Ucrânia em integrar a Otan, que é liderada pelos Estados Unidos, e fazer parte da União Europeia, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, ameaçou atacar o país, caso os ucranianos não desistissem da ideiaAndre Borges/Esp. Metrópoles

Uma das exigências de Putin, portanto, é que o Ocidente garanta que a Ucrânia não se junte à organização liderada pelos Estados Unidos. Para os russos, a presença e o apoio da Otan aos ucranianos constituem ameaças à segurança do paísPoca/Getty Images

A Rússia iniciou um treinamento militar junto à aliada Belarus, que faz fronteira com a Ucrânia, e invadiu o território ucraniano em 24 de fevereiroKutay Tanir/Getty Images

Por outro lado, a Otan, composta por 30 países, reforçou a presença no Leste Europeu e colocou instalações militares em alerta OTAN/Divulgação

Apesar de ter ganhado os holofotes nas últimas semanas, o novo capítulo do impasse entre as duas nações foi reiniciado no fim de 2021, quando Putin posicionou 100 mil militares na fronteira com a Ucrânia. Os dois países, que no passado fizeram parte da União Soviética, têm velha disputa por territórioAFP

Além disso, para o governo ucraniano, o conflito é uma espécie de continuação da invasão russa à península da Crimeia, que ocorreu em 2014 e causou mais de 10 mil mortes. Na época, Moscou aproveitou uma crise política no país vizinho e a forte presença de russos na região para incorporá-la a seu territórioElena Aleksandrovna Ermakova/ Getty Images

Desde então, os ucranianos acusam os russos de usar táticas de guerra híbrida para desestabilizar constantemente o país e financiar grupos separatistas que atentam contra a soberania do EstadoWill & Deni McIntyre/ Getty Images

O conflito, iniciado em 24 de fevereiro, já impacta economicamente o mundo inteiro. Na Europa Ocidental, por exemplo, países temem a interrupção do fornecimento de gás natural, que é fundamental para vários delesVostok/ Getty Images

Embora o Brasil não tenha laços econômicos tão relevantes com as duas nações, pode ser afetado pela provável disparada no preço do petróleo Vinícius Schmidt/Metrópoles
Já o Centro de Liberdades Civis da Ucrânia surgiu em Kiev, em 2007. Em seu estatuto, o grupo se define como defensor de “uma posição para fortalecer a sociedade civil ucraniana e pressionar as autoridades para tornar a Ucrânia uma democracia de pleno direito”. E o trabalho aumentou e se aprofundou desde a invasão russa, em fevereiro.
Os integrantes da organização agora se empenham em identificar e documentar os crimes de guerra sofridos pela população ucraniana. A Academia do Nobel afirmou que a decisão pela homenagem visa reconhecer “três destacados campeões de direitos humanos, democracia e coexistência pacífica nos países vizinhos Bielorrússia, Rússia e Ucrânia”.