Há 20 anos trabalhando como cabeleireiro no Paranoá, Sebastião Dias, 46 anos, tomou um susto quando recebeu uma notificação extrajudicial, nada mais, nada menos, do que da Ferrari, a fabricante italiana de carros esportivos de luxo. A atenção inesperada da gigantesca marca virou a vida do microempreendedor do Distrito Federal de cabeça para baixo.
O documento de 16 páginas enviado por e-mail requisitava a mudança de nome do salão de beleza do qual Sebastião é proprietário. O estabelecimento se chamava Ferrari Cabeleireiros Unissex. O nome empresarial registrado no site da Receita Federal é Ferrari Cabeleireiros e Esmalteria Eireli.
A notificação, escrita pelo escritório de advocacia Ariboni, Fabbri & Schimidt, que representa a multinacional no Brasil, pediu a troca da marca no comércio, bem como dos nomes empresarial e fantasia, inclusive em materiais de propaganda e páginas da internet.
O texto pediu ainda que o pequeno comerciante do DF providenciasse “o ressarcimento da notificante [a Ferrari] pelos danos morais no valor de R$ 50.000,00 e danos morais a serem calculados, bem como honorários advocatícios, pelo uso indevido da marca em tela, fixados apenas para fim de resolução amigável no valor de R$ 10.000,00”.
O documento é assinado pelos representantes Maurício Ariboni e Tabatha Alves. Os advogados afirmaram que o uso do nome Ferrari por parte do cabeleireiro representa “inegável má-fé” do microempreendedor.
Veja as mudanças feitas no salão de beleza do Paranoá após manifestação de Ferrari:

Logo antiga do salão de belezaReprodução/Facebook

Sebastião tocou nome às pressasReprodução/Facebook

Sebastiao foi obrigado a enviar fotos de dentro do estabelecimento para advogados da multinacionalMaterial cedido ao Metrópoles
“A gente não quis usar de má-fé o nome deles; nunca nem passou pela minha cabeça me aproveitar”, defendeu-se Sebastião. Após a notificação, o microempresário correu para se adequar às solicitações da gigante da indústria automobilística. Na impossibilidade financeira de trocar a fachada da loja, o homem colocou uma faixa para avisar aos passantes que o nome seria trocado (foto em destaque).
“Atenção! Em breve mudança na fachada c/ nova logo. Stúdio Sebastian”, liam os moradores que passavam pela Quadra 23 do Paranoá. A assinatura da faixa foi o nome escolhido por Sebastião. “A gente ficou tão desesperado que não sabia o que fazer. Pelo fato de eu ser conhecido na cidade e nas redes sociais como Sebastian, coloquei esse nome”, narrou.
Após fazer nova logo, mudar a fachada e o nome da loja no Google e Instagram, Sebastião achou que o problema estava resolvido, mas, para seu desgosto, recebeu uma segunda notificação dos advogados da Ferrari. “Esqueci de tirar [a logo antiga] da minha página do Facebook. Quando foi sexta-feira, mandaram para advogada que precisava trocar no prazo de 72 horas que, inclusive, venceu hoje [segunda-feira]”, lembrou o brasiliense.
A receita da montadora italiana entre janeiro e março de 2022 chegou a 1,18 bilhão de euros em 2022, segundo o jornal Valor Econômico. Apesar do porte gigantesco, os advogados afirmaram que “o consumidor, ao deparar-se com suas redes sociais, produtos e material publicitário, será induzido ao erro e pensará tratar-se de empresa licenciada, autorizada, franqueada ou credenciada da notificante”.
“Foi uma atitude desnecessária. Quando comprei esse salão, já existia esse nome e mantive porque todo mundo já conhecia. Achei desnecessário por ser uma empresa tão pequena. Sou um empresário pequeno, um pingo d’água no meio do mar para eles”, protestou o comerciante do DF.
Sebastião afirma que a abordagem da multinacional o deixou constrangido e humilhado. “Mexeu com o meu emocional, com a minha estrutura. Inicialmente, não estava dormindo direito e fiquei com crise de ansiedade. Foi uma das coisas mais constrangedoras que passei na minha vida. Eu poderia ser preso por ser um trabalhador”, lamentou o cabeleireiro.
A reportagem ligou para a empresa de advocacia Ariboni, Fabbri & Schimidt e entrou em contato por e-mail para dar oportunidade aos representantes da Ferrari para comentarem o caso, mas não houve resposta. O espaço segue aberto para manifestações futuras.
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