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Com alta de mortes, contratações em cemitérios têm “boom” e sobem 146%

Busca por profissionais que trabalham em cemitérios atinge maior nível em 10 anos, segundo dados do Ministério da Economia

atualizado

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Hugo Barreto/Metrópoles
Coveiros se prepararam para mais um enterro
1 de 1 Coveiros se prepararam para mais um enterro - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Diariamente, desde setembro do ano passado, Juliana Baltz Lopes vai para o trabalho caminhando ou de carona, em uma rotina que começa às 7h e só termina após as 17h, com ao menos três enterros e seis cremações. Sepultadora e cremadora no Memorial Cemitério e Crematório em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, a mulher de 36 anos estava desde fevereiro do ano passado sem emprego, quando ficou doente e foi demitida de um mercado.

Diante da retração da economia, agravada pela pandemia, foi no cemitério, em meio ao luto de centenas de pessoas, que Juliana conseguiu encontrar uma possibilidade de pagar as contas.

“Na cidade, a demanda está grande e, como atendemos os municípios vizinhos, aumentou mais ainda. No crematório, era uma pessoa. Agora, mais duas serão contratadas”, contou a sepultadora.

Segundo levantamento realizado pelo (M)Dados, núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, o Brasil viu, devido à pandemia, aumento expressivo no número de novas vagas para sepultadores, agentes funerários e cremadores.

De 2020 a janeiro de 2021, o país criou 1.084 vagas para essa área, crescimento de 146% em relação ao ano de 2019, quando foram contratados 441 novos profissionais.  

Em 10 anos, nunca nunca se viu tamanha oferta de vagas para esse ramo. Os postos para sepultador tiveram o maior crescimento: 536% – foram 267 empregos criados durante o primeiro ano de pandemia, contra 42 em 2019.

Em todas as cidades

Em São Paulo, cidade com mais óbitos provocados pela Covid-19 no país, a falta de profissionais fez com que a prefeitura, por meio do serviço funerário do município, contratasse de forma emergencial 175 terceirizados em 2020 e no início de 2021.

Atualmente, 348 sepultadores atuam nos cemitérios municipais, e pelo menos 13 mil novas valas foram abertas em 2020.

Somente em março deste ano, 7.381 enterros foram realizados até a última quinta-feira (25/3), maior número em seis meses.

Nas cidades pequenas, profissionais da área viram o trabalho dobrar. Eles se dividem para dar conta do volume crescente de enterros. Breno Baeta é o único coveiro do município de Cristiano Otoni, localizado na região central de Minas Gerais, com cerca de 5 mil habitantes.

Responsável por dois cemitérios, Baeta tem tarefas que vão além do sepultamento: venda de terrenos, organização dos equipamentos de proteção contra a Covid-19, manutenção, construção de túmulos e abertura de novas covas.

O coveiro escolheu a profissão em um concurso público da cidade realizado em 2016. O benefício financeiro, segundo ele, era bom para um município do interior. O que Baeta não imaginava “é que rolaria uma pandemia”.

Em todo o ano passado, o profissional realizou 71 enterros. Em apenas três meses deste ano, foram 41. No dia 15 de março, computou mais quatro sepultamentos no mesmo dia, o que nunca tinha acontecido antes.

“Não tenho horário fixo. Quem determina meu trabalho é a morte”, lamenta.

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Exumação

No meio da entrevista, Breno teve de se ausentar: foi chamado para fazer uma exumação. Entretanto, o túmulo escolhido não iria, naquele momento, receber um corpo. Era a preparação para uma mulher que estava na UTI, vítima do coronavírus.

“A exumação é do túmulo de uma mulher que está intubada, com Covid. Ela não morreu, e esperamos que não morra. Mas a família tem um túmulo que está ocupado pelo pai dessa senhora em questão.”

Recentemente, a Prefeitura de Cristiano Otoni colocou à disposição mais uma pessoa para ajudar, caso os sepultamentos aumentem muito. Breno fez posts nas redes sociais e reclamou: querem que o “quebra-galho” fique à disposição permanentemente.

O presidente da Associação de Empresas e Diretores do Setor Funerário (Abredif), Lourival Panhozzi, afirma que empresas já tiveram de fazer remanejamento e contratação de ex-funcionários devido à alta demanda.

“Cancelamos até férias para dar conta do trabalho. Está sendo difícil atender”, disse.

A demanda por profissionais fez com que a associação emitisse, no começo do mês, recomendação para que as mais de 13 mil funerárias filiadas suspendessem as férias em curso de todos os funcionários ligados a toda cadeia de atividade funerária.

Outro setor que tem alta demanda é o de fábricas de caixão. Empresas de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pará e Ceará já acumulam, juntas, pedidos para produção de, ao menos, 100 mil furnas, com entrega prevista só para maio ou junho, segundo levantamento do Metrópoles.

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