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Lula coleciona gafes e falas polêmicas em seis meses de governo

Nesta semana, Lula disse que conceito de democracia é “relativo”. Presidente já deu declarações controversas envolvendo ditaduras e minorias

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Presidente Lula lê papel em cerimônia no Palácio do Planalto- Metrópoles
1 de 1 Presidente Lula lê papel em cerimônia no Palácio do Planalto- Metrópoles - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Completados seis meses desde que retornou ao comando do Palácio do Planalto para o seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) coleciona uma série de gafes e falas polêmicas sobre os mais variados assuntos. As declarações do mandatário vão desde comentários controversos sobre minorias e ditaturas a declarações que envolvem a política externa de outros países.

A mais recente delas ocorreu na última quinta-feira (29/6), quando, durante uma entrevista à Rádio Gaúcha, o petista foi questionado sobre o motivo pelo qual setores da esquerda defendem o governo da Venezuela. Na ocasião, Lula disse que o conceito de democracia é “relativo”.

“A Venezuela tem mais eleições do que o Brasil. O conceito de democracia é relativo para você e para mim”, afirmou o presidente.

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Apesar de o regime venezuelano realizar eleições, diversas organizações internacionais denunciam a violação de direitos humanos na gestão de Nicolás Maduro.

O Tribunal Penal Internacional de Haia, na Holanda, investiga o governo venezuelano por perseguir, prender e torturar milhares de opositores desde 2017. A Organização das Nações Unidas (ONU) se recusou a enviar observadores internacionais à eleição de Maduro, em 2018, após ele ter proibido os principais rivais de participarem do pleito. À época, a oposição denunciou fraudes e compras de votos.

A fala de Lula foi criticada até mesmo pelo entorno do presidente e gerou mal-estar na cúpula do governo. Segundo relatos colhidos pelo Metrópoles, ao mesmo tempo que aliados classificam a declaração do presidente como um “equívoco”, eles estudam formas de “blindar” Lula e evitar novas polêmicas.

Não é a primeira vez que Lula é criticado por falas sobre a Venezuela. Em maio, após recepcionar Maduro no Palácio do Planalto, o petista afagou o aliado político e afirmou que as acusações de que a Venezuela vive uma ditadura fazem parte de uma “narrativa”.

Na ocasião, a declaração gerou repercussão negativa, sobretudo de chefes de Estado que vieram ao Brasil a convite de Lula. Os presidentes do Chile, Gabriel Boric, e do Uruguai, Luis Lacalle Pou, por exemplo, discordaram do posicionamento do petista.

“Revolução” de 1964

Na mesma entrevista para a Rádio Gaúcha, Lula cometeu gafe ao se referir ao golpe militar de 1964 como uma “revolução”, termo comumente usado pelos militares para se referir ao início do período ditatorial no Brasil.

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Antecessor direto de Lula, Jair Bolsonaro (PL) foi criticado diversas vezes durante seu mandato por fazer declarações favoráveis ao golpe militar. O ex-presidente também já se referiu ao fato como uma “revolução”.

O golpe militar, iniciado em 1964, foi um movimento encabeçado pela alta patente das Forças Armadas e que depôs o governo João Goulart, na madrugada do dia 31 de março para o dia 1º de abril daquele ano.

Considerado um dos períodos mais obscuros da história, a ditadura militar durou 21 anos (de 1964 a 1985) e ficou marcada pelo cerceamento da liberdade e perseguição política que causou desaparecimento, tortura e assassinato de milhares de pessoas que se opuseram ao regime.

“Problemas de parafuso”

Em abril deste ano, Lula se viu envolvido em outro momento que causou polêmica. Durante evento para anunciar investimentos em segurança nas escolas após um ataque que matou crianças de uma creche em Blumenau (SC), o presidente disse que pessoas que sofrem de deficiência intelectual têm “problemas de desequilíbrio de parafuso”.

“A OMS [Organização Mundial da Saúde] sempre afirmou que, na humanidade, deve haver 15% de pessoas com algum problema de deficiência mental. Se esse número é verdadeiro, e você pega o Brasil com 220 milhões de habitantes, significa que temos quase 30 milhões de pessoas com problema de desequilíbrio de parafuso. Pode uma hora acontecer uma desgraça”, disse na ocasião.

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A fala teve repercussão negativa e foi criticada tanto por pessoas com deficiência quanto por profissionais que atuam em áreas voltadas a políticas de saúde mental. O apresentador Marcos Mion, que tem um filho autista, classificou a declaração de Lula como “absurda”.

“Irresponsavelmente, a fala dele liga deficientes intelectuais diretamente aos casos de violência que infelizmente temos visto acontecer. Isso é um absurdo, pois não há qualquer comprovação. Como pai de um autista, eu me sinto atingido”, disse Mignon.

