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Disputa expõe laranjas, trabalho escravo e vida de luxo de fazendeiro

Longe dos holofotes, Guimar da Silva construiu um império de fazendas em nome de funcionários e é acusado de fraudes para driblar dívidas

atualizado

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Guimar Alves da Silva - METRÓPOLES
1 de 1 Guimar Alves da Silva - METRÓPOLES - Foto: null

No dia 11 de dezembro de 2015, dois cerqueiros foram resgatados da fazenda Ribeirão Bonito, em Novo Repartimento, no Pará, por auditores do Ministério do Trabalho em condições análogas à escravidão. Eles moravam em um barracão pelo qual transitavam aranhas e morcegos, bebiam a mesma água dos cavalos e faziam as necessidades no mato.

Imediatamente, auditores e policiais federais saíram perguntando pelo dono da fazenda, que reúne terrenos de mais de 20 matrículas e tem capital de R$ 45 milhões. Formalmente, era um humilde funcionário do próprio local. Depois, um contador da propriedade admitiu que o sócio formal recebia salário mínimo para emprestar seu nome e que o verdadeiro dono da fazenda era o empresário Guimar Alves da Silva (foto em destaque).

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Morador de uma portentosa casa em um condomínio famoso por abrigar mansões de músicos e artistas em Goiás, Guimar ostenta viagens de helicóptero, carros de luxo e dá as cartas, sem ser sócio formal, em empresas de embalagens de plástico que prestam serviços a grandes redes supermercadistas e fábricas de alimentos.

Discreto, Guimar não é midiático. Suas redes sociais são fechadas para amigos próximos. A este grupo seleto, no entanto, ele exibe uma vida luxuosa. Não raro, é presença em reuniões entre empresários e políticos. Em uma delas, aparece abraçado a deputados federais e estaduais, secretários de estado e até a um senador.

 

Mas é no Judiciário que Guimar ficou famoso. Ele responde a mais de uma dezena de processos por dívidas que chegam a R$ 87 milhões. Em nome dele, só há empresas antigas com registros cancelados. A Justiça, quando procura bens e contas bancárias para satisfazer dívidas, não encontra nada.

Pelo trabalho escravo em sua fazenda, ele fez um acordo com o Ministério Público Federal (MPF) em 2021. Pagou R$ 30 mil para que uma denúncia criminal fosse retirada.

Ao se explicar em audiência com procuradores, ele nem sequer admitiu o crime. Apenas confessou ser responsável pelos funcionários. “Na época, eu era empreiteiro, não tinha nada que maltratava eles, foi denúncia à toa. O cara trabalha no Pará, o sistema é esse: o cara chega lá, faz uma cerca, faz uma ponte…”, disse. Mesmo assim, o acordo foi aceito. No papel, o reconhecimento da culpa está mais evidente.

Os problemas de Guimar não se encerram aí. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e dois pesos pesados da indústria o acusam de realizar calotes milionários. Parte desses credores ainda afirma que ele comete essas fraudes para se esquivar de dívidas e manter o alto padrão de vida.

“Rei do laranjal”

Segundo essas empresas, suas joias da coroa estão em nome de funcionários e parentes. As dívidas se arrastam por anos e, em meio a bloqueios frustrados, o empresário pede a prescrição das cobranças. O processo mais recente diz respeito a R$ 15 milhões.

Trata-se de uma ação da Polo Indústria, do ramo de material plástico, referente a uma dívida da Plasticom, uma das empresas do império de Guimar. A dívida de R$ 1,5 milhão, datada de 2005, não foi paga até hoje. Em 18 anos, o valor cresceu 10 vezes.

À Justiça a credora subiu o tom. Deu até um apelido a Guimar: “Rei do laranjal”. E complementou: “A história do devedor que oculta sua fortuna por meio de laranjas e mais laranjas!”.

A empresa afirma que, após o flagrante do trabalho escravo, a Fazenda Ribeirão Bonito, que tem capital de R$ 45 milhões e engloba mais de duas dezenas de matrículas, com 1,9 mil hectares, está em nome de um funcionário da Piloto, uma empresa de embalagens ligada a Guimar.

Apesar de não estar em nome do empresário, ele é quem aparece como mandachuva dela em reuniões publicadas nas redes sociais. Aliás, foi em uma sala cheia de embalagens ao fundo que Guimar participou da videoconferência com procuradores da República para firmar o acordo de não persecução penal por trabalho escravo.

Decisão judicial falsa

Em outro processo, o BNDES cobrou, em 2006, uma dívida de R$ 2,8 milhões da Plasticom. Obteve decisões favoráveis, mas a Justiça tinha dificuldade de achar saldo nas contas de Guimar. Foi penhorado um apartamento em Goiás.

Pouco tempo depois, o cartório informou ter tirado o bloqueio da matrícula do imóvel, porque recebeu um e-mail de uma diretora da 10ª Vara da Justiça Federal de Goiás no qual comunicava que havia uma ordem para retirada do confisco.

Após uma pesquisa simples nos quadros do Judiciário, descobriu-se que a diretora nem sequer existia e tudo era falso. Assim que o bloqueio foi cancelado, o imóvel foi repassado a outra empresa, que o vendeu a um casal. O caso foi parar na PF. Não há notícias sobre quem foi o autor do crime. Não houve também sanções a Guimar pelo ocorrido.

Empresa fechada e prescrição

Recentemente, a Plasticom tem investido em pedidos de prescrição da dívida, cujo crédito foi adquirido por um fundo de investimentos junto ao BNDES. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) rejeitou o pedido nesse ano. O processo nunca terminou e a dívida não foi quitada. Atualizada, ela está em R$ 26 milhões.

Em um processo da Dow Brasil, empresa do ramo da indústria química, a Justiça reconheceu que houve fraude na transferência de um imóvel para o nome da filha de Guimar.

Procurada pelo Metrópoles, a defesa de Guimar não se manifestou. O espaço segue aberto para manifestação.

No processo, a Plasticom, uma de suas empresas, tem afirmado que não tem saldo em suas contas, porque está enredada em um emaranhado de dívidas e fechada há mais de uma década. Em diversos processos, a empresa tem pedido a prescrição das dívidas.

A Dow também não se pronunciou. A assessoria do advogado João Augusto Ferreira, que defende a Polo Indústria, afirmou que não compartilha informações sobre processos em curso.

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