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Jukebox Sentimental: disco de estreia do Sex Pistols completa 40 anos

“Never Mind the Bollocks” mexeu com as bases do rock ao difundir anarquia adolescente e gritos raivosos contra o status quo

atualizado

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Sex-Pistols
1 de 1 Sex-Pistols - Foto: Divulgação

Foi outro dia, mas quase ninguém se deu conta de que uma das pedras fundamentais do rock completou 40 anos. E que petardo! Obra marco do movimento punk, “Never Mind the Bollocks, Here’s the Sex Pistols”, lançada exatamente no dia 28 de outubro de 1977, até hoje, passadas quatro décadas de sua existência, ainda continua sólida como um símbolo incontestável da rebeldia, iconoclastia e, claro, da anarquia adolescente.

“Eu sou um anticristo / eu sou um anarquista / não sei o que eu quero / mas sei como conseguir / eu quero destruir transeuntes/ porque eu quero ser a anarquia”, gritava John Rotten, o famigerado Joãozinho “Podre”, em “Anarchy In The U.K.”, naquela que era a canção ícone da banda que adorava posar, Ettore Scola que o diga, de sujos, feios e malvados.

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O grupo, “inventado” pelo excêntrico empresário Malcolm McLaren, só durou 26 meses, ou seja, pouco mais de dois anos. Lançou apenas um álbum de estúdio, “Never Mind”, um clássico instantâneo por natureza, mas que mudaria, para sempre, a cara da música.

No Brasil, mais precisamente aqui em Brasília, uma certa turma da Colina, então liderada pelo jovem Renato Manfredini, tomou como ensinamento as palavras de protesto, frustração e indignação cuspidas, literalmente, pelo Sex Pistols, para dar origem a uma das facetas da explosão do rock nacional.

“Do you like Sex Pistols?”, foi a primeira coisa que Renato Russo se lembrou de gritar ao deparar com o grandalhão André Pretorius, filho do então embaixador da África do Sul no Brasil, que viria a ser um dos integrantes da seminal banda brasiliense Aborto Elétrico, talvez a gênese do punk rock no Brasil.

Para o futuro líder da Legião Urbana, Pretorius, falecido precocemente aos 27 anos, em 1978, era a versão loira do “junkie” Sid Vicious, o baixista autodestruitivo do Sex Pistols (veja o filme “Sid and Nancy”, de 1989), que entrou no lugar de Glen Matlock. O detalhe deste encontro você pode conferir no livro “Renato Russo – O Filho da Revolução”, do jornalista e escritor Carlos Marcelo.

“No future for you…”
Instado a 50ª colocação da lista dos 500 melhores álbuns de todos os tempos da revista “Rolling Stone”, “Never Mind the Bollocks, Here’s the Sex Pistols” sintetizava a fúria dos ataques do quarteto à tradição e à autoridade da monarquia de uma Inglaterra soterrada, na época, por crise econômica, política e social. O filósofo árabe Averróis (1126 – 1198) tinha razão quando observou: “somos mais parecidos com nosso tempo do que com nossos próprios pais.”

Assim, naquele final dos anos 70, a barra estava pesada, com desemprego em massa fazendo com que homens e mulheres tropeçassem em ratos mortos empilhados pelas ruas, por causa de uma greve dos lixeiros que assolava um Londres soterrada por manifestações por toda parte. O sistema vigente estava falido.

“No future for you”, alardeava Johnny Rotten na niilista “God Save The Queen”. “Quando não há futuro, como pode haver pecado? / nós somos as flores na lixeira / nós somos o veneno em sua máquina humana…”, radicalizava.

A essência do movimento punk, encabeçado pelos Pistols, surge deste contexto nada auspicioso. Era um grito de desespero, de angústia contra a falta de perspectiva. Um posicionamento firme e contestador contra o sistema vigente. “Os jovens perceberam que para eles não havia futuro e por isso se revoltaram. É possível ver a música, as letras de grande rebeldia e a natureza antiautoritária de suas atitudes como um reflexo destas condições”, escreve o estudioso musical Paul Friedlander em “Rock and Roll – Uma História Social”.

Em “Bodies”, Johnny Rotten, com sua famigerada boca suja, dava o direito de a mulher escolher em trazer uma criança indesejada ao mundo. “Se não fosse pela graça de Deus, minha mãe poderia ter tido um aborto e eu não estaria aqui”, disse a revista Rolling Stone, em outubro deste ano.

“Liar” era um ataque frontal ao “mentiroso” empresário Malcolm McLaren, mas também a todos aqueles que tentaram envenenar a banda no voraz mundo do entretenimento. Esse discurso seria retomado na raivosa “E.M.I.”. “Sub-Mission”, com seus riffs marcantes, era para ter sido uma canção sobre a escravidão e submissão no mundo, mas virou o mais perto do que a banda escreveu sobre o amor, falando sobre servidão do coração quando se está apaixonado. “Estou em uma missão submarina por você, baby / eu percebi o caminho que você estava indo”, canta Rotten.

Como se vê, os brutos também amam…

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