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“Calibre 22” mostra um Rubem Fonseca incansável

O novo livro do autor reúne contos e faz referência metalinguística a sua própria obra

atualizado

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Nova Fronteira/Divulgação
Rubem Fonseca
1 de 1 Rubem Fonseca - Foto: Nova Fronteira/Divulgação

Alguns críticos amargos disseram que “Calibre 22” (Editora Nova Fronteira) é uma obra de clássicos requentados daquele que seja, talvez, um dos maiores escritores brasileiros vivos: Rubem Fonseca. Num país em que a política repete erros e escândalos há séculos, ter um autor dessa relevância praticando um leve e saboroso exercício de metalinguagem de sua literatura é um luxo.

Aos 91 anos, Rubem Fonseca parece incansável. Ao todo, “Calibre 22” reúne 29 histórias inéditas sobre violência, falta de escrúpulos humano e indecência moral. Ingredientes mais atuais, impossível. São contos urbanos adornados por narrativa ágil, humor afiado e ironia atemporal. Um deleite para amantes de Rubem Fonseca.

“Calibre 22” serve, também, de estímulo para novatos embarcarem em histórias policiais do autor, como “Lúcia McCartney” (1969), e nos romances “O Caso Morel” (1973), “A Grande Arte” (1983), “Bufo & Spallanzani” (1986) e “Agosto” (1990) — que ganhou uma adaptação televisiva no mesmo ano.

No livro, o autor parece se embrenhar numa cruzada solitária e necessária a favor dos “fracos e oprimidos”, tecendo narrativas curtas e precisas acerca de assuntos de nossa sociedade doente. Em “Homem Não Pode Bater em Mulher”, por exemplo, o escritor emociona com a história do morador de um prédio incomodado com as manchas roxas no corpo da vizinha.

O bullying nas escolas e a homofobia vem à tona com a premissa de um enredo de Charles Dickens moderno, quando um justiceiro suburbano defende colega gay na escola. “Dei uma navalhada na roupa dos dois parrudos. Eles ficaram imóveis, encagaçados. Esses caras que gostam de sacanear veados, hostilizar magrelos etc. são todos covardes”, reflete em “Colégio”.

Sofisticado, Rubem Fonseca faz uso de suspense elegante para misturar no conto “Gastronomia” crime intrincado e prazeres frugais da vida. A trama, aliás, apresenta um dos raros momentos em que o autor foge da esquizofrenia dos centros urbanos para explorar o lado soturno da paisagem bucólica.

Autorreferência
Ex-comissário de polícia que virou executivo da Light e cineasta frustrado, o mineiro de Juiz de Fora (MG) faz do Rio de Janeiro playground de sua ficção policial. Na atual obra, Rubem Fonseca apresenta elementos simbólicos que divertem o leitor. Um deles é preencher sua narrativa com referências deliciosas à sua obra. Trata-se de uma brincadeira que só o mais fiel dos seguidores do autor vai alcançar.

Assim, entre um conto e outro, a gente se depara com as obsessões que habitam o universo de Fonseca, como anões pervertidos, uma enxurrada de sapos, prostitutas, ninfomaníacos, vinhos e charutos. Personagens marcantes de outros livros são lembrados de forma sutil. Basta observar as entrelinhas dos crimes e se esbaldar.

Outro atrativo empolgante de “Calibre 22” é a volta do mítico personagem Mandrake, o advogado criminalista e detetive com jeitão noir criado por Fonseca em 1969, desde que foi chamado para desvendar o “Sequestro de F. A.”, num dos contos de “Lúcia McCartney”.

Repetições em obras literárias podem ser maçantes e desestimulantes, não no caso de Rubem Fonseca, cujo “mais do mesmo” de sua literatura nos últimos anos têm sido cada vez mais empolgante. “Toda a literatura e tudo o que se escrevia era sempre a mesma merda”, reflete o escritor do conto “Camisola e Pijama”.

Gui Prímola/Metrópoles

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