Como se faz um doutor

Eles foram os primeiros em suas famílias a conquistar o título acadêmico e fazem do diploma um instrumento de transformação social

LEILANE MENEZES

11/06/2021 17:02

Metamorfose: alteração de personalidade, modo de pensar, aparência, caráter. Também significa o contrário de conservação. No Brasil, nas últimas duas décadas, o meio acadêmico iniciou uma mutação. Novos tons de pele passaram a circular entre quem veste jalecos brancos nos laboratórios. Filhos de pessoas semialfabetizadas assinaram teses e tornaram-se doutores.

O Brasil, porém, ainda está entre as três nações com menor número de doutores, como mostra relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que analisou dados de 35 países. A proporção nacional de pessoas com doutorado é de 0,2% da população. A média dos outros locais que compõem o grupo é de 1,1%.

Dentro desse grupo, há um recorte ainda mais restrito. A primeira vez que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação, divulgou dados referentes aos doutorandos com perfil racial foi em 2017. Nesse ano, foram 22.056 novos doutores, dos quais 1.460 negros, amarelos e indígenas (6,6%, no total).

Em 2018, só um em cada quatro matriculados em programas de mestrado e de doutorado no Brasil era negro.

Fonte: Capes

Em 2019, dado mais recente compilado pela Capes, o Brasil concedeu 24.432 títulos de doutorado, dos quais 2.492 destinados a negros; 171, para amarelos; e 27, a indígenas. Somados, os grupos étnicos representam 2.690 estudantes (11%).

São quatro anos, no mínimo, para se formar um doutor, sem contar a graduação e o mestrado. Quem conquistou o diploma em 2019 ou 2017 iniciou esse ciclo de estudos bem antes. Políticas públicas afirmativas, como a Lei de Cotas, e mecanismos de permanência nas universidades fazem parte desse enredo.

O que se vê, em 2021, é o estágio embrionário dessa metamorfose acadêmica, ameaçada de interrupção pelo corte de orçamento para ciência e tecnologia. Também está no horizonte a revisão da Lei de Cotas, prevista para 2022.

Nesta reportagem, o Metrópoles destaca a trajetória de doutores que foram os primeiros em suas famílias a conquistar esse diploma. A maioria são filhos de pessoas que começaram a trabalhar ainda na infância como engraxates e empregadas domésticas, ou que são descendentes de pessoas escravizadas. Por meio da educação, eles quebraram o círculo da desigualdade.

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Doutor Jefferson Nascimento, 39 anos, São Paulo

Futuro ameaçado

Oficialmente, as cotas raciais no Brasil começaram em 2003, nos vestibulares da Uerj e da Universidade Estadual da Bahia (Uneb). Em 2004, passaram a valer também no processo seletivo de federais: primeiro, na Universidade de Brasília (UnB); em seguida, na Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Somente em 2012 a reserva de vagas passou a ser obrigatória em todo o país, com a Lei Federal nº 12.711, de agosto de 2012, a Lei de Cotas, sancionada pela então presidente, Dilma Rousseff (PT).

Metade das vagas oferecidas precisam ser de ampla concorrência e o restante deve ser reservado por critério de cor, rede de ensino e renda familiar — entre os quais, autodeclarados pretos, pardos e indígenas e pessoas com deficiência.

Em 11 de maio de 2016, o governo de Dilma Rousseff também publicou uma portaria estabelecendo a política de cotas para negros, indígenas e pessoas com deficiência em cursos de pós-graduação. Houve uma tentativa de derrubá-la em 2020, pelo ex-ministro Abraham Weintraub, mas o MEC voltou atrás.

Em 2022, a Lei de Cotas será revisada. O artigo sétimo do dispositivo estabelece que, no prazo de 10 anos a contar da data de publicação — ou seja, em agosto de 2022 -, será promovida “a revisão do programa especial para o acesso às instituições de educação superior de estudantes pretos, pardos e indígenas e de pessoas com deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.”

Dados do Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais Cenários do Direito à Educação, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), referentes às duas últimas décadas, apontam que triplicou a proporção de alunos negros, pobres e indígenas nas universidades. A incidência de pessoas selecionadas de acordo com critérios de renda aumentou seis vezes, e parou de crescer em 2016.

Esse aumento, segundo especialistas, foi fruto de políticas públicas, investimentos em educação, ciência e tecnologia, que estão ameaçados. Além de falar abertamente contra a política de cotas, o governo federal vem cortando o financiamento de pesquisas.

A Capes anunciou o corte de 5.613 bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado, no fim de 2020. O orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) caiu 87%, entre 2020 e 2021. O reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, instituição comunitária de ensino superior voltada para a igualdade racial, o doutor em educação José Vicente, comenta esse cenário e fala sobre as expectativas para 2022:

DIRETORA-EXECUTIVA
Lilian Tahan
EDITORA-EXECUTIVA
Priscilla Borges
EDITOR-CHEFE
Otto Valle
COORDENAÇÃO E EDIÇÃO
Olívia Meireles
REPORTAGEM
Leilane Menezes
REVISÃO
Juliana El Afioni
EDICÃO DE ARTE
Gui Prímola
DESIGN
Yanka Romão
EDIÇÃO DE VÍDEO
Israel Sousa
EDIÇÃO DE FOTOGRAFIA
Daniel Ferreira
Michael Melo
FOTOGRAFIA
Aline Massuca
Fábio Vieira
Manuela Cavadas
Michell Mello
TECNOLOGIA
Allan Rabelo
Daniel Mendes
Saulo Marques

“Educação não pode existir só em propaganda na TV”

Doutor Guilherme Lopes, 29 anos, Piripiri (PI)

“Sou filho de Francisco José de Oliveira, 63 anos, e Maria dos Remédios Lopes, 60 anos. Meu pai é pedreiro, minha mãe é costureira. Eles são semianalfabetos. Ela tem a 4ª série e ele, a segunda série do ensino fundamental. Os dois sempre trabalharam com serviços braçais, com o que foram aprendendo durante a vida, sempre sem poder aquisitivo, na zona rural do Piauí.

Quando eu era criança, me levar para a escola era a prioridade deles. Sempre foram claros, desde muito cedo, ao dizerem que só na escola a vida da gente poderia mudar. Meu pai, durante a minha adolescência, me levou para trabalhar com ele algumas vezes para eu ver como era a realidade e depois escolher o que eu queria. Ele dizia: eu só posso te ensinar a minha profissão.

Sempre fui bastante antenado, não gostava de vê-los trabalhando de forma dura e pesada. Mesmo com a precariedade na escola pública, sempre fui bastante dedicado. Eu pensava em ser cientista já na infância, era muito influenciado pelos meus professores. Sabia que queria trabalhar em laboratório, com pesquisa, mas a gente sabe que as oportunidades não são iguais para todos. Todo mundo tem direitos, mas não as mesmas oportunidades.

