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Governo minimiza apagão, ataca venda da Eletrobras, e oposição surfa na crise

Cerca de 29 milhões de pessoas foram afetadas pela falta de energia elétrica em todos os estados ligados ao Sistema Interligado Nacional

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
foto colorida de redes elétricas
1 de 1 foto colorida de redes elétricas - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

O governo Lula tentou dar ao apagão elétrico dessa terça-feira (15/8) um ar de episódio isolado e sem risco à segurança energética do país; em contrapartida, a oposição aproveitou para surfar no momento negativo do Planalto. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD-MG), voltou às pressas do Paraguai e saiu em defesa do sistema elétrico nacional. Enquanto isso, pessoas ligadas ao governo atacaram a venda da Eletrobras.

Já os bolsonaristas foram às redes, desde o início da manhã, para criticar o atual momento, e fizeram piada com a situação. “Apagão, mas com amor”, alfinetou o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Apesar da abrangência do problema, especialistas concordam que o episódio pode ter sido, de fato, um problema isolado, mas que requer atenção das autoridades.

De toda maneira, a manhã de terça-feira foi caótica. Por conta de dois episódios seguidos (um em uma linha de transmissão no Ceará e outro em local ainda a ser identificado), um apagão atingiu 26 das 27 unidades da Federação – à exceção de Roraima, que não está integrada ao Sistema Interligado Nacional (SIN). A situação prejudicou a vida de cerca de 29 milhões de brasileiros. Em alguns pontos, a falta de energia chegou a durar seis horas.

Os primeiros problemas começaram a ser relatados às 8h30. Os registros incluem metrôs inoperantes, semáforos apagados, pessoas presas em elevadores, estabelecimentos comerciais funcionando à luz de velas e outros.

A situação foi normalizada às 9h30 nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. A retomada do fornecimento no Norte e Nordeste, porém, só ocorreu às 14h49.

Eletrobras

Do lado dos petistas, não faltaram lembranças à privatização da Eletrobras. A primeira-dama Rosângela da Silva, por exemplo, postou um comentário seco na rede X, antigo Twitter: “A Eletrobras foi privatizada em 2022. Era só este o tuíte”. Mais tarde, já de volta ao solo nacional após ida ao Paraguai acompanhando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro Silveira também lembrou da privatização ao dar explicações à imprensa sobre o apagão. Segundo ele, a venda “fez mal ao sistema”.

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Já no fim do dia, a equipe de Lula usou um grupo de WhatsApp para tratar do mesmo tema. “Bolsonaro privatizou a Eletrobras em 2022. Isso aconteceu da pior forma possível. TCU apontou um prejuízo de R$ 67 MILHÕES. Menos de 1 ano depois temos um apagão em 25 estados e no DF. Acho que tá nítido de quem é a culpa, né? Apesar disso, governo Lula está colocando todos os seus esforços para que essa questão seja resolvida o mais rapidamente possível, causando o mínimo possível de transtornos aos brasileiros”, escreveu a equipe do petista.

As declarações de Lula contra a privatização da Eletrobras têm sido um mantra do petista, aliás, desde a campanha eleitoral de 2022.

Ao longo do dia, aliados do presidente, como Gleisi Hoffman (deputada federal e presidente do PT) e Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), por exemplo, também foram na mesma linha.

Piadas bolsonaristas

Por seu lado, os bolsonaristas alfinetaram o governo nas redes sociais e, ainda, aproveitaram para mencionar o aumento anunciado nos preços dos combustíveis.

“Apagão no Brasil! Aconteceu hoje, mas começar, começou em 1º de janeiro. O Brasil voltou! Voltou ao Apagão! A gasolina, lembra? Subiu hoje [R$] 0,41 para as distribuidoras. O apagão da BR! Governo do Apagão!”, postou o senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Jair Bolsonaro.

O deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) foi na mesma linha de Nogueira: “O Brasil está em apagão desde 1º de janeiro deste ano”.

“Mais um ‘apagão’ pra conta do PT!”, postou o senador Jorge Seif (PL-SC). Ele também citou o aumento no preço dos combustíveis. “Esse é o ‘amor’ vencendo?” Em seguida, postou imagens falando de apagões em governos anteriores do PT.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), nas redes sociais, comentou o apagão elétrico e o aumento nos combustíveis.

Já o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) retuitou um post de Pablo Spyer, que cita que, na manhã seguinte à renúncia do CEO da Eletrobras, o país enfrentou apagão em vários estados.

