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A ruína causada pela PEC da reeleição é maior do que a de 8 de janeiro

Em 4 de junho de 1997 foi aprovada a PEC da reeleição, um desastre histórico que está na raiz dos nossos problemas, inclusive o 8 de janeiro

atualizado

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Jair Bolsonaro e Lula durante debate na TV Globo eleições 2022 - Metropoles
1 de 1 Jair Bolsonaro e Lula durante debate na TV Globo eleições 2022 - Metropoles - Foto: Reprodução/Tv Globo

A data mais funesta para o Brasil redemocratizado não é 8 de janeiro de 2023, como querem fazer crer. É 4 de junho de 1997. Naquele dia de 26 anos atrás, aprovou-se a emenda da reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos. 

A Constituição de 1988 havia descartado a reeleição para cargos no Executivo. Mais uma das nossas poucas decisões sábias que foram revogadas. Para permanecer no poder por mais um mandato, Fernando Henrique Cardoso comprou uma penca de parlamentares e fez aprovar a emenda constitucional que estabeleceu a estrovenga.

Fernando Henrique Cardoso sempre negou que tenha comprado a emenda da reeleição. Só faltava admitir. O ex-presidente diz que não comprou, nem precisava, porque a maioria da população e a maioria do Congresso temiam a vitória de Lula. 

No terreno das admissões prováveis, ele reconheceu, em 2021, em artigo publicado em dois jornais, um paulista e um carioca, que errou quadradamente no principal. Escreveu Fernando Henrique Cardoso, em versão condensada:

“Cabe a mim um ‘mea culpa’. Permiti, e por fim aceitei, o instituto da reeleição. Sabia e continuo pensando assim, que um mandato de quatro anos é pouco para ‘fazer algo’. Tinha em mente o que acontece nos Estados Unidos. Visto de hoje, entretanto, imaginar que os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição é ingenuidade.

Devo reconhecer que historicamente foi um erro: se quatro anos são insuficientes e seis parecem ser muito tempo, em vez de pedir que no quarto ano o eleitorado dê um voto de tipo ‘plebiscitário’, seria preferível termos um mandato de cinco anos e ponto final.”

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, quer consertar esse erro histórico e discutir o fim da reeleição. De acordo com ele, o assunto será prioridade em 2024: “O fim da reeleição é algo que é um desejo muito forte dos senadores, nós vamos fazer audiências públicas, debater isso”.

A substituição da possibilidade da reeleição por um mandato de cinco anos é um toma lá dá cá. Essa história de que 4 anos é pouco é balela. Em 4 anos, dá perfeitamente para um presidente, um governador e um prefeito arrombarem os respectivos cofres públicos. 

Paguemos esse preço, tudo bem. Cinco anos são menos desastrosos do que oito ou 16 anos — se um presidente reeleito conseguir eleger um poste, esse será o tempo que ele permanecerá continuamente no poder. Mas não deveríamos abrir mão de impedir que, uma vez presidente, o sujeito possa voltar a sê-lo, a qualquer tempo. O mesmo deveria valer para os demais cargos do Executivo.

Rodrigo Pacheco defende o fim da reeleição para “acabar com o estado eleitoral permanente”. Um jornalista já resumiu o que isto significa:

“A reeleição é o nascedouro dos nossos maiores problemas porque o governante eleito, não importa o sinal ideológico, passa a preocupar-se unicamente com ficar mais quatro anos no poder. Assim, deixa de tomar medidas antipáticas necessárias à nação e passa a trabalhar em regime de dedicação exclusiva para ser reeleito, principalmente a partir do segundo ano de governo. 

Torna-se candidato com mandato, avançando sobre o Orçamento como se fosse recurso de campanha. As aves de rapina do Congresso, obviamente, cobram um preço elevado por isso. Criam dificuldades para vender facilidades, na forma de obstruções sistemáticas em votações relevantes, CPIs e pedidos de impeachment. Depois de levar o seu quinhão de dinheiro público, aderem. O fisiologismo e o corolário dele, a corrupção, sempre existiram, mas o seu coágulo mortal, o Centrão, só cresceu a ponto de entupir as artéria da democracia graças à emenda que constitucionalizou a reeleição.”

Escrevi o trecho acima em 2019, antes de Fernando Henrique Cardosos arrepender-se. Está publicado no meu livro  Me Odeie Pelos Motivos Certos. Mas estou longe de ser original. Se reeleição fosse boa coisa para o país, Jair Bolsonaro e Lula não teriam mentido que jamais buscariam reeleger-se.

Espero que Rodrigo Pacheco consiga levar adiante o fim da reeleição (seria a partir de 2030). A ruína causada pela PEC da reeleição é bem maior do que a de 8 de janeiro e está na origem do quebra-quebra bolsonarista. O meu princípio de realidade indica, contudo, que o Centrão cobrará mais caro para não mudar nada. Por que mudar o que está dando certo para ele e errado para o Brasil?

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