Guilherme Lopes terminou o doutorado em 2018, com 26 anos. Naquele ano, foi o doutor mais jovem do Brasil, segundo a Capes. Crédito: Arquivo Pessoal

Passei toda a vida em escola pública e terminei o ensino médio em 2009. Sempre gostei muito da área de ciência, especialmente biologia. Passei no vestibular para universidades públicas, mas não para o curso que eu mais queria, biomedicina. Fui aprovado pelo Prouni como bolsista na Faculdade Maurício de Nassau, no Piauí, e escolhi fazer lá a minha graduação. Nesse período me dediquei muito à pesquisa científica, fui voluntário na Universidade Federal do Piauí como monitor por três anos, no laboratório de pesquisa.

Em 2013, terminei a graduação e, nesse processo, vinha uma angústia de que ao fim do curso teria de voltar para a casa dos meus pais sem nada, só com o diploma, o que não ia adiantar muita coisa. Comecei a pensar no mestrado, mas veio o convite do meu orientador para fazer o doutorado direto. No dia da colação de grau, eu já estava aprovado para o doutorado em biotecnologia, na Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Guilherme é doutor em biotecnologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Crédito: Arquivo Pessoal

Pelo Ciências Sem Fronteiras, pude passar 2015 em intercâmbio na Universidade de Sevilla, na Espanha. Foi extremamente importante, o melhor ano da minha vida profissional. Conheci os laboratórios de ponta, espaços de trabalho como nunca tinha visto, aquele momento foi muito necessário para o meu amadurecimento profissional. Também fui bolsista Capes/CNPq por três anos.

Terminei o doutorado em 2018, com 26 anos. Naquele ano, fui o doutor mais jovem do Brasil, segundo a Capes. Minha pesquisa foi sobre uma planta com atividade anti-inflamatória a ser estudada para virar medicamento.

Hoje, eu tenho 29 anos e sou professor na mesma faculdade onde me formei, em Piripiri. Voltei para a minha cidade e foi a melhor coisa que aconteceu. Também trabalho na Secretaria de Saúde como coordenador de programas e projetos. É algo muito relevante para a população local e estando aqui consigo contribuir com os novos jovens profissionais. Fico muito feliz com isso.

Crédito: Arquivo Pessoal

Crédito: Arquivo Pessoal

Crédito: Arquivo Pessoal

Ainda hoje ouço perguntarem se realmente fiz um doutorado. Alguns questionam e não entendem como isso foi possível. Passei a ser muito conhecido como o doutor mais jovem do Brasil, aqui na cidade as pessoas têm carinho e admiração por mim.

Todos os dias me param na rua, perguntam como eu consegui e dizem que sou inspiração. Tornei-me um referencial para muitos jovens do meu bairro, que é na periferia. Eu faço palestras, visito escolas e tento dizer que se eles estudarem, com o devido apoio, também podem conseguir. Sempre levo essa mensagem de que a educação para todos não pode existir só em propaganda na TV.

A educação mudou a minha história e tenho conseguido mudar a história da minha família, influenciar amigos e parentes. Não teríamos outra forma de ascensão financeira, por todo o nosso histórico social e familiar.

Meus pais, mesmo sem ter condições financeiras, me ofereceram o melhor que podiam e isso foi muito. Agora, estão vendo o fruto de tudo o que eles plantaram. Eles sempre foram muito presentes, na formatura entraram comigo, na defesa da tese estavam lá. É uma conquista de toda a família.

O pai de Guilherme é pedreiro e a mãe é costureira. Eles são semianalfabetos. Crédito: Arquivo Pessoal

Um dia desses, perguntei à minha mãe por que ela parou de estudar na 4ª série. Ela precisou trabalhar muito nova, na zona rural. Não era possível estudar e trabalhar. Eu sou muito grato porque meus pais deram o sangue para que a gente (eu e minha irmã, que se formou em farmácia) pudesse estar na escola.

Meu pai começou a trabalhar aos nove anos de idade, ia vender pão, picolé. Eu não precisei trabalhar e me dediquei aos estudos. O incentivo social é muito importante: nem todos têm oportunidades e as políticas públicas existem para diminuir a desigualdade.”

“Educação não pode existir só em propaganda na TV”

Doutor Guilherme Lopes, 29 anos, Piripiri (PI)

“Rompemos
um ciclo escravagista”

Doutora Bárbara Carine, 33 anos, Salvador

“Fui o primeiro indígena brasileiro a ser doutor pela UFSC”

Doutor João Rivelino Rezende Barreto (Yúpuri), 40 anos, São Gabriel da Cachoeira (AM)

“Às vezes até eu me assusto com meu currículo”

Doutora Allyne Andrade e Silva, 35 anos, Rio de Janeiro

“O orgulho de ter uma filha trans doutora tem muito sentido”

Doutora Dani Balbi, 32 anos, Rio de Janeiro

“O curso de direito não é hereditário”

Doutor Jefferson Nascimento, 39 anos, São Paulo

“Fui o primeiro indígena brasileiro a ser doutor pela UFSC”

Doutor João Rivelino Rezende Barreto (Yúpuri), 40 anos, São Gabriel da Cachoeira (AM)

“Sou amazonense de São Gabriel da Cachoeira, onde mais de 97% da população é indígena, no noroeste da Amazônia. Faço parte da etnia Tukano, essa é a minha base cultural. Estamos presentes tanto no Brasil quanto na Colômbia, que fazemos fronteira, o que muitas vezes é uma linha invisível.

A minha aldeia é a São Domingos Sávio, no alto do rio Tiquié. Meu pai tem 80 anos e é vivo. A minha mãe faleceu nos anos 1990, quando eu tinha 11 anos, sem sabermos direito o diagnóstico dela, hoje penso que ela tinha câncer .

Cresci na aldeia, tendo contato com a escola no ensino regular. Aprendi a ler e a escrever em português. Naquele tempo não havia políticas públicas voltadas para educação indígena, com o tempo foram surgindo. Saí da aldeia sem visão projetada de futuro: não fui para a cidade estudar nem em busca de melhoria de vida. Fomos por causa da doença de minha mãe. Ela passava mais tempo em hospitais do que na aldeia, assim fomos passando a viver em locais fora da aldeia. Trabalhei no garimpo, como vaqueiro, cuidando de porcos. Fui me sustentando e sobrevivendo dentro daquilo que era possível.

