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Corregedoria da PMDF ouve soldado vítima de homofobia: “Alívio e medo”

Policial militar afirmou que a conversa transcorreu de “maneira tranquila”. Esta é a primeira vez que ele é ouvido na condição de vítima

atualizado

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Redes Sociais/Reprodução
Casais comemoram formatura na PMDF
1 de 1 Casais comemoram formatura na PMDF - Foto: Redes Sociais/Reprodução

A Corregedoria-Geral da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) ouviu, nesta quinta-feira (20/8), o depoimento do soldado Henrique Harrison, 28 anos, sobre os ataques homofóbicos que sofreu de colegas de farda e oficiais após publicar foto em que aparece beijando o namorado durante sua formatura.

Ao Metrópoles, o policial militar afirmou que a conversa transcorreu de “maneira tranquila”. “Me perguntaram sobre os fatos e contei tudo novamente. Demonstraram bastante imparcialidade durante as perguntas, sem qualquer preconceito ou discriminação. Agora é acompanhar esse IPM [inquérito policial militar].”

Harrison afirma que, após o depoimento, se sentiu “aliviado”. “Saindo de lá, eu senti um pouco de alívio, pensando que, realmente, pode ser que haja justiça. Mas volto a sentir um pouco de medo, porque toda vez que o caso é lembrado, muitos policiais relembram o tanto que não gostam de mim por conta da minha orientação sexual.”

Henrique foi ouvido pela primeira vez na condição de vítima. Antes, a Corregedoria havia colhido o depoimento do soldado, na qualidade de informante, após a Câmara Legislativa do DF (CLDF) cobrar explicações do Comando-Geral da PMDF.

“Eu sentia que esse IPM estava engatinhando, mesmo tendo se passado 7 meses [do ocorrido]. Eu, às vezes, penso que eles querem mesmo aliviar a onda de tudo que passou”, desabafou o soldado.

Medo e preconceito

Harrison relembrou as dificuldades que passou após sofrer preconceito dentro da instituição. O soldado narra que os dias que sucederam os ataques foram carregados de incertezas e medo.

“Fiquei com muito medo, até recebi ameaça de morte em um dos áudios. Sentimento na época foi de muita insegurança. Não sabia onde eu ia trabalhar, com quem eu ia trabalhar”, conta.

O policial militar chegou a temer retaliações internas após a repercussão do caso. “Fui vítima de piadas, fiquei com muito medo. Tive que sair de todos os grupos de WhatsApp que fazia parte.”

Com o avanço do caso, o medo de Harrison logo deu lugar à necessidade de combater um mal ainda comum entre as forças de segurança: o preconceito.

“Vi que era uma causa que tinha que abraçar. Todo e qualquer tipo de carinho e afeto é permitido em nossa formatura. Muitos gays me procuraram após o episódio. São policiais que não postam foto com marido, com esposa, que não levam ninguém nas reuniões. Justamente pelo medo do preconceito”, diz o soldado.

De acordo com o militar, a realidade da corporação ainda é opressora e homofóbica. “É algo que está mudando, a cultura está mudando. Claro que não dá para generalizar. Mas, para mim, não basta ser igual aos outros: preciso me preocupar muito mais com as coisas que faço ou deixo de fazer, tudo para evitar condutas discriminatórias dos outros”, pontua.

Diante do medo e das dúvidas, Henrique recebeu importante apoio do comando do 1º Batalhão de Polícia Militar do DF, na Asa Sul, onde está lotado. “Preciso ressaltar que o major Kotama [comandante da unidade] sempre foi muito correto comigo. Me chamou para conversar e disse que poderia contar com ele. Sou muito grato a ele por isso.”

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O caso

O que era para ser um gesto de carinho entre casais, registrado em foto durante a formatura de praças, ganhou as redes sociais em janeiro deste ano e foi alvo de comentários maldosos e críticas por parte de outros policiais e do deputado distrital Hermeto (MDB).

Um áudio atribuído a um coronel da corporação escancara críticas aos policiais que beijaram os companheiros do mesmo sexo trajando as fardas da corporação. “A porção terminal do intestino é deles e eles fazem o que quiserem”, ofendeu o militar.

Em um grupo de WhatsApp, Hermeto enviou outras críticas: “Minha corporação está se acabando. Meu Deus!!! São formandos de hoje. Na minha época, era expulso por pederastia”.

O parlamentar também disse, em outro grupo, que respeita a “preferência” de cada um, mas não concorda que policial fardado tenha esse comportamento.

Investigação

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) abriu uma investigação para apurar as declarações, consideradas homofóbicas, por meio do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação. Foi instaurado procedimento para apurar e adotar as medidas cabíveis.

O depoimento de Henrique Harrison é um dos desdobramentos das apurações conduzidas pelo MPDFT e pela Corregedoria-Geral da PMDF.

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