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Brasileiro viu guerra do Afeganistão de perto: “Talibã veio para ficar”

Goiano que serviu ao exército americano em Cabul conta o que ouviu da população cercada entre o radicalismo e a corrupção

atualizado

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Arquivo pessoal
Goiano no afeganistão
1 de 1 Goiano no afeganistão - Foto: Arquivo pessoal

Goiânia – A retomada do Afeganistão pelo grupo radical islâmico Talibã mexe com a memória do sargento reservista do exército dos Estados Unidos Antônio Caiado, de 38 anos. O militar nasceu e passou a infância no interior de Goiás e, em 2011, serviu por nove meses na capital, Cabul.

O período em que Antônio viu a guerra do Afeganistão de perto foi suficiente para que ele formasse um retrato sobre a sociedade e violência no país. O sargento viu o chão tremer com um homem-bomba, ouviu o pavor de afegãos com a volta do regime Talibã e descobriu que terroristas usam drogas para aguentar a pressão.

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A partir da sua experiência, Antônio traça um cenário em que o Talibã já se tornou um mal menor, em que suas lideranças vão tentar ser mais moderadas para manter a dominação do país. O problema, na avaliação dele, agora é outro.

“O grande problema hoje não é o Talibã. Eles vieram para ficar. O grande problema é que criaram um monte de milicianos radicais. Os grandes do Talibã não querem ser radicais, porque se eles forem radicais, vão sair do poder, porque o ocidente vai entrar.”

No dia 26 de agosto deste ano, o Estado Islâmico Khorasan (ISIS-K) foi responsável por um atentado no aeroporto de Cabul, que matou mais de 70 pessoas, entre elas, 12 militares norte-americanos. O ISIS-K e o Talibã são da vertente sunita do islamismo, mas são rivais.

Choque e desmaio

Em 2011, quando o sargento servia em Cabul, a realidade era diferente. Não havia homens do Talibã nas ruas e país contava com um presidente eleito no poder. Ainda assim, a guerra não havia acabado, e houve momentos de tensão.

O dia mais marcante para Antônio foi 2 de abril de 2011. Naquele período, o Talibã organizou protestos e atentados em diferentes pontos do país, depois que um pastor americano queimou uma cópia do alcorão, livro sagrado dos muçulmanos.

Antônio estava em uma base militar no leste de Cabul, quando três homens vestidos de burca se aproximaram do portão atirando e dois deles detonaram seus coletes explosivos. O terceiro foi morto a tiros pelos militares.

“Um terrorista não sobrou nada, virou carne moída. O outro sobrou a perna, a 100 metros de distância. Se você estiver 300 metros de distância da explosão, você sente o chão tremer. O choque é tão grande que te deixa desmaiado”, relata o sargento.

O goiano conta que depois do ataque, quando foram ver a ação dos homens-bombas instantes antes da investida, por câmeras de monitoramento, perceberam que eles estavam grogues. “Além da lavagem cerebral, eles usam droga para tomar coragem”, explica.

O Afeganistão é considerado um dos maiores produtores de ópio do mundo, que é uma substância derivada de papoulas soníferas.

Marcas do terror

Entre as atividades realizadas pelo sargento Antônio Caiado, enquanto esteve em Cabul, estavam entrevistas com lideranças religiosas e comunitárias dos bairros, para saber sobre insatisfações e demandas. Os pedidos mais comuns eram por energia e esgoto.

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Antônio diz que, durante essas entrevistas, ouvia sobre o pavor que os moradores tinham do Talibã, mas também a insatisfação com o governo democrático, que era considerado corrupto. Os afegãos desconfiavam dos que enriqueciam rapidamente, depois de se aproximarem do governo.

“Para sobreviver, as pequenas mineradoras pagavam propina para os dois lados. Tinham que pagar o Talibã, para o grupo não fazer mal para eles ou alguém da família. Da mesma forma, tinham que pagar imposto normal do governo. São pressionados pelos dois lados”, destaca.

Também eram nessas entrevistas que o sargento de Goiás ouvia relatos de terror sobre o passado. O seu intérprete, por exemplo, relatou que a mãe quebrou a perna depois de apanhar do Talibã, porque estava no supermercado sem a companhia de um homem. Depois disso, a família fugiu para o Paquistão.

O campo de futebol de terra, que fica próximo ao aeroporto, era um local de memórias terríveis, de execuções públicas. No presídio, próximo às montanhas, onde havia integrantes do Talibã, ataques aconteciam mensalmente.

Depois desse período no Afeganistão, Antônio diz que passou a agir melhor em situações extremas, mas que também acabou se tornando uma pessoa mais fria. “Quando se fala de guerra, as pessoas morrem. Você vê brasileiros com pena, mas, para mim, é normal.”

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