João Rivelino tem doutorado pela Universidade Federal de Santa Catarina. Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoless

Éramos andarilhos, sem lugar fixo, em todos os locais por onde passávamos vivíamos de favor. Até que em certo momento eu me desvinculei da família porque queria continuar estudando. Tinha 18 anos e ia entrar no ensino médio. Meu pai estava retornando para a aldeia, e eu escolhi ficar na cidade para estudar.

Botei na minha mente que eu queria estudar e o que viesse como desafio eu iria enfrentar. A ponto de morar em casas de famílias que fui conhecendo, tendo só um espaço para dormir e alimentação, sem nunca desistir da escola. Em Santa Isabel de Rio Negro, eu ia para a escola remando. Enfrentava chuva, sol e fome, não tinha nem roupa adequada, mas esses desafios não me faziam ser um aluno desorganizado ou com notas ruins. Além disso tudo, enfrentava preconceito, mesmo no município com grande parte da população indígena.

Era 1995, naquela época, as pessoas negavam sua identidade na sala de aula. Quando eu me identificava como indígena, virava chacota. Isso me intimidava, deixava cada vez mais fechado a ponto de eu também querer negar a minha identidade.

Ele foi o primeiro indígena brasileiro a defender doutorado na UFSC. Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Surgiu então a possibilidade de eu entrar num seminário com católicos Salesianos e vir a Manaus, ser padre. Até ali não havia possibilidade de sonhar com uma faculdade. Os jovens como eu entravam no Exército ou num emprego na prefeitura. Eu quis ir para além disso. Entrei no seminário Salesiano pelo sentimento de que tinha vocação para seguir essa vida. Abracei como oportunidade, queria ser missionário.

Em 2003, cheguei a Manaus. Estudei filosofia e me formei na faculdade, em 2008, mas desisti da vida religiosa por motivos pessoais. No ano seguinte, 2009, entrei no mestrado em antropologia na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), com 28 anos. Ainda não havia políticas afirmativas na UFAM voltadas para indígenas no Departamento de Antropologia. Passei no processo regular e era o único indígena. Tive bolsa do CNPq.

Fui o primeiro antropólogo indígena formado naquele programa de mestrado. Sempre tive dificuldade, mesmo com a graduação e o mestrado, para ingressar no mercado de trabalho. Encontrei muitas barreiras, oportunidades não vinham e eu era sempre dispensado após a entrevista, mesmo tendo um bom currículo e qualificação.

A mente colonial das instituições públicas e privadas é muito forte ainda. Fui me virando como professor visitante no interior. Em 2012, apresentei a conclusão do mestrado.

Nesse meio tempo, me casei com a Jussara Barreto, uma não indígena filha de negro com branco. Sofri rejeição dentro da família dela que, mesmo sendo de Manaus, nunca tinha tido contato direto com a questão indígena. Hoje, as coisas já estão superadas e bem mais harmoniosas. Minha esposa foi fundamental nesse apoio à minha trajetória acadêmica, foi ela quem me deu suporte muitas vezes.

O pai de João viveu na Colômbia, foi seringueiro e coletor de folha de coca. Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Durante a vida acadêmica, tive dificuldade de adaptação ao método de ensino, às leituras intensas. Mas eu pensava: se eu conseguia estudar com fome, no ensino médio, fundamental e na faculdade, também ia conseguir superar aquilo. A minha vontade de estudar sempre foi maior que os desafios que eu vivenciava.

Eu não queria só contemplar as coisas, eu queria vivê-las, ter acesso a elas. Quando terminei o mestrado, tentei o doutorado duas vezes na UFAM, mas não consegui. Em 2013, fui convidado para um evento na Universidade Federal de Santa Catarina, sobre licenciatura indígena no Brasil. Meu orientador de mestrado me recomendou a uma professora de lá.

Nessa ocasião, recebi convite para trabalhar na licenciatura indígena na UFSC. Depois, passei a ser coordenador pedagógico. Até que em 2015 surgiu a possibilidade do doutorado, com a política afirmativa, e eu entrei. Eu já tive um pensamento equivocado sobre cotas, achava que não precisava daquilo. Tive que estudar para entender os dados históricos, há uma dívida social que gera essa desigualdade enorme entre os brasileiros.

Quando entrei na academia, tinha muito medo de sofrer preconceito, especialmente em Florianópolis, onde muita gente nem sabe da existência das aldeias indígenas perto da cidade. Minha esposa ia ao salão de beleza e dizia que o marido trabalhava na UFSC e logo perguntavam se eu era o porteiro. As mulheres brancas, loiras, de olhos azuis, ficavam confusas quando ela dizia que eu era docente, coordenador.

Dentro da UFSC não sofri discriminação no meu departamento, os movimentos negro e LGBT eram muito estruturados. Tive bolsa de estudos da Fundação de Amparo do Estado do Amazonas (Fapeam). Em 13 de junho de 2019, defendi a tese “ÚKŨSSE: forma de conhecimento Tukano via arte do diálogo Kumuãnica”. Fui o primeiro indigena brasileiro a defender doutorado na UFSC.

Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Por meio da etnografia em casa, me concentrei em três figuras detentoras de conhecimentos excepcionais: kumu (o pensador tukano), yai (o pajé), baya (o mestre de música). A ciência tem focado que o conhecimento é concentrado no pajé, porém, na minha pesquisa, identifiquei que o kumu e o baya detêm muito conhecimento, sendo o kumu o mais forte. Meu pai, Luciano Borges Barreto, que é kumu, foi muito importante nesse estudo.

Meu pai viveu na Colômbia, foi seringueiro, coletor de folha de coca e conta que foi sequestrado pelas Farc na juventude. Ele fala castelhano e 11 línguas indígenas. Yúpuri significa guardião das portas do universo. Nós dois temos o mesmo nome tradicional.

Ele é um dos grandes dominantes do xamanismo, do benzimento. Toda a minha pesquisa se baseia nele. Tudo o que sei, todo o conceito, aprendi com ele. É uma pessoa que não se expõe, que tem uma ética muito forte, vejo muito de Sócrates nele.

Meu pai costuma dizer: “Eu sei muita coisa, aprendi com meu pai, isso não me permite dizer que sou melhor que o outro. Mesmo que saiba de coisas quando escuto com o outro, devo ouvi-lo”. Ele compreende o conhecimento como um serviço. Ele tem orgulho de mim, mas sabe que ser doutor não faz ninguém superior.

Hoje, ele é professor na Faculdade Salesiana Dom Bosco, onde estudou filosofia. Crédito: Michell Melo/Especial Metrópoles

Estranham um indígena professor, como se não pudéssemos ensinar. Só nos veem nas ruas vendendo artesanato.

