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Programa Ciência Sem Fronteiras reduzirá bolsas de graduação

Ideia é aperfeiçoar a preparação de estudantes do 2º grau com aulas de língua estrangeira. Projeto foi enviado ao Ministério da Educação e ainda precisa ser aprovado. Caso receba o aval, segunda etapa do programa deve contemplar também novas áreas de conhecimento

atualizado

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1 de 1 unb-abre - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Caso a mudança no comando do país se confirme nesta semana e o governo interino passe a ser definitivo até o fim de 2018, as mudanças em curso na economia continuarão sendo implementadas. Uma delas provocará alterações em programas educacionais, como o Ciência sem Fronteiras (CsF).

O gasto excessivo do governo federal com a iniciativa levou a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) a formular uma nova proposta para o programa. Isso, no entanto, não significa o fim de oportunidades para estudantes de graduação. A intenção é apenas diminuir o número de vagas para a modalidade. Entre as principais mudanças, entretanto, está a preparação linguística dos estudantes desde o ensino médio, para que o Estado não precise financiar os seis meses de estudo de idiomas àqueles que não são fluentes no idioma do país de destino (ou um ano, no caso do mandarim). O item custou nada menos que R$ 616 milhões à Capes, que bancou o estágio linguístico de 23.207 bolsistas de 2011 a 2014 – uma média de R$ 26.543 por estudante.

A solução encontrada é oferecer o aperfeiçoamento para alunos de ensino médio da rede pública por meio da ferramenta My English Online, que já é uma realidade para estudantes universitários. A Capes tem mais de 1 milhão de senhas disponíveis para o curso, que conta com quatro níveis e a aplicação de testes de proficiência como o TOEFL (Estados Unidos) e o IELTS (Reino Unido). No entanto, ainda é necessária a aprovação do Ministério da Educação, do Ministério do Planejamento e do Congresso Nacional, além uma mudança na Lei nº 11.502/2007, e alinhamento com as secretarias estaduais de Educação, para que o plano seja posto em ação.

Há também a pretensão de enviar docentes de nível médio para cursos no exterior. “Queremos proporcionar a oportunidade para professores e os melhores alunos poderem estagiar fora do país e aperfeiçoar melhor o conhecimento linguístico, principalmente em inglês”, explicou Connie McManus Pimentel, diretora da Relações Internacionais da Capes.

“A meta da primeira fase de mandar 101 mil bolsistas para o exterior em quatro anos foi bastante ousada. Então, as pessoas não tinham tempo para se preparar e as agências acabaram tendo que financiar a preparação linguística de muitos alunos fora do país. Isso, obviamente, custa muito caro”, ponderou Connie.

Outra modificação será na conduta do CsF. Se na primeira etapa a Capes e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) tinham controle sobre o programa, a ideia agora é passá-lo para as universidades. O plano é que as instituições de ensino também redefinam os parceiros, para que o número de possíveis destinos seja reduzido e a qualidade do ensino aprimorada.

Não queremos que as pessoas sejam internacionalizadas, mas sim as universidades. Nessa segunda versão, queremos que as instituições sejam mais proativas. A ideia é abrir um edital em que elas apresentem propostas para se internacionalizar, assim como para apropriação do conhecimento adquirido no exterior. A gente quer ver a alocação dos bolsistas dentro dos parques tecnológicos, empresas start-ups e das próprias universidades. É preciso que as pessoas apresentem um retorno para o país.

Connie McManus Pimentel, diretora de relações internacionais da Capes

Aposentado pela Universidade de Brasília (UnB), o professor Isaac Roitman acredita que a ideia do programa é interessante, mas tece críticas à forma como ele foi aplicado em 2011. “A iniciativa é legítima. A inovação do Ciência sem Fronteiras, do ponto de vista conceitual, foi mandar estudantes de graduação para o exterior. No entanto, foi um programa quantitativo. Provavelmente por motivos de marketing, mandou-se um número muito grande de estudantes. E qual o problema disso? Você mandar uma pessoa que não tem a capacidade de acompanhar as atividades acadêmicas lá fora”, avaliou.

