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Por falta de aluguel, Ministério da Defesa ameaça despejar Instituto de Cardiologia

O Hospital das Forças Armadas, subordinado ao Ministério da Defesa, recomenda a rescisão do acordo que permite ao ICDF usar o prédio

atualizado

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EBC/DIvulgação
ICDF
1 de 1 ICDF - Foto: EBC/DIvulgação

O Instituto de Cardiologia do Distrito Federal (ICDF) corre o risco de ser despejado do anexo do Hospital das Forças Armadas (HFA). É que o HFA, subordinado ao Ministério da Defesa, recomendou a rescisão do acordo que permite o uso do prédio anexo ao HFA pelo ICDF, mediante pagamento de aluguel e prestação de serviços.

Desde 2005, o ICDF funciona no edifício com área total de 8,7 mil metros quadrados. Somente em 2019 o HFA começou a cobrar aluguel. Segundo o acordo, a realização de procedimentos hospitalares pelo ICDF em pacientes vinculados às Forças Armadas poderia abater no valor das cobranças.

Na semana passada, militares do HFA emitiram um relatório em que descrevem descumprimento do acordo por parte do ICDF. A comissão que analisou a parceria apurou que o Instituto de Cardiologia deve um total de R$ 9 milhões – R$ 7,8 milhões de aluguel e R$ 1,1 milhão referente ao consumo de água, energia e oxigênio, por exemplo – e não tem realizado procedimentos em pacientes encaminhados por hospitais militares. O valor é referente a junho de 2020 e maio de 2021.

O ICDF é uma instituição filantrópica sem fins lucrativos e atende a pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) encaminhados pela Secretaria de Saúde do DF para procedimentos de alta complexidade, incluindo cirurgia cardíaca pediátrica e transplantes de coração, rins e medula óssea. A unidade funciona no prédio erguido na área do HFA, com recursos da Câmara dos Deputados e do Senado.

Há dois anos, o hospital militar impôs a necessidade de o Instituto de Cardiologia pagar aluguel e atender a pacientes encaminhados pelas Forças Armadas, como militares e servidores da administração central do Ministério da Defesa, como contrapartida para permanecer no prédio vizinho ao HFA.

A comissão apontou que 455 procedimentos em pacientes vinculados ao Ministério da Defesa foram realizados entre maio de 2020 e maio de 2021. A quantidade representa 24,95% dos 1.824 procedimentos previstos como meta mínima. Segundo a análise dos militares, a população do DF tem sido a maior beneficiária da parceria, em detrimento dos pacientes das Forças Armadas.

“Isso demonstra a falta de atenção para com o público militar e do HFA, uma vez que, somente se houver equilíbrio financeiro nos contratos do ICDF, o atendimento será normalizado. Estes beneficiários não estão sendo atendidos por conta do desequilíbrio dos contratos que o ICDF possui”, diz trecho do relatório.

No fim do documento, a comissão conclui o seguinte: “Uma vez que o ICDF/FUC deixou de cumprir o previsto nos Incisos I e XIII da Cláusula I do Acordo de Cooperação 01MD/2019, não tendo atingido as metas mínimas de atendimento previstas no Apêndice V do Plano de Trabalho e encontrar-se em débito com o pagamento dos valores referentes aos meses de junho, junho, agosto e setembro do ano de 2020 e janeiro e abril do ano de 2021, devidos ao fornecimento de serviços pelo HFA, conforme previstos no item 9.1.2 do Plano de Trabalho do Acordo de Cooperação 01MD/2019, esta comissão recomenda que o acordo seja rescindido conforme com o previsto na alínea ‘b’ do Inciso II da Cláusula Décima Segunda – Da Denúncia e da Rescisão, do Acordo de Cooperação 01MD/2019”.

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O que dizem os citados

Em nota enviada à coluna, o Instituto de Cardiologia do Distrito Federal disse que “a Diretoria do ICDF desconhece a motivação técnica/jurídica para o início da cobrança do aluguel por parte do HFA”.

Segundo o ICDF, a atual gestão da entidade identificou “possíveis falhas” no Plano de Trabalho anexo ao Acordo de Cooperação Técnica com o HFA, feito em 2019, no qual foram inseridos os aluguéis. Por isso, a instituição solicitou ao Ministério da Defesa a reavaliação sobre a cobrança dos mesmos e a adequação com a lei e com o próprio acordo.

“Além disso, o ICDF não possui recursos financeiros para tal pagamento, uma vez que os recursos existentes são provenientes do SUS e são destinados ao abastecimento de insumos (cirurgias e tratamentos) e ao pagamento de pessoal”, afirmou.

O ICDF disse que não recebeu qualquer informação oficial sobre eventual despejo e que haverá desassistência da população e colapso no sistema de saúde do DF caso a entidade tenha que deixar a unidade: “Não há nenhuma outra unidade de saúde no Distrito Federal que realize transplantes cardíacos e cirurgias cardíacas pediátricas de alta complexidade pelo SUS”.

“É importante também destacar que a fila do complexo regulador é dinâmica e o ICDF é uma unidade hospitalar que dá solução a uma parte significativa dessa fila nas suas especialidades. Assim, o despejamento do ICDF resultaria em um aumento considerável dessa fila, provocando um colapso no sistema de saúde do Distrito Federal”, assinalou.

A entidade destacou ainda que faz cirurgia cardíaca adulta e pediátrica, marca-passo, cateterismo cardíaco, angioplastia, valvuloplastia, angioplastia aorta pulmonar e ramos, correção endovascular, transplante cardíaco, transplante hepático, transplante renal e transplante de medula autólogo. De janeiro a julho de 2021, foram realizados 2.037 procedimentos.

O Ministério da Defesa informou à coluna que “as metas e obrigações do ICDF no acordo não vêm sendo cumpridas, o que gera uma dívida para com a União, e obriga a administração pública a tomar as medidas necessárias e legais dentro da gestão dos recursos públicos empregados no acordo”. O órgão, contudo, afirmou que, neste momento, “não há previsão de pedido de desocupação ou adoção de outras medidas neste sentido”.

Confira, na íntegra, a nota do Ministério da Defesa:

“Inicialmente, o Ministério da Defesa informa que existe um Acordo de Cooperação com a Fundação Universitária de Cardiologia (FUC), gestora do Instituto de Cardiologia do DF (ICDF), que prevê obrigações tanto para o ICDF quanto para o Hospital das Forças Armadas (HFA). A operacionalização do aludido acordo, por parte desta Pasta, coube ao HFA.

Adicionalmente, o Instituto, mediante ressarcimento, utiliza-se do fornecimento de água, energia elétrica, gases medicinais, dentre outros benefícios, para seu funcionamento, além de continuar a ocupar espaços do HFA para realizar suas atividades de cirurgias e internações. Entretanto, as metas e obrigações do Instituto no referido Acordo não vêm sendo cumpridas, gerando uma dívida para com a União, obrigando a administração pública a tomar as medidas necessárias e legais dentro da gestão dos recursos públicos empregados no acordo.

Dessa forma, neste momento, não há previsão de pedido de desocupação ou adoção de outras medidas neste sentido.”

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