Após concluir o doutorado, voltamos para Manaus, nós estranhávamos o frio do Sul, sentíamos falta do peixe, da farinha, do calor. Estou construindo uma maloca na minha aldeia, depois de 20 anos começamos a retornar. Nas férias, quero que meus filhos, João Carlos, 12 anos, Juan Diego, 5, e Maria Kauani, 3, andem de canoa, nadem no rio, vejam como a farinha é feita.

Hoje, sou professor na Faculdade Salesiana Dom Bosco, onde estudei filosofia. Ensino filosofia, educação indígena e pedagogia. A próxima meta é passar no concurso de uma universidade pública.”

“Educação não pode existir só em propaganda na TV”

Doutor Guilherme Lopes, 29 anos, Piripiri (PI)

“Rompemos
um ciclo escravagista”

Doutora Bárbara Carine, 33 anos, Salvador

“Fui o primeiro indígena brasileiro a ser doutor pela UFSC”

Doutor João Rivelino Rezende Barreto (Yúpuri), 40 anos, São Gabriel da Cachoeira (AM)

“Às vezes, até eu me assusto com meu currículo”

Doutora Allyne Andrade e Silva, 35 anos, Rio de Janeiro

“O orgulho de ter uma filha trans doutora tem muito sentido”

Doutora Dani Balbi, 32 anos, Rio de Janeiro

“O curso de direito não é hereditário”

Doutor Jefferson Nascimento, 39 anos, São Paulo

“Rompemos um ciclo escravagista”

Doutora Bárbara Carine, 33 anos, Salvador

“Sou uma mulher negra de Salvador, nasci e cresci na favela Fazenda Grande do Retiro, onde a minha família reside, onde criei meus vínculos afetivos. Meu pai, Roque Neri Pinheiro, veio da Ilha de Itaparica, era um homem negro, não conheci avós paternos nem por foto. Por parte de mãe, minhas origens são o Quilombo Mocambo dos Negros, no interior da Bahia. Já adulta conheci a minha ancestralidade materna, quando fui ao quilombo.

Minha mãe, Terezinha Soares de Jesus, hoje tem 71 anos, veio para Salvador aos 9 anos para trabalhar como empregada doméstica. Aqui conheceu meu pai, que tinha outra família, o que era comum antigamente. Ele faleceu em 2017. Fomos criadas basicamente na presença da minha mãe. Cresci com a referência da figura feminina em um espaço central.

Na vizinhança do bairro, eu não tinha nenhuma referência de estudo. Mesmo assim, aos 11 anos eu já tinha vontade de ser doutora. Uma professora que tive na escola do bairro comentou que, se Deus ajudasse, eu faria mestrado e, se ajudasse demais, eu faria doutorado. Como botou Deus no meio, achei que ia dar muito dinheiro e ia salvar a minha vida.

Bárbara estudou no bairro mais negro da América Latina. Crédito: Arquivo Pessoal
A mãe da doutora sempre a incentivou a estudar. Crédito: Arquivo Pessoal

No ensino médio, tentei a prova do atual Instituto Federal da Bahia e não passei. Foi bem doído porque isso reforçou vários estigmas que as pessoas da própria favela diziam: que ninguém passava, que era impossível, era para pessoas geniais e eu não era genial. Fui estudar em um colégio estadual, na Liberdade, o bairro mais negro da América Latina na época. Era bem bacana a relação com o bairro. Eu quis fazer novamente a prova do instituto.

Aos 15 anos, tive um momento em que eu estava com três amigas quando percebi que gostaria de fazer algo diferente da minha vida. Perguntei o que elas queriam ser e elas responderam: motogirl, policial, cabeleireira. Não era o que eu desejava. Fiquei com vergonha de dizer que queria fazer faculdade.

Desde os 11 anos, Bárbara tinha vontade de ser doutora. Crédito: Arquivo Pessoal

As oportunidades de ascender no bairro eram ilícitas: tráfico, coisas que não eram vantajosas em longo prazo. Tinha também essa conversa de “você é bonita e pode arrumar um gringo”, a projeção social a partir do casamento. E, por fim, tinha o estudo.

Minha mãe fortalecia muito essa possibilidade. Ela sempre me incentivou muito a estudar. Dizia que eu não ia pegar em vassouras como ela. Rompeu um ciclo escravagista que se perpetuou por gerações. Minha bisavó foi escravizada; minha avó, lavadeira; e minha mãe, empregada doméstica. Essas histórias se perpetuam, se nada acontece.

A mãe de Bárbara, Terezinha Soares de Jesus, foi para Salvador aos 9 anos para trabalhar como empregada doméstica. Crédito: Arquivo Pessoal

Minha mãe rompeu com isso: “Você não vai nem aprender a cuidar de uma casa”. Ela foi tão genial que não me deixou nem aprender. “Vai estudar, todo tempo que tiver é para isso.”

O pessoal achava que eu era maluca por estudar duas horas por dia, fora da escola, o que para mim era muito suave. Para mim era como brincar, escovar os dentes, tirar duas horas do dia para estudar. Fiz a prova do Instituto Federal e passei na segunda tentativa. Lá, repeti o 1º ano do ensino médio, podia fazer nivelamento, mas nem passou pela minha cabeça. Eu queria aprender.

Quando passei no vestibular para química, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), minha mãe me abraçou e a gente chorou. Depois ela disse: você vai só, não temos condição. Todo dia era uma luta pela sobrevivência naquele espaço. Colegas me doaram jaleco, óculos de laboratório, coisas importantes para o curso, como uma calculadora científica.

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoless

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

O transporte de cada dia era o primeiro desafio. Na época da escola, quando não tinha dinheiro, eu voltava andando. Da faculdade para a minha casa, já eram mais de 20 km, o que me fazia entrar pelos fundos dos ônibus.

No segundo semestre, comecei a dar aulas e nunca parei. Minha atividade principal era o trabalho, sobreviver para me manter. As ações afirmativas não tinham ideia de políticas de permanência. Meus próprios colegas não conseguiam ter ideia do tamanho da minha luta. Hoje, quando lanço livros, eles compram. Alguns já vieram me pedir desculpas por coisas do passado. Com 19 para 20 anos ninguém tinha muita noção mesmo.

Eu era a única negra em um grupo de 40 pessoas. Havia muitas brincadeiras sobre cor, eu só tinha para oferecer um pouco de humor, piada de preto, favelado, músicas que tinham na época. Estavam sempre me colocando no meu lugar, no lugar menor. No decorrer da vida, a gente vai percebendo.

Bárbara é formada em química pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Na academia, tive dificuldades objetivas e não intelectuais. Tinha que estudar, mas o gás tinha acabado, a minha preocupação não era o relatório, era o gás. Quando olho para o retrovisor da história, vejo que o curso em si foi muito fácil. Diziam que estudar exatas ia ser difícil. Difícil era a vida. Um professor me emprestou o notebook para eu escrever a dissertação do mestrado. Eu andava com um pen-drive para todo lado, quando via um computador, sentava para escrever.

