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Indústria do refrigerante beneficiou Eunício e Maia

Presidentes do Legislativo vão decidir se pautam projetos que derrubam decreto de Temer e cortam isenção das empresas na Zona Franca

atualizado

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Michel Melo/Metrópoles
michael bebida
1 de 1 michael bebida - Foto: Michel Melo/Metrópoles

Até as últimas eleições, as maiores empresas do Brasil tinham permissão para fazer doações a candidatos que disputavam os votos dos eleitores brasileiros. Em 2014, além de construtoras e frigoríficos, grandes fábricas de refrigerantes apareceram entre as principais financiadoras das campanhas de senadores e deputados federais.

A Coca-Cola, por exemplo, doou quase R$ 14 milhões aos políticos, enquanto a Ambev (dona das marcas Brahma e Antarctica) repassou cerca de R$ 11,7 milhões a candidatos. Entre os beneficiários das empresas, aparecem os atuais presidentes do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), além do deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), que apresentou projeto para restabelecer isenção tributária para a indústria do setor.

Sofrendo com a redução do desconto no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) – que antes era de 20% e passou para 4%, após um decreto do presidente Michel Temer (MDB) assinado em maio –, as companhias representadas pela Associação Brasileira da Indústria de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (Abir), instaladas na Zona Franca de Manaus, buscam o apoio desses políticos para derrubar essa norma do Planalto.

Pelo menos três projetos de decreto legislativo (PDCs) de senadores e do deputado Avelino podem ser votados em plenário a partir desta semana. O mais adiantado deles é de autoria do parlamentar amazonense. A matéria já foi distribuída à Comissão de Finanças e Tributação (CFT) e à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

O parlamentar garante que, com o texto, está defendendo o estado do Amazonas e a Zona Franca de Manaus, ou seja, “o motor da economia amazonense e de seus empregos”. Segundo ele, se a redução fiscal diminuir, essas empresas de concentrados de refrigerantes poderão deixar a região e, assim, gerar um aumento no número de desempregados.

Ainda de acordo com o deputado, a iniciativa do PDC não tem nenhuma relação com os R$ 60 mil que recebeu da Recofarma – pertencente ao grupo Coca-Cola – e com os mais R$ 360 mil doados pela Companhia Paraense de Refrigerantes (Compar), fabricante da bebida na Região Norte do país, à sua candidatura nas últimas eleições.

“Estamos trabalhando para manter toda uma cadeia que emprega 12 mil pessoas. Portanto, a minha bandeira é o Amazonas. Em 2014, a legislação permitia a doação de empresas privadas. Recebi doações de diversas empresas, de diferentes áreas de atuação, que estão devidamente declaradas em minha prestação de contas”, completou. Em nota, a Coca-Cola Brasil e a Compar também informaram que as doações foram realizadas de acordo com a lei. “Os dados são públicos e estão disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral [TSE]”, completou.

Caso seja aprovado nas comissões, o projeto de Avelino precisará ser pautado no plenário da Câmara dos Deputados, papel que cabe ao presidente, Rodrigo Maia. Na semana passada, o democrata foi anfitrião de um encontro na residência oficial da Câmara, no Lago Sul, para debater a possível derrubada do decreto presidencial. Na reunião, estavam o governador do Amazonas, Amazonino Mendes, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, e o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid.

O Metrópoles apurou que Maia ainda não decidiu qual lado irá defender nessa briga. Ele sabe que o Planalto pretende gerar uma arrecadação extra de R$ 740 milhões ainda em 2018, ao aumentar a alíquota de impostos pagos pelos produtores de refrigerantes instalados no Amazonas e, assim, bancar o desconto no óleo diesel prometido aos caminhoneiros – medida usada para terminar a greve da categoria. No entanto, o pré-candidato à Presidência da República tenta manter o diálogo com os grupos empresariais.

Nas eleições de 2014, o presidente da Câmara dos Deputados recebeu R$ 200 mil da Praiamar Indústria, ligada ao Grupo Petrópolis. O conglomerado faz parte da Abir, mas sua fábrica não está instalada na Zona Franca de Manaus. Procurada, a assessoria de imprensa de Rodrigo Maia não quis se manifestar sobre o posicionamento dele. O grupo empresarial disse que não vai comentar as doações ao presidente da Câmara e os projetos em tramitação no Legislativo.

Senado
No Senado Federal, outras duas propostas serão discutidas na CCJ nesta terça-feira (19/6). Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Eduardo Braga (MDB-AM) também apresentaram PDC visando à derrubada do decreto de Temer. No TSE, não há dados sobre doações aos dois parlamentares feitas por empresas ligadas à Associação Brasileira da Indústria de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas. Eles, porém, não negaram que isso tenha acontecido ao longo de suas carreiras políticas.

“Nosso objetivo ao propor o decreto é manter os empregos diretos e indiretos que serão extintos no Amazonas caso o fim do incentivo aos concentrados permaneça. Os incentivos da Zona Franca são constitucionais e têm servido para fomentar o desenvolvimento na região e também ajudado a preservar a floresta”, afirmou a parlamentar do PCdoB. “Todas as doações que recebemos são legais e estão aprovadas pela Justiça. Em nenhum momento subordinei meu mandato aos interesses de doadores”, completou.

O senador Eduardo Braga não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre possíveis doações para as suas campanhas. Ao contrário dos demais senadores, o presidente da Casa, Eunício Oliveira (MDB-CE), declarou ter recebido em 2014, da Londrina Bebidas Ltda, ligada ao grupo Ambev, exatos R$ 998.690,19.

À época, o emedebista concorreu ao governo do Ceará. A assessoria de imprensa do parlamentar negou que as doações interfiram em suas decisões. “As propostas dos senadores Eduardo Braga e Vanessa Grazziotin seguirão tramitação normal”, informou.

Em resposta ao Metrópoles, a Cervejaria Ambev afirmou: “As doações eleitorais  foram feitas de forma apartidária, seguindo a representatividade dos partidos nos níveis federal, estadual e municipal, bem como a legislação vigente, em termos de limites e publicidade. Nenhum partido, candidato ou corrente política foi privilegiado”.

Lobby na Fazenda
Também na última semana, o lobby das empresas de concentrados de refrigerante instaladas na Zona Franca de Manaus foi recebido pelo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. Participou do evento, ainda, Jorge Rachid, secretário da Receita Federal, além da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas. Ninguém quis comentar o porquê do encontro. A Fazenda e a Receita Federal disseram apenas que o “assunto foi tributação do setor de bebidas”.

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