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Diretora de O Processo: “Impeachment foi um circo de horrores”

Maria Augusta Ramos, cineasta brasiliense, inova ao não realizar entrevistas no documentário sobre deposição de Dilma Rousseff

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
Impeachment Dilma Rousseff – Brasília – DF 12/05/2016
1 de 1 Impeachment Dilma Rousseff – Brasília – DF 12/05/2016 - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

A diretora Maria Augusta Ramos tem um procedimento muito claro em relação à forma de fazer seus filmes: ao realizar documentários, ela não faz uma entrevista sequer. “Me instiga as relações humanas, a interação dos personagens com o meio em que vivem. Quero documentar acontecimentos, não pensamentos”, comenta. Autora de filmes como Justiça (2004) e Juízo (2007), ela se interessa pelo funcionamento do judiciário brasileiro.

Não à toa, Maria Augusta dirigiu O Processo, longa-metragem sobre o desenrolar do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Mais especificamente, a cineasta acompanhou de perto as conversas da defesa e da acusação da petista: o documentário traz o espectador para bem perto de figuras carimbadas desse fato histórico, como a senadora Gleisi Hoffmann (PT-RS) e a advogada Janaína Paschoal.

Metrópoles bateu um papo com a diretora brasiliense, que atualmente vive no Rio de Janeiro. Confira:

Qual movimento do jogo político te motivou a fazer o filme?
Eu senti uma necessidade de entender esse processo, de ver como se daria o rito do impeachment, do processo jurídico-politico, do desenrolar no Senado. Fui a Brasília uma semana antes da votação na Câmara dos Deputados, tinha para mim que a denúncia não passaria. Quando isso aconteceu, vi a inevitabilidade de realizar o registro do momento histórico.

Ana Paula Amorim/Divulgação
Maria Augusta Ramos: cineasta por trás de O Processo

 

Por que você não faz entrevistas?
As relações humanas me instigam. Eu lido com o meio em que os personagens dos meus filmes vivem. As interações do cotidiano revelam muito da nossa sociedade. Me interessa documentar acontecimentos, não pensamentos. Nada contra as entrevistas, mas não é meu estilo.

Como foram os bastidores da filmagem? Houve alguma tratativa com a defesa ou com a acusação de Dilma?
Me apresentei, expliquei o tipo de cinema documental que realizo. A defesa e os assessores jurídicos da Dilma conheciam meus filmes. Isso me garantiu rapidamente acesso. Não tive a mesma sorte e compreensão do lado da acusação. Porém, tinha autorização para filmar dentro do Senado e consegui captar momentos de maior intimidade.

É perceptível seu olhar sobre as mulheres envolvidas no processo. Foi uma escolha consciente?
Tanto na defesa quanto na acusação, tínhamos mulheres muito fortes e guerreiras, como Gleisi Hoffman, Vanessa Grazziotin e Fátima Bezerra. Havia outras senadoras que não fizeram parte do documentário porque eu não tinha tempo para filmar todas e rodar um filme de 137 minutos. Na acusação, temos Janaína Paschoal, Simone Tebet, entre outras. A participação feminina nesse impeachment, nos dois lados, foi importante. Não quis priorizá-las: essa participação existia, era presente, até porque a própria presidente Dilma é uma mulher forte.

Algum fato te chocou mais?
Foram muitos momentos comoventes, surpreendentes. O processo todo foi muito triste, doloroso, complexo. Era muito complicado destrinchar aquele “juridiquês”, entender as acusações das pedaladas e decretos, a distorção da grande mídia. Talvez o pior tenha sido mesmo a votação na Câmara dos Deputados. Aquilo realmente foi um circo de horrores. Viver um momento como esse foi terrível, o país dividido, aquele muro no meio da Esplanada dos Ministérios. Eu nasci e cresci em Brasília, nunca tinha visto aquilo.

Como você roteirizou o documentário?
Eu não tinha ideia do que aconteceria. Tudo era de repente. Nem nas comissões as coisas aconteciam dentro do planejado, tinham debates calorosos. Tive que filmar bastante, as reuniões demoravam 10, 12 horas para acabar. Foi necessário registrar tudo e depois selecionar os elementos do filme. O roteiro veio depois da captação do material.

Por que você decidiu finalizar o filme com a prisão de Lula? O processo se concluiu aí?
O filme estava completamente pronto e eu estava finalizando a versão brasileira, com as cartelas em português. Quando aconteceu a prisão do presidente Lula, achei que seria importante inserir no documentário esse fato essencial.

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