Descobri o que era racismo institucional: você luta para estar naquele espaço objetivamente, está o tempo todo tendo que dizer: eu não pareço com vocês mas esse espaço aqui também é meu.

Me formei na faculdade aos 23 anos. Fiz mestrado e doutorado em educação científica, no ensino de química.Tive bolsa por muito tempo da minha vida, de iniciação científica, no fim da graduação com o Pibic. Abandonei a bolsa quando passei em 2013 no concurso da UFBA e me tornei professora. Em 2014, defendi o doutorado.

Eu acabei sendo doutora com 27 anos pela UFBA. A mais jovem da minha universidade. Os colegas todos ainda estão buscando hoje mestrado, doutorado. Nada que tire o mérito da vida deles, mas eu reflito muito sobre a história, como a vida é. Me incomodava muito ser um ano mais velha nas turmas, por ter repetido um ano na escola.

Terezinha chorou quando a filha passou no vestibular. Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Em quatro anos fiz mestrado e doutorado. Foi um ano e meio de mestrado e dois e meio de doutorado. Não foi algo para tirar a diferença, foi só acontecendo. Não tinha consciência: eu vou ser doutora professora universitária. Era mais um pensamento tipo: nossa consegui terminar a graduação, tem uma seleção de mestrado, vou tentar. Poxa, terminei! Não me colocava como protagonista das minhas conquistas.

Quando eu estava no ensino médio, “mainha” também estava no ensino de jovens e adultos. Meu pai fez até o ensino médio, era genial e não teve chance de fazer faculdade. Ele entendia nitidamente o que era um doutorado. Para a minha mãe, eu me tornei doutora de beca na minha graduação.

O que diferencia a minha história da história dos meus pais foi ter tido comida na mesa, principalmente. Minha mãe aos 9 anos precisava trabalhar para poder viver. Trabalhou em regime praticamente escravo. Eu tive as condições básicas garantidas e o incentivo dos meus pais.

Em quatro anos, Bárbara fez mestrado e doutorado. Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

Preocupo-me com o que vai ser daqui para frente. Desde 2016, com os cortes em bolsas, em programas de acesso, acredito que estamos vendo mais um processo de exclusão de pessoas negras dos espaços acadêmicos. As políticas afirmativas são resultado de lutas seculares. É uma luta reparatória que não é permanente.

É preciso expandir as políticas de acesso e permanência, pensando não só na questão material, mas também na questão curricular, epistêmica, sair do lugar de uma academia que só vê gente branca, que se referencia no eurocentrismo. É preciso potencializar a intelectualidade negra, que nos humaniza.

O ser humano é pensar. Penso, logo existo. Há uma urgência em descolonizar a academia física e intelectualmente. Nossas vozes têm que se projetar para fora, tenho uma dificuldade muito grande de ser chamada de cientista e intelectual, em me reconhecer em um lugar de tanta ausência. Também por isso criei os projetos @descolonizando_saberes e a página @umaintelectualdiferentona.”

“Há uma urgência em descolonizar a academia física e intelectualmente”, acredita Bárbara. Crédito: Manuela Cavadas/Especial Metrópoles

“Educação não pode existir só em propaganda na TV”

Doutor Guilherme Lopes, 29 anos, Piripiri (PI)

“Rompemos
um ciclo escravagista”

Doutora Bárbara Carine, 33 anos, Salvador

“Fui o primeiro indígena brasileiro a ser doutor pela UFSC”

Doutor João Rivelino Rezende Barreto (Yúpuri), 40 anos, São Gabriel da Cachoeira (AM)

“Às vezes até eu me assusto com meu currículo”

Doutora Allyne Andrade e Silva, 35 anos, Rio de Janeiro

“O orgulho de ter uma filha trans doutora tem muito sentido”

Doutora Dani Balbi, 32 anos, Rio de Janeiro

“O curso de direito não é hereditário”

Doutor Jefferson Nascimento, 39 anos, São Paulo

“Às vezes até eu me assusto com meu currículo”

Doutora Allyne Andrade e Silva, 35 anos, Rio de Janeiro

“Sou de uma família negra de Realengo e meu pai, Jorge Andrade, trabalha desde os 8 anos de idade. Ele foi o primeiro na família dele, na década de 1970, a concluir um curso superior, em contabilidade, feito em faculdade particular. Começou com bolsa, trabalhou duro e foi porteiro na faculdade. Todas essas coisas que você faz quando é pobre e precisa estudar. O sonho dele era estudar física nuclear, mas não foi possível.

Minha mãe, Vera Andrade, fez ensino médio, era empregada doméstica desde os 12 anos, vendia bolo e doces, e acabou não conseguindo ir para a universidade na juventude. A gente era pobre, mas a nossa família apostava muito na educação, na cultura. Meu pai assinava jornais que vinham com livros, íamos ao cinema, teatro, museu. A gente não viajava, mas quando tinha uma exposição de arte, lá estávamos nós.

Na minha casa, havia essa preocupação de termos uma infância diferente, com estímulo intelectual. A família fazia silêncio para eu estudar, parece pouco, mas não é.

A família de Allyne fazia silêncio para ela estudar: “Parece pouco, mas não é”. Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Quando eu estava no ensino médio, minha família estava numa situação difícil, meu pai ficou desempregado. Eu achava que não ia conseguir passar no vestibular se não fizesse cursinho. Quando fiz a prova em 2003 estavam discutindo ações afirmativas.

Eu sempre estudei muito, sempre fui nerd. Uma tia, muito católica, comentou que tinha visto o frei Davi falando sobre pessoas pretas e pobres que queriam estudar. “Tem uns pretos aí brigando para entrar na universidade, você que gosta de estudar vai ver o que é isso.”

O frei Davi se acorrentava na Uerj pedindo cotas. A lei estava sendo questionada. Vi um recorte dele no jornal, depois no RJTV. Li matérias sobre cotas, as pessoas reclamando. Numa dessas chamadas, o frei Davi convocava estudantes negros e pobres para uma reunião geral. Eu fui à reunião em um domingo. Saí da igreja e fui. Encontrei 1.200 pessoas no Teatro João Caetano.

Era época de vestibular e eu estava muito desanimada, aquela crise na educação. Fiquei encantada com o que vi naquele domingo. Fiz ensino médio técnico, que levava quatro anos. Depois passei na Uerj com cotas. Fui aprovada e isso mudou a minha vida.