“Como a meta era grande (de conceder 101 mil bolsas até 2014), foi muita gente que não tinha capacidade de se beneficiar dessa experiência. Na minha opinião, deveria ser feito um programa mais tímido e com critérios mais rigorosos”, destacou Roitman.

Bolsas
É o que pretende a Capes. A coordenação implementou, com o CNPq, um total de 92.880 bolsas para estudantes de todo o país. Desse total, 73.353 foram para graduação sanduíche (78%) – modalidade de curso superior em que o universitário realiza um período da faculdade fora do país de origem -, o que representa uma média de 7.335 bolsas a cada semestre. A meta para a segunda fase, se aprovada, será menor e deve contemplar mil alunos de graduação a cada seis meses de 2017. As oportunidades também seriam concedidas nos moldes de programas já existentes, como o Brafitec, da própria Capes.

A pós-graduação, no entanto, deve ter aumento no número de vagas. As bolsas para mestrado profissional e doutorado sanduíche, que tiveram média de 55 e 968 oportunidades, respectivamente, a cada semestre na primeira fase do programa, devem ter ofertadas mil e 2,5 mil vagas – também para cada metade do próximo ano.

As alterações foram encaradas como um ponto positivo por Roitman. “Nesse contexto, acho que está certo fazerem essa mudança. Reduzir, mas sem excluir os alunos de graduação. No entanto, acho que nas outras modalidades os números ainda são tímidos. É importante para a formação estar em diferentes lugares”, concluiu o especialista.

Novas áreas de conhecimento
Um ponto que recebeu diversas críticas na primeira etapa do programa foi a restrição das bolsas a estudantes das áreas chamadas de STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, na sigla em inglês). A intenção agora é expandir os campos contemplados para outras áreas, como Ciências Humanas, Sociais Aplicadas, Letras e Linguística.

“Não podemos pensar em internacionalização sem pensar em relações internacionais, administração e ciência política, por exemplo. Então gostaríamos de ver uma ampliação das áreas atendidas”, afirmou Connie.

O projeto também sugere que o nome do programa seja alterado, uma vez que a marca Science without Borders (inglês para Ciência sem Fronteiras) é patenteada. O novo nome ainda não foi divulgado, mas a mudança seria importante para que o país não sofra com litígios internacionais sobre patentes e propriedade intelectual.

Como a proposta ainda não foi aprovada, a Capes não divulgou o custo estimado de colocá-lo em prática. Procurado, o CNPq não soube informar o quanto foi gasto com o ensino de idiomas dos alunos que precisaram de aulas no exterior. O conselho também não respondeu sobre perspectivas para o programa nos próximos anos.

Balanço
Desde que foi implementado, em 2011, o Ciência sem Fronteiras teve gasto estimado em R$ 12,4 bilhões – com uma média de R$ 131 mil por estudante de graduação. Do total de bolsas, 27.821 foram destinadas a quem pretendia estudar nos Estados Unidos, país com o maior número de bolsas (30%).

Um desses estudantes é Alex Soraggi, de 23 anos, que cursa engenharia elétrica na UnB. Ele foi contemplado com uma das 3.326 bolsas concedidas ao DF e passou dez meses na California State University, em Fullerton (CA). “Tive uma experiência excelente, mas foi mais cultural do que acadêmica. Minha universidade não era ruim, mas não era renomada. A própria UnB tem um ensino mais rigoroso. E como já estou no fim do curso, as matérias ficaram bem restritas para mim”, contou o estudante.

“Eu acho que como é muita gente que vai – só para os EUA eram quase 5 mil –, fica meio difícil mandar todo mundo para universidade boa para realmente estudar. Acredito que se for para ter uma experiência acadêmica melhor, é preciso abrir menos vagas e para universidades melhores”, avaliou Soraggi.

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