metropoles.com

Imposto alto favorece o mercado ilegal

“Aumento de carga tributária em setores mais sensíveis, que já são dominados pela ilegalidade, é algo impensável”, diz presidente do FNCP

Foto: Getty Images
dinheiro calculadora
1 de 1 dinheiro calculadora - Foto: Foto: Getty Images

atualizado

Aprovada no início de julho pelo Plenário da Câmara dos Deputados, a Reforma Tributária é um assunto que segue movimentando os campos político e econômico do país. Em meio a um debate tão importante para todos os brasileiros, conhecer um pouco mais sobre os impactos das taxações nos diferentes setores produtivos é essencial.

A Reforma prevê, por exemplo, a criação de um Imposto Seletivo (IS) sobre a produção, comercialização ou importação de alguns produtos. Tem sido apresentada a inserção nesta lista: agrotóxicos, cigarros e bebidas alcoólicas, que já arcam com impostos elevados. O novo imposto, no entanto, será definido posteriormente por meio de lei complementar.

Especialistas veem com preocupação qualquer possibilidade de aumento de imposto, que pode afetar a competitividade das empresas e não alcançar os resultados esperados pelo governo, como o crescimento da arrecadação e a diminuição do consumo.

Presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), Edson Vismona chama a atenção para o efeito negativo que essa decisão irá causar em determinados segmentos. “A verdade é uma só: qualquer aumento de tributo que incida sobre os produtos fabricados legalmente no país ou importados legalmente favorece o contrabando”, aponta. “Qualquer aumento da carga tributária significará o aumento da competitividade do produto ilegal, em desfavor ao produto legal feito e comercializado no Brasil, que atrai investimentos e gera empregos.”

O alerta se faz necessário, já que, segundo dados do FNCP, em 2022, o Brasil teve um prejuízo de R$ 410 bilhões com a ilegalidade, sendo que a estimativa dos impostos que deixaram de ser arrecadados foi de R$ 129,2 bilhões.

Vismona relembra que recentemente o país já enfrentou um cenário similar e o reflexo foi extremamente danoso. “Em 2012, quando houve um aumento de impostos incidente sobre o cigarro fabricado legalmente no Brasil, houve um impacto imediato. Passamos de 30% para 57% da participação do mercado do contrabando no Brasil. Ainda hoje, quase metade do mercado brasileiro é dominado pela ilegalidade”, afirma.

“Ao oferecer um produto no mercado a um preço muito mais baixo porque não se paga nada de imposto, o contrabandista atrai quem busca a oferta mais barata. Aumentou tributo, se aumenta ainda mais a participação do ilegal.””

Edson Vismona, presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP)

Arrecadação

Uma pesquisa dos economistas Pery Shikida, Mário Margarido e Daniel Komesu mostra que o aumento do imposto não faz a arrecadação aumentar.

Ao contrário, a exemplo do que ocorreu com o cigarro, quando aumentou o imposto, houve queda de arrecadação. E pior, o aumento do mercado ilegal.

A explicação é que houve uma migração do cigarro legal (que ficou mais caro) para a alternativa mais barata, o cigarro contrabandeado (mais barato, pois não paga imposto).

“…A partir de 2012 o governo adotou uma política tributária que levou ao aumento de preços do cigarro nacional. Foi aí que o cenário mudou… As condições econômicas são dinâmicas e os dados relativos ao market share no mercado de cigarros mostram que, de 2014 a 2022, a participação de mercado do cigarro ilícito apresenta um mínimo de 40%, chegando ao seu valor máximo de 57% em 2019…”.

O estudo conduzido aborda também o impacto que a crise sanitária da Covid-19 teve sobre esse mercado e respectivos movimentos de consumo.

“…Instabilidades institucionais internas e fatores exógenos, como a crise da Covid- 19 e a invasão russa na Ucrânia, foram determinantes para a contração da renda, contribuindo para o consumidor, migrar para o mercado de cigarros ilícitos…”.

Participação do mercado ilegal

Arte: FNCP

 

Fonte: Pesquisa Impactos do Mercado Ilegal de Cigarros no Brasil, do Ipec Inteligência, de 2022.

A pesquisa ainda revela a relação existente entre o aumento dos preços dos cigarros e a queda da arrecadação tributária.

“…Outro destaque é a perda de arrecadação tributária do cigarro lícito, que caiu em média 1,39% ao ano, paralelamente ao aumento da participação do cigarro ilegal no mercado, que elevou em média 8,78% a.a., enquanto a produção de cigarros lícitos apresentou uma queda média de 6,07% a.a. (2009 a 2019)…”.

O avanço do mercado ilegal no Brasil

Ao acompanhar a evolução do contrabando no país, principalmente na última década, é possível perceber que a estratégia de aumentar impostos vem contribuindo para manter a margem de lucro do mercado ilegal de cigarros alta e sustentando uma fonte de receita do crime organizado e milícias.

De acordo com dados do FNCP, nos últimos oito anos, os prejuízos causados pelo mercado ilegal quadruplicaram, passando de R$ 100 bilhões (2014) para R$ 410 bilhões (2022).

O setor de vestuário é o mais impactado, em volume, com perdas de R$ 84 bilhões – um aumento de 40% em relação a 2021 (R$ 60 bilhões). Outros segmentos que aparecem no topo da lista são bebidas alcoólicas (R$ 72,2 bilhões), combustíveis (R$ 29 bilhões), cosméticos e higiene pessoal (R$ 21 bilhões), defensivos agrícolas (R$ 20,8 bilhões), TV por assinatura (R$ 12,1 bilhões) e cigarros (R$ 10,5 bilhões).

“As perdas não são apenas econômicas, são de competitividade da indústria e comércio nacionais, uma vez que, ao não pagar impostos, o ilegal fica mais barato, provocando uma concorrência desleal e corrosiva que prejudica a geração de empregos formais e renda para o brasileiro”, explica Vismona.

“Além disso, esses prejuízos afetam diretamente a população mais vulnerável do país, inviabilizando a criação de novos postos de trabalho pelas empresas e o investimento em áreas prioritárias, como educação e habitação, por parte dos governos”, completa.

No exemplo do cigarro, um dos motivadores para o avanço do contrabando no país é a vantagem econômica que a atividade criminosa traz, causada em primeiro lugar pela alta disparidade tributária em relação ao Paraguai, principal fornecedor de mercadorias contrabandeadas para o Brasil.

Para se fazer um comparativo, enquanto o produto fabricado legalmente em nosso país paga aproximadamente 71% em impostos federais e estaduais, no Paraguai esse índice é de apenas 13% sobre o consumo.

“A cada novo aumento na taxação sobre o cigarro, o similar contrabandeado do Paraguai fica mais competitivo e rentável para as organizações criminosas e milícias. Esses grupos, com o lucro obtido com as vendas do cigarro contrabandeado, financiam as atividades de tráfico de drogas e armas, roubo de cargas e de automóveis”, ressalta Vismona.

Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade – FNCP

SiteFacebook

Todos os direitos reservados

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?