Após críticas, Lula foi às redes sociais se desculpar pelo episódio. “Conversei e ouvi muitas pessoas nos últimos dias e não tenho vergonha de assumir que sigo aprendendo e buscando evoluir. […] Não devemos relacionar qualquer tipo de violência a pessoas com deficiência ou pessoas que tenham questões de saúde mental. Não vamos mais reproduzir esse estereótipo”, escreveu o presidente.

Escravidão vs miscigenação

Outro episódio polêmico ocorreu em março. Durante agenda em Roraima, Lula disse que a escravidão, apesar de terrível, trouxe “uma coisa boa” para o Brasil: a miscigenação.

“Toda desgraça que isso [escravidão] causou ao país causou uma coisa boa, que foi a mistura, a miscigenação da mistura entre indígenas, negros e europeus, que permitiu que nascesse essa gente bonita aqui, que gosta de música, que gosta de dança, que gosta de festa, que gosta de respeito, mas que gosta de trabalhar para sustentar a sua família e não viver de favor de quem quer que seja”, afirmou na ocasião.

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O episódio despertou críticas de ativistas, que defendem não haver saldo positivo da escravidão. Historiadores ressaltaram que a mestiçagem foi, muitas vezes, fruto de violência contra mulheres negras e indígenas, e que a ideia de elogiar a mistura de raças está ligada ao mito da democracia racial, que foi usado na história brasileira para negar a existência do racismo.

Na época, o Movimento Negro Unificado (MNU) declarou que “o presidente Luiz Inácio Lula da Silva relativizou a escravidão ao afirmar que, apesar de ter sido uma desgraça, teve uma consequência boa, a miscigenação”.

“Ao apontar nossos problemas de relações étnico-raciais e sobre a constituição de nossa identidade nacional, esqueceu-se de que a mestiçagem é fruto de um dispositivo de poder, e longe de criar a cordialidade, o gosto pela música, dança, festa, buscou tornar dóceis as etnias que estão na raiz de nossa nacionalidade, de modo a reforçar discriminações históricas”, declarou a entidade.

Para a socióloga Ana Maria Gusmão, as falas de Lula apresentam duas narrativas: uma que reforça estereótipos e outra que busca exaltar os povos minorizados.

“Tem um Lula antigo e desatualizado, e também tem um presidente que tenta atualizar o seu discurso. Há, muitas vezes, questões que são vistas como modo de falar da população brasileira, que ainda está muito introjetado nas pessoas e que precisa ser reformulado”, pontua a socióloga.

Após a polêmica, o Palácio do Planalto chegou a divulgar nota para dizer que a afirmação de Lula foi “distorcida”. “Distorcer essa afirmação é negar tudo que ele já falou sobre o legado de exclusão e de violência da escravidão na história do país e da necessidade de políticas públicas de reparação como reconhecimento de territórios quilombolas e cotas raciais realizadas em seus governos anteriores”, disse a Presidência à época.

Guerra na Ucrânia

Em abril, durante viagem à Europa, o presidente Lula acusou os Estados Unidos e a Europa de prolongarem a guerra na Ucrânia, que já dura mais de um ano. Tanto a Casa Branca quanto a União Europeia criticaram os comentários do brasileiro.

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Na época, um porta-voz do governo americano chegou a dizer que a posição brasileira “é profundamente problemática” e que o país estaria “papagueando propaganda russa e chinesa” sobre a guerra. A Europa também se manifestou e disse apenas que oferece “inúmeras possibilidades à Rússia de um acordo de negociação em termos civilizados”.

Dias depois, ainda na Europa, Lula tentou se corrigir e disse que o Brasil condena as ações da Rússia na Ucrânia. “Nunca igualei os dois países porque sei o que é invasão e integridade territorial. Todos nós achamos que a Rússia errou e já condenamos em todas as decisões da ONU”, afirmou.

Para Alexandre Paiva, pesquisador e especialista em Relações Internacionais, as falas de Lula carregam um peso político, mas acabam por ter, segundo ele, um “respaldo” se comparadas às declarações feitas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao longo de seu governo. Ele ressalta, porém, a necessidade de se estar atento a essas falas para evitar eventuais crises diplomáticas que podem ter impacto negativo para o Brasil.

“Pesa em favor do Lula o fato de ele ser visto internacionalmente como um político democrata. Então, apesar das falas sobre a Venezuela e a Ucrânia, por exemplo, serem polêmicas, elas têm um contraste com os quatro anos do governo Bolsonaro, quando diversas minorias e países eram atacados quase que diariamente”, pontua.

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