“Eu sempre estudei muito, sempre fui nerd”, conta Allyne. Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Era 2004, segundo ano de cotas no país. Só três faculdades tinham. Eu não tinha dinheiro para fazer todos os vestibulares, não achava que ia conseguir. E fui para a Uerj. Ao chegar lá, encontrei um ambiente hostil de muita disputa, colegas questionando ações afirmativas, os professores querendo saber de onde você veio.

Nesse processo, a Educafro foi muito importante, pois uniu estudantes. No fim de 2005, tinha eleição para o DCE, nos articulamos para formar o Denegrir – um coletivo de estudantes negros e negras. Resolvemos disputar os cargos representativos. Lutamos pela permanência na universidade, não tinha bolsa, alojamento, bandejão, não tinha nada.

Passei a ser professora de pré-vestibular comunitário e isso me permitiu participar de muitos movimentos, muitas conferências estaduais pela promoção da igualdade. Isso me formou muito politicamente, abriu a possibilidade de participar de debates da Lei de Cotas, que foi aprovada em 2012, mas começou como projeto de lei em 2006.

Todo mundo queria saber como era a experiência dos cotistas. Entre esses debates todos, em 2007, veio a criação de mestrados em direitos humanos oferecidos em cursos de direito pelo Brasil. Foram criados quatro no país, e botei na cabeça que se fizesse mestrado seria nessa área.

Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

Até ali eu queria ser diplomata, fiz um ano de intercâmbio no Japão graças ao professor Domingues, que me ofereceu uma bolsa. Eu fui a primeira da família a viajar para fora do país graças a esse intercâmbio. Voltei, me formei em 2009. No ano seguinte, fiquei tentando passar num concurso de diplomata. Fui bolsista do Rio Branco, mas percebi que não era o que queria.

Fiz a prova de mestrado da USP em 2012 e passei, com o apoio da professora Eunice Prudente, que era mais aberta para a pesquisa de raça no direito. Estudei na Uerj, mas não tinha nada sobre raça, não tinha um professor negro, e eu queria pesquisar a questão racial.

Concluí o mestrado em 2015, com objetivo de estruturar meu conhecimento. Achava que com isso cresceria no mercado, o que me daria mais possibilidade de inclusão, de melhorar a vida da minha família.

O pai de Allyne trabalha desde os 8 anos e o primeiro emprego da mãe como doméstica foi aos 12 anos. Crédito: Arquivo Pessoal

Apresentei o doutorado em 2019 também pela USP. O doutorado para mim era uma tarefa: eu estava diante de uma oportunidade que poucos que vieram de onde eu venho têm. Eu me orgulho principalmente de ter feito um trabalho que corrobora essa trajetória dos movimentos sociais. Escrevi sobre teoria crítica racial porque fazia sentido deixar esse legado.

Nossos passos vêm de longe e eu tenho orgulho de ter seguido esses passos em forma de um projeto pessoal e também de uma sementinha muito pequena que vou deixar em troca do muito que eu recebi nesta trajetória.

Em 2018, também ganhei uma bolsa de especialização em Teoria Crítica Racial, na Universidade da Califórnia, em Los Angeles. Foi como fazer outro mestrado no meio de um doutorado, sobre direito e relações raciais.

Fiz mestrado e doutorado trabalhando. A USP tem um programa com poucas bolsas e minha área não era prioritária. Eu vim para São Paulo com R$ 3 mil reais para ver o que ia acontecer. No primeiro ano, fui bolsista de estágio docente, fiz monitoria dando aula, fui monitora da FGV e comecei a trabalhar no terceiro setor.

Às vezes, até eu me assusto com meu currículo. Eu tinha certeza absoluta de que ia para a universidade, mas eu não tinha noção do que isso significava, de que barreiras estruturais eu venceria. Quando alguém lê o meu currículo em voz alta eu fico meio envergonhada. Que coisa louca! Foi muito dolorido todo esse processo.

Allyne é doutora pela USP: “Poucos que vieram de onde eu venho têm essa oportunidade”. Crédito: Arquivo Pessoal

Tive muitas crises, muitos momentos de me questionar, de pensar se daria conta, fiz vaquinha, por três anos juntei dinheiro do meu trabalho. Morei cinco anos no alojamento universitário, mas consegui chegar até o fim.

Em 2019, minha mãe entrou na faculdade e se formou aos 60 anos em gastronomia. Meus pais são muito orgulhosos, muito presentes, vieram na defesa do mestrado, do doutorado. Eles foram à minha formatura nos EUA, foi a primeira viagem internacional deles comigo. Os dois assistiram as seis horas da minha defesa de doutorado. Começou às 10h e foi até 17h.

Atualmente, sou professora universitária de políticas públicas no Insper, ainda há poucos professores negros, sou do Comitê de Diversidade e Inclusão de Docentes. Ando bem preocupada com a reformulação da política de cotas, porque ainda não deu tempo de mudar as estatísticas.

*Allyne Andrade e Silva é superintendente adjunta do Fundo Brasil de Direitos Humanos. É, ainda, autora do livro Direito e Políticas Públicas Quilombolas, publicado neste ano pela editora D’Plácido.

Atualmente, Allyne é professora universitária de políticas públicas no Insper. Crédito: Fábio Vieira/Metrópoles

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“Nasci no subúrbio do Rio, no entorno do Complexo do Alemão. Sou cria de mãe solo. Minha mãe, Vera Lúcia Cardoso Cristovão, 63 anos, nascida no Rio, é funcionária do corpo técnico de enfermagem da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Ela teve formação técnica. Talvez por isso tenha tido uma influência determinante para o meu estudo formal. Estudei em escola pública a vida toda desde o ensino fundamental. No ensino médio, fiz concurso para a escola técnica. Era boa aluna em matemática, mas queria fazer teatro. As habilidades matemáticas são mais valorizadas e fui pressionada a ir por esse caminho.

Fiz o concurso técnico para administração, com 15 anos. Consegui aprovação e fiz o curso técnico na rede Faetec. Comecei a me aproximar da militância política, da União da Juventude Socialista e do movimento que, na época, era GLS, há 17 anos. Lembro do primeiro dia de aula: era uma escola grande, longe do bairro, numa região central do Rio com muitos alunos, tudo muito novo para mim. Me senti mais livre.

Dani estudou em escola pública a vida toda. Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Já tinha consciência, mas não tinha clareza da minha disforia de gênero acentuada. Naquele espaço, consegui me afirmar como mulher trans, a escola tinha um ambiente oxigenado para os padrões daquele tempo. Então continuei sendo aluna interessada, mas contestadora.

Era época do governo Rosinha Garotinho, que tinha impacto na administração da escola. Cada vez mais me envolvi com movimento estudantil e política, me afirmando como mulher trans, mas sem modificações físicas de apresentação.

