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Em momentos tão graves, surge o que há de melhor no ser humano

A tragédia vivida no Rio Grande do Sul traz consigo a capacidade de se humanizar radicalmente em circunstâncias de extrema dor

atualizado

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Matheus Piccini/Getty Images
Crianças são resgatadas em barcos após inundação do rio Guaíba em Porto Alegre, Brasil - Metrópoles
1 de 1 Crianças são resgatadas em barcos após inundação do rio Guaíba em Porto Alegre, Brasil - Metrópoles - Foto: Matheus Piccini/Getty Images

Quando uma cidade sofre, todos os de dentro dela sofrem com ela. Quando uma cidade fica feliz, a felicidade se espraia entre os que nela vivem. Triste ou alegre, a cidade é a extensão do corpo de cada um. A cidade está para seus moradores como a floresta está para o indígena; o mar, para o marinheiro; as geleiras, para os pinguins; o deserto, para os nômades. A cidade é o coletivo das solidões do viver. Mas pode ser também, magicamente, o coletivo da felicidade de estar vivo.

Há aproximadamente seis mil anos, os humanos inventaram as cidades. Elas são novinhas, portanto, dado o tempo da presença do sapiens na terra (algo em torno de 300 mil anos). E elas surgiram nos lugares mais inacreditáveis – nas montanhas, nos desertos, dentro da terra, em pântanos, na beira dos rios, em volta dos lagos, abaixo do nível do mar, em temperaturas extremas, sobre fendas de placas tectônicas, em ilhas oceânicas, na encosta de vulcões, o que nos faz imaginar que as cidades surgiram de algum tipo de paixão humana pela paisagem, qualquer que seja ela.

Tão fortes e tão frágeis, as cidades. Tão acolhedoras, se pequenas; tão perturbadoras, se gigantes. Mesmo nas megalópoles, cada um vai imperceptivelmente desenhando dia após dia, no seu mapa interno, a própria cidade. Por maior ou menor que seja, as cidades são tantas quantos são os seus habitantes. Elas moram dentro da gente. Por isso são fortes, sobrevivem a quase tudo.

Em momentos tão graves quanto os que passam as cidades gaúchas – enlameadas, isoladas, destruídas, submersas — surge de dentro delas o que de melhor há no ser humano, a capacidade de se humanizar radicalmente em circunstâncias de extrema dor e desamparo. É quando o outro volta a ser parte de nós mesmos, como era no começo do mundo sapiens.

Na desolação, o meu sofrimento é igual ao teu; a minha alegria é a mesma que a tua, as experiências são elevadas ao máximo denominador comum.

A imagem de homens agarrados pelos braços dentro d’água, formando um cordão humano até alcançar e puxar para um lugar seguro barcos com sobreviventes, é uma das muitas imagem de como nas tragédias coletivas, nós, humanos, nos reencontramos finalmente com nossa humanidade. A um custo altíssimo, mas a vida não poucas vezes cobra muito caro para se estar vivo. Mais ainda quando somos nós, os da Terra, os responsáveis pela catástrofe. Vamos aprender alguma coisa sobre os cuidados que temos de ter com o planeta? Tenho pra mim que não. A sorte é que, no desespero, os desesperados quase sempre podem contar uns com os outros e com os de boa vontade em todas as cidades, em todo o mundo.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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