Segurança energética

De acordo com o ministro Silveira, a atual ocorrência não tem “absolutamente nada a ver com o suprimento energético e a segurança energética do Brasil”. “Nós vivemos um momento de abundância dos nossos reservatórios”, assegura o titular da pasta federal.

Apesar disso, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) ainda não entregou o relatório final sobre as causas do incidente. O ONS tem o prazo de 48 horas para apresentar o documento. Até o momento, as autoridades identificaram apenas um incidente em uma linha de transmissão no Ceará, que não foi detalhado. Outros problemas concomitantes não são descartados.

De acordo com Silveira, o apagão de terça afetou de 27 a 29 milhões de consumidores, cerca de um terço do total.

Diferentes opiniões

Especialistas ouvidos pelo Metrópoles divergem sobre a possibilidade de uma nova crise energética a partir do evento da semana.

Professor do departamento de Energia Elétrica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Luis Chiganer alerta para o risco de novos apagões devido ao esvaziamento da Eletrobras nos últimos anos.

“Já vinham desmontando a Eletrobras. Cada vez mais, tínhamos menos pessoas experientes no sistema elétrico e, quando teve a ‘pseudoprivatização’, ela incentivou mais o desligamento de pessoas experientes. Eles acham que uma redução de pessoas vai trazer uma redução de custos no setor elétrico, mas nós sabemos que os maiores custos são os de investimento. Cada usina custa milhões de dólares”, aponta.

Chiganer acredita que o sistema elétrico do país está sendo destruído. “Acredito que nós vamos ter [novos apagões]. Temos um centro de pesquisa da Eletrobras que foi esvaziado, então você tem uma estrutura mínima, você vai planejar e planeja mal, não faz investimento no que deveria fazer”, avalia.

Eventos como o de terça-feira são vistos como raros para o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Vanderlei Martins, economista e doutor em planejamento energético pela Coppe/UFRJ. Ele não identifica riscos de uma nova crise energética no país.

“O apagão é um resultado do procedimento de corte de carga feito pelo ONS. Esse esquema de alívio da carga acontece para proteger a carga. Significa que o sistema está preparado para eventos como esses”, pontua. Vanderlei lembra, porém, que as cada vez mais presentes fontes de energia renováveis são intermitentes, ou seja: há interrupções e a produção não é contínua.

“Com a introdução da renovável, precisamos pensar na flexibilidade operativa. Pode ser armazenamento de energia, gerenciamento pelo lado da demanda. O governo tem que garantir a flexibilidade para ajudar o sistema na operação”, destaca.

Vinícius Resende Domingues, coordenador adjunto da pós-graduação de gestão de infraestrutura e governança da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB), destaca que, para haver um apagão como o registrado nesta terça, são necessários ao menos dois eventos simultâneos.

“Para que haja queda no fornecimento de energia em tantos estados como aconteceu hoje [15/8], realmente precisam de grandes eventos simultâneos”, disse Domingues. “Mas é preciso aguardar os relatórios dos órgãos responsáveis, que vão apontar as causas exatas do corte do fornecimento de energia”, completa o professor do Mackenzie.

Apagões no passado

Em março de 1999, um blecaute atingiu 10 estados brasileiros e o Distrito Federal. A falta de luz chegou, inclusive, ao Paraguai, região abastecida pela energia gerada na usina de Itaipu.

Na época, o apagão foi causado pela queda de um raio na subestação de energia elétrica da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) em Bauru, São Paulo.

Tempo depois, a estiagem e o racionamento colocaram à prova a capacidade de geração de energia por meio das hidrelétricas em 2001. Para tentar reaver a situação, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) decidiu realizar blecautes programados para evitar o colapso do sistema elétrico.

Chiganer destaca, no entanto, que a crise de 2001 também foi impulsionada pela tentativa de privatização do sistema elétrico brasileiro e pela proibição de que empresas de energia estaduais firmassem empréstimos para novos investimentos.

“Naquela época, ele queria privatizar o setor elétrico; então, ele proibiu as empresas estatais de pegarem empréstimos. Você não tinha dinheiro, não tinha dinheiro para construir usina; faltou investimento”, afirma o professor da Uerj.

Vinícius Resende Domingues reforça que as ocorrências em 1999 e em 2001 não podem ser comparadas com o apagão desta semana, uma vez que o sistema está cada vez mais moderno e interligado. “Nestes últimos anos, desde o último grande caso como o de hoje, o sistema se modernizou e ampliou bastante, inclusive interligando mais regiões.”

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