Concluí bem o ensino médio, fiz estágio. No terceiro ano, quando todos achavam que eu faria economia, optei por fazer cinema na Universidade Federal Fluminense, em Niterói. Queria ser escritora de dramaturgia. Aí passei na UFRJ para letras, entre os 10 primeiros colocados. E para jornalismo na Uerj fui aprovada na terceira reclassificação.

Não podia fazer nada que fosse muito arriscado porque nós éramos pobres. Fui para a faculdade de letras e me apaixonei pelo curso. Tinha muita dificuldade para pagar passagem. Saía da faculdade correndo para o estágio, no primeiro semestre. Era desafiador ter dinheiro para me locomover, tirar xerox, não sobrava nada.

Depois do primeiro semestre, não tinha mais o estágio, que era vinculado ao curso técnico. Acabou o dinheiro. A biblioteca da UFRJ é uma das maiores da América Latina. Eu via a indicação de livros dos professores e ia para a biblioteca. Acabava lendo o livro inteiro, não apenas um capítulo.

Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Sem romantizar a pobreza, a falta de recursos me compeliu a um convívio maior com a biblioteca. Quando era horário integral eu tinha duas opções: ou ficava sem almoçar ou dividia a marmita com minha mãe, que trabalhava no hospital da universidade.

Mesmo minha mãe estando há 30 anos dentro da universidade como funcionária, ela não tinha conhecimento pleno daquele lugar. A universidade não acolhe seus trabalhadores, é segregada, elitista. Com um ano de universidade, eu conhecia mais daquele lugar do que ela.

Foi muito importante na minha história ter formado um grupo de amigas na faculdade, que se aproximou por afinidades apesar dos diferentes backgrounds. Letras reúne gente muito diferente unida pela literatura. Essas amigas muitas vezes me deram dinheiro da passagem, pagaram meu almoço.

No fim do primeiro ano, fiz processos seletivos para bolsas de pesquisa e monitoria. Eu fui para a ciência da literatura, fui monitora de literatura comparada. Nessa época, organizamos uma chapa para disputar posições dentro da universidade, no CA e etc. Havia um projeto de expansão da universidade, batalha pelas ações afirmativas via reserva de vagas. Participei ativamente no âmbito da universidade, trabalhei do lado do Frei Davi. Conseguimos implementar um projeto de ações afirmativas na universidade.

Desde então, nunca deixei a atuação acadêmica. Hoje, com 32 anos, eu penso: como conseguia? Saía às 7h e voltava às 22h, ainda chegava em casa e estudava. Pessoas pobres, negras, que acessam a universidade têm esse peso de querer ter um desempenho acadêmico excepcional. Depois que a gente amadurece, sabe como isso se estrutura, há muitas questões simbólicas envolvidas mas também a forte necessidade material de continuar com a bolsa.

Sendo negra, trans, uma figura andrógina na universidade, apesar de me autodeterminar como mulher, passei por um processo de aceitação muito grande, sempre fui tratada no feminino. Não era 2021, mas a disposição no acolhimento era flagrante, a Faculdade de Letras talvez tenha me acostumado mal pra vida.

No fim de 2019, Dani terminou o doutorado e se tornou a primeira professora trans da UFRJ. Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Sempre fui uma aluna que participava ativamente dos laboratórios de pesquisa e iniciação científica. Me formei em 2011. Prestei concurso para o mestrado e passei em primeiro lugar, na área de ciência da literatura. Eu já tinha declarado a transexualidade para minha mãe, comecei a ser mais ousada na minha expressão de gênero. Foi nesse momento que precisei ir para o mercado de trabalho. Fui selecionada para vários projetos: decidi sair da casa da minha mãe e ir morar na Tijuca, ficar mais perto de onde trabalhava.

Dava aula em várias unidades de um colégio particular tradicional, era muito difícil tendo de escrever o mestrado. Era muito tenso chegar naquele espaço com um cabelo black, calça justa, gloss. Uma nota baixa que eu desse já poderia ser algo que um pai de aluno usaria contra mim: uma figura estranha, preta, travesti.

Acordava às 4h da manhã, dormia no ônibus. Ia até a madrugada estudando, por causa dessa obsessão, fruto do racismo e do machismo estrutural. Uma mulher trans tem sua produção intelectual sempre questionada, é sempre subalternizada, ridicularizada, precisa de esforços sobre-humanos para ocupar espaços mínimos de dignidade.

Com 22 anos, eu fui chefe de banca de redação do Enem. Isso me trazia respeito no mercado de trabalho. Terminei o mestrado em 2014, com 27 anos. Logo ingressei no doutorado. Eu estava com uma disforia muito grande, em processo de depressão. A estafa desses anos todos dando aula, participando de banca, completando um mestrado…

Minha orientadora insistiu para que eu fizesse um projeto sobre a estrutura da dramaturgia moderna e contemporânea no Brasil. Fui aprovada no fim de 2014 no doutorado, mas com uma autoestima muito baixa.

Iniciei o tratamento psicológico, começou, então, a hormonioterapia. Determinei que viveria exclusivamente da bolsa de doutorado. Tive que redimensionar minhas contas e ainda arcar com os hormônios e o processo transexualizador.

A mãe de Dani chorou no dia da defesa de tese de doutorado da filha: “Ela gosta mais dos diplomas do que eu”. Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

Com o tempo, voltei a frequentar a universidade pública com mais leveza, relembrei o gosto pela biblioteca, pelas políticas universitárias, palestras. Pude fazer o doutorado tranquilamente e foi quando decidi que faria cirurgia de redesignação, aos 27 anos.

Fiz uma vaquinha pública e meus alunos do Colégio de Aplicação da UFRJ ajudaram, o financiamento estourou. Em julho de 2016, fui operada. No fim de 2019, terminei o doutorado e me tornei a primeira professora trans na UFRJ. No meio disso tudo, a minha mãe temeu que eu largasse o doutorado. Ela achava que a transição ia afetar a recepção do meu trabalho na comunidade acadêmica. A minha orientadora apoiou publicamente e se aproximou da minha família.

A minha mãe viveu como trabalhadora naquela universidade onde teve amostras sombrias do poder soberano dos doutores, principalmente na universidade médica. De certa maneira, ter uma filha doutora e professora da UFRJ é motivo de muito orgulho. Hoje em dia, ela é mais militante que eu. Tomou a causa para si. O orgulho de ter uma filha trans doutora tem muito sentido.

Ela chorou muito no dia da minha defesa de tese. Ela gosta mais dos diplomas do que eu. Dei o diploma de bacharel para ela. Minha família toda é feita de mulheres que tiveram que se virar sozinhas, que foram abandonadas, elas todas foram à minha defesa do doutorado. Não tem nada que pague ver sua tia-avó chorando e dizendo: não entendi muito, mas você falou tão bonito.

