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Alceu Valença resgata lembranças de infância em “A Luneta do Tempo”

Em entrevista ao Metrópoles, o músico e compositor pernambucano fala de sua carreira de diretor e de como o mito do cangaço marcou sua vida

atualizado

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Alceu Valença
1 de 1 Alceu Valença - Foto: null

Aos 69 anos, Alceu Valença parece incansável, não para. Metamorfose ambulante em eterna ebulição, ele segue a vida num ritmo alucinante, em meio a uma lotada agenda — desmembrada em shows país afora, compromissos sociais, entrevistas e, no momento, a divulgação de seu primeiro longa-metragem, “A Luneta do Tempo”.

O grande ídolo da música brasileira agora é também cineasta. Desde a semana passada em cartaz no Cine Brasília, o filme de Alceu é uma releitura bem pessoal do mito de Lampião e Maria Bonita e de fragmentos da cultura nordestina. Uma espécie de musical barroco narrado em estilo cordel, o projeto levou 14 anos para ficar pronto e vem dividindo opiniões.

Há quem diga que o trabalho é uma invenção da narrativa marcada por momentos de ousadia e criatividade. Pode até ser, e a referência aqui ecoa no cinema visceral do baiano Glauber Rocha – o que ele discorda terminantemente. Mas há também aquela pegada popular do universo de Ariano Suassuna. Já outros não escondem a expectativa frustrada ao deixar a sala de cinema.

Divulgação
Alceu dirige Hermila Guedes e Irandhir Santos, que interpretam Maria Bonita e Lampião

 

Ensaio filosófico
Para Alceu Valença, que dirigiu, roteirizou, montou e fez a trilha sonora do filme, “A Luneta do Tempo” é um ensaio filosófico sobre um mito a partir de reminiscências afetivas de sua infância na pequena São Bento de Una (PE).

As histórias do cangaço e de seu maior ícone rondam o imaginário do artista desde que ele era garotinho. A relação com o tema é mais direta quando ele conta que o pai, então estudante de direito em Recife, foi um dos homens que enterraram os cangaceiros em Angico (PE) junto com os amigos. Tinha inclusive guardado em casa um chapéu do bando.

“Eles receberam a notícia pelo telégrafo de que Lampião havia morrido. Alugaram uma caminhonete e foram pra lá. Ao chegar, viram que todos estavam decapitados e deram sepultura aos mortos”, lembra, em entrevista por telefone, de seu apartamento no Leblon, no Rio de Janeiro.

A arte é feita de lembranças. O filme tem toda essa coisa do mito e o tema do cangaço era muito recorrente quando eu era menino, existiam muitas lendas e eu ouvi essas histórias a vida toda

Alceu Valença, músico e cineasta

Surtos criativos
Na trama, que não tem nada de literal, Lampião (Irandhir Santos) vê o futuro por meio de uma luneta mágica que ele roubou de Satanás. É um sujeito brabo, mas também romântico, dado a concessões sem limite. Junto com Maria Bonita (Hermila Guedes) e seu bando de cangaceiros valentes, corre o sertão enfrentando a polícia por uma trilha sinuosa marcada por ódio, vingança e amor.

“Meu filme é uma coisa poética, livre. E ao mesmo tempo procura ser realista, por incrível que pareça”, explica o artista. Alceu já havia se envolvido com o cinema em 1974, quando interpretou o personagem-título no longa “A Noite do Espantalho”, de Sérgio Ricardo. Em “A Luneta do Tempo” , ele faz uma ponta como o palhaço Quiabo.

Dono de uma carreira sólida, Alceu Valença conta que a transição do músico e compositor para o cineasta deu-se sem traumas. “Sou um cara que muda muito. Nunca tive uma banda fixa, por exemplo. Vivo, como minha mulher fala, de surtos criativos”, brinca. “Ao mesmo tempo escrevo músicas, roteiros, livros de poesias e crônicas”, emenda.

Divulgação
O músico-cineasta faz uma ponta no filme, no papel do palhaço Quiabo

 

Exercício de arquitetura narrativa
Catártico, irreverente e divertido, o artista contou como trabalhou a trilha sonora do filme com a preocupação de exaltar o Nordeste profundo, o sertão, e desenvolveu o roteiro em forma de cordel — segundo ele, um exercício de arquitetura narrativa.

“Meu avô, Orestes Valença, era cordelista. Esse processo foi acontecendo naturalmente, a princípio escrevia as falas e depois fui rimando os diálogos, de uma forma que não ficasse chato para o espectador. Você vê que está rimado, mas nem parece”, detalha.

A parte musical não tem nada de pesquisa, tudo estava na minha cabeça, tenho vários lados, enfim, o lado metropolitano, recifense, e o lado sertanejo, agrestino, que está todo no filme

Com uma agenda lotada de shows, o artista, que estará em Brasília em 23 de julho, para uma apresentação acústica no Centro de Convenções Ulisses Guimarães, não pensa em parar de filmar. Mas agora pretende dar um tempo na nova carreira. “O cineasta foi dormir, se ele sonhar, pode ser que faça outros filmes, agora o músico acordou”, ri.

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