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O Brasil só tem amadores se comparados ao maior canalha da história

Eu ia escrever sobre a farsa da responsabilidade fiscal de Lula, mas mudei de ideia. Decidi escrever sobre o maior canalha da história

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Mohamad Salaheldin Abdelg Alsayed/Anadolu via Getty Images
chapéu de napoleão leiloado - metrópoles
1 de 1 chapéu de napoleão leiloado - metrópoles - Foto: Mohamad Salaheldin Abdelg Alsayed/Anadolu via Getty Images

Eu ia escrever sobre a farsa da responsabilidade fiscal do governo Lula, mas mudei de ideia. Se brasileiro gostasse de fazer conta, não teria colocado o petista no Palácio do Planalto outra vez, nem mesmo para “salvar a democracia”. Decidi dedicar este artigo ao maior canalha da história.

Ele não é quem você está pensando, sem querer desmerecer a falta de caráter de ninguém. Nós gostamos de repetir o clichê de Tom Jobim, segundo o qual o Brasil não é para amadores — e o fazemos cheios de orgulho do que deveria ser um defeito, o que revela muito da alma nacional —, mas a verdade é que o Brasil só tem pálidas imitações dos verdadeiros profissionais da canalhice.

Eu pensava que o maior canalha da história havia sido Charles-Maurice de Talleyrand Perigórd, vira-casaca que teve o cérebro jogado no esgoto, como conta Victor Hugo, mas fui apresentado a outro francês, contemporâneo seu, que o superou em indignidades.

O nome desse prodígio da canalhice é Joseph Fouché, que viveu de 1759 a 1820. Estou lendo deliciado o livro que o austríaco Stefan Zweig escreveu sobre ele. Stefan Zweig, que se suicidou em Petrópolis, juntamente com a mulher, encurralado pela perseguição nazista aos judeus. Stefan Zweig, que escreveu Brasil, País do Futuro, iludido de que isto aqui seria o farol da civilização. 

Ele descobriu Joseph Fouché por meio de Balzac, que se fascinou com esse político de mil faces, manipulador, capaz de mudar de posição como quem troca de camisa sem enrubescer de vergonha e que preferia operar nas sombras — e que nas sombras desapareceu, desprezado pela posteridade.

Aluno e professor da ordem dos oratorianos, oponentes dos jesuítas, Fouché não titubeou em aderir à Revolução Francesa e mandou pilhar e profanar igrejas quando isso lhe pareceu vantajoso. Revolucionário moderado, votou a favor da morte de Luís XVI na guilhotina, atraiçoando os seus companheiros, e promoveu um banho de sangue em Lyon, cidade que havia se revoltado contra o fim da monarquia. Quando o vento virou, conseguiu voltar a ser visto como um conciliador.

Sempre nos bastidores, Fouché usou de artimanhas para mandar o inimigo figadal Robespierre, o Incorruptível, para o cadafalso e, como ministro da Polícia, espionou e chantageou Paris inteira. Uma das suas espiãs era Josephine, que viria a se casar com Napoleão Bonaparte.

Ministro durante a Revolução, foi ministro também de Napoleão, que o temia, mas não podia abrir mão dos seus serviços. Autor do que, nas palavras de Stefan Zweig, seria o primeiro manifesto comunista, Fouché saiu da miséria extrema, ao cair no ostracismo, para uma vida de riqueza, traindo em seguida quem lhe proporcionou a ascensão material.

Fouché, que ajudou a cortar a cabeça de Luís XVI e exterminou monarquistas, se tornaria ministro também de Luís XVIII, depois do fim dos anos napoleônicos. “Ele só conhece um partido, ao qual permanecerá fiel até o final: o partido do mais forte, a maioria”, escreve Stefan Zweig, que o define deste modo:

“Tal é o segredo supremo da força de Joseph Fouché: ao mesmo tempo que quer a autoridade, e a autoridade mais alta, ele se contenta , contrariamente ao que faz a maioria dos homens, com a consciência de tê-la sem ter necessidade de exibir as suas marcas exteriores nem o seu uniforme. Fouché é ambicioso no mais alto grau, mas ele não procura a glória; ele tem ambição, mas não vaidade. 

Verdadeiro e autêntico jogador intelectual, ele ama os valores positivos do poder, mas não as suas insígnias. Os feixes dos litores, o cetro real, a coroa imperial podiam pertencer tranquilamente a outro, fosse um dominador ou um boneco de palha, pouco lhe importava; ele concede de bom grado o brilho e a felicidade duvidosos da popularidade. 

É-lhe suficiente estar a par das coisas, de ter influência sobre as pessoas, de liderar verdadeiramente o condutor aparente dos negócios do mundo, sem colocar à frente a sua pessoa, e jogando assim o mais apaixonante de todos os jogos, o jogo formidável da política.

Os Girondinos caem, Fouché fica; os Jacobinos são caçados, Fouché fica; o Diretório, o Consulado, o Império, a Realeza e outra vez o Império desaparecem e desabam, mas ele fica sempre em pé, só ele, Fouché, graças à sua reserva e à audácia que tem de ser absolutamente desprovido de caráter e de praticar a falta completa de convicções.”

Fouché é o maior canalha da história. Comparado a ele, os brasileiros são amadores na canalhice, o que não os torna menos repugnantes, é claro. Mas é preciso perder as ilusões sobre nós mesmos.

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