Dani terminou o mestrado com 27 anos e logo ingressou no doutorado. Crédito: Aline Massuca/Metrópoles

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“O curso de direito não é hereditário”

Doutor Jefferson Nascimento, 39 anos, São Paulo

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“Nasci em São Paulo capital, na zona leste. Meus pais são paulistanos, moraram a vida toda ali. Minha mãe, Márcia Nascimento, 58 anos, tem ensino médio incompleto e é dona de casa. Meu pai, Wilson Nascimento, de 67 anos, trabalhou em padarias, foi engraxate e, nos anos 1970, virou uma grande chave na vida da minha família quando passou em um concurso público do Banco Central, mesmo sem ter ensino médio completo. Foi uma luz que acendeu e eu sou o fruto disso.

Naquele ambiente, meu pai, que vinha de uma família pobre, com nove irmãos, teve a percepção do que a educação poderia proporcionar. Meu pai hoje tem ensino médio, concluiu já adulto. Eles sempre foram muito incentivadores da educação.

Sempre estudei em escola pública na zona leste, na região da Penha. Fiz escola técnica depois do segundo grau, estudei processamento de dados. Logo comecei a trabalhar durante o colégio técnico, como programador, em 1998.

Fiz um ano de cursinho, após o colégio técnico. Passei na Fuvest em 2001 para cursar direito na Universidade de São Paulo (USP). Nessa época, o debate sobre cotas ainda não tinha sido posto. A presença de pessoas brancas era massiva, grande parte da turma já se conhecia dos colégios tradicionais de São Paulo. O curso de direito é um caso exemplar de manutenção de privilégios: a sala cheia de pessoas que vêm de famílias de advogados, os pais são juízes, há essa sensação de continuidade. Havia muitos alunos que os pais, e até os avós, se formaram naquela faculdade.

Meus colegas se dedicavam só à faculdade, tinham muitas oportunidades de fazer intercâmbio, iniciação científica, falavam vários idiomas. Estavam vivendo a faculdade em sua completude: indo para a Europa estudar, uma realidade na qual eu não me incluía. Hoje, isso mudou bastante com as ações afirmativas, houve uma mudança de perfil que é muito bem-vinda.

Eu não tenho nenhum parente advogado nem nada, nenhuma relação familiar com esse mundo. Em algum momento no vestibular me deu na telha de fazer direito: gosto de ler, de história. O curso foi uma descoberta, tive que descobrir como me encaixava naquele universo.

Achei incrível descobrir um mundo novo que o campo do direito possibilita. Me deu um estalo de que eu gostaria de aprender mais e estar do outro lado, o lado do potencial transformador. Pensando nas críticas da realidade, na faculdade de direito você vê que o próprio curso é uma forma de manter as coisas como estão, a ordem. Pessoas estão ali para ter as ferramentas que permitem que quem já tem muito tenha mais ainda, vão proteger os interesses de quem pode pagar.

É o direito como uma forma de manutenção do status quo, das coisas como estão. Eu pensava: não é isso! As coisas não estavam bem nos anos 2000 e não estão bem hoje. Eu quis fazer do direito essa ferramenta de transformação, ensinar que o direito tem potencial transformador. Há violações de direito a todo o momento.

Até o terceiro ano da faculdade, ainda trabalhei como programador, um campo que tem bons salários. No terceiro ano, comecei a estagiar e no período final da faculdade comecei a trabalhar no departamento jurídico da USP, que tem mais de 100 anos e oferece apoio à população que não tem condições de pagar por uma defesa.

Mesmo depois de formado em direito, ainda trabalhei com informática, até 2013, porque os salários eram melhores. Entrei no doutorado em 2012, na Faculdade de Direito da USP, na maior parte do tempo de formação, segui trabalhando em uma outra área.

Em 2013, virei a chave: passei a trabalhar na área de direito, com direitos humanos, em organizações do terceiro setor. Defendi o doutorado em maio de 2017. Foram cinco anos de doutorado, fazendo aulas à noite e trabalhando durante o dia. Conciliar o interesse acadêmico e pagar as contas ao mesmo tempo, sem bolsa, é ainda mais desafiador.

O que diferencia meu caminho da história dos meus pais é que eu tive acesso a essa visão da importância da educação, tive pais que entendem a educação como abertura de oportunidades. Na época deles, na década de 1980, faculdade não era uma coisa para todos, era muito direcionada para a elite. Era como se dissessem: não é o seu lugar. Eles tinham esse sentimento de possibilitar que os filhos usufruíssem de um mundo ao qual eles não tiveram acesso.

Acho que o momento mais importante para os meus pais foi quando entrei na faculdade, 20 anos atrás. É uma conquista familiar como um todo. O fato de ser uma universidade pública representa uma conquista enorme.

A carreira do direito é muito ligada à percepção do que representa ser advogado. Isso comunica muito. Minha avó materna falava com orgulho do neto ‘que agora é doutor’, no sentido de ser advogado. O doutorado foi uma continuidade desse processo e tudo que representava como o limite daquilo que o sistema possibilita. Desde os primeiros anos da faculdade, eu tinha esse interesse em dar aulas, estar na área acadêmica, então o doutorado me deu as ferramentas para atingir essa possibilidade de ensino.

Hoje também uso as redes sociais como portal para o diálogo, ainda tenho sentimento de que é ferramenta com grande potencial de aproximar as pessoas, dialogar, se você adota uma postura aberta. Quem tem interesse em dar aula tem responsabilidade em estar mais aberto ao diálogo, e as redes entram nesse formato.

Uso o Twitter como uma forma de divulgar informações, de possibilitar o acesso ao conhecimento. Por exemplo: leio o Diário Oficial da União, descubro coisas que estão acontecendo, mas nem sempre estão visíveis, para que as pessoas cobrem do Estado. Digo o que aquela portaria significa. É um grão de areia no debate público. Desejo que as pessoas tenham cidadania ampla, sejam atentas ao país, ao mundo e que se engajem, discutam e contribuam para que possamos acender uma luz.

*Jefferson Nascimento atua há mais de 10 anos na pesquisa e incidência em direitos humanos, com destaque para a utilização de sistemas internacionais de proteção. Atualmente, integra a equipe Oxfam Brasil. Antes trabalhou por sete anos na Conectas Direitos Humanos, atuando nos programas de política externa e de desenvolvimento e direitos socioambientais.

A mãe de Jefferson tem ensino médio incompleto e é dona de casa. O pai dele trabalhou em padarias, foi engraxate. Crédito: Arquivo Pessoal

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