Goiânia – Um dos principais destinos de turistas apaixonados por atrações naturais no Brasil, o município de Alto Paraíso de Goiás, no nordeste do estado, está no centro da polêmica que põe em alerta toda a região da Chapada dos Veadeiros, onde está localizado. Moradores criticam minuta de projeto de lei de autoria da prefeitura local, que poderá intensificar ainda mais a expansão urbana desordenada na cidade.
O Metrópoles teve acesso à minuta do projeto de lei, com a logomarca da atual administração e o brasão da cidade, que foi entregue por moradores ao Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) para investigação. Pela proposta, o município pretende relaxar regras para autorizar parcelamento de solo em área rural com tamanho menor do que é permitido por lei.
Veja imagens de Alto Paraíso e da Chapada:

Portal de entrada de Alto ParaísoArquivo cedido ao Metrópoles/Prefeitura de Alto Paraíso

Cachoeira São Bento em Alto Paraíso de GoiásMárcio Cabral/Prefeitura Alto Paraíso

Chapada dos VeadeirosMelhores Destinos/Reprodução

Chapada dos Veadeiros tem no céu um dos encantamentosGiovanna Bembom/Metrópoles

Colorido do céu na Chapada (GO)Giovanna Bembom/Metrópoles

Vista do céu na Chapada dos VeadeirosGiovanna Bembom/Metrópoles

Céu da Chapada dos Veadeiros (GO)Vinicius Santa Rosa

Jardim de Maytrea em Alto Paraíso de GoiásRafael Oliveira/Prefeitura Alto Paraíso

Rua Principal da cidade de Alto Paraíso de Goiás, portal de entrada no Parque Nacional da ChapadaGiovanna Bembom/Metrópoles

Cidade é um das que mais atrai turistas para a região, devido à infraestrutura que construiu ao longo do tempo e, claro, os atrativos naturaisGiovanna Bembom/Metrópoles
Chapada dos Veadeiros vive colapso com boom de ocupações desordenadas
A população denuncia que, se a proposta seguir adiante, a nova lei beneficiaria o prefeito Marcus Rinco (União Brasil); a primeira-dama, Magda Rinco; e outras sete pessoas aliadas, entre elas o presidente da Câmara Municipal de Alto Paraíso de Goiás, Eliomar Siqueira (União Brasil). Eles negam, dizendo que não há previsão e nem garantia de a proposta ser encaminhada ao Legislativo.
O documento veio à tona exatamente no momento em que o município é alvo de investigação e fiscalização por concentrar 36 regiões com parcelamento irregular do solo, com construções ou cercamentos. No total, equivalem a 2.936 campos de futebol. A Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) divulgou o levantamento a pedido do Metrópoles.
“Glebinha”
A minuta do projeto de lei é do dia 19 de julho deste ano, quatro meses depois de o grupo comprar uma gleba na área rural equivalente a 6,7 campos de futebol. “Eu tenho uma glebinha”, afirma o prefeito. Ele diz, ainda, que está em andamento um estudo para saber o tamanho exato da área a ser expandida para a zona urbana.
O Metrópoles teve acesso à escritura do imóvel rural com 6,748 hectares registrado no nome do prefeito e de outros oito coproprietários. O grupo comprou a área em 2 de março deste ano. No documento, declarou que “a copropriedade não se destina à formação de núcleo habitacional em desacordo com a lei”.
No entanto, o tamanho do parcelamento do solo na área corre risco de ser alterado, se a proposta for aprovada pela Câmara de Vereadores e sancionada pelo prefeito. Hoje são autorizados módulos rurais com mínimo de 4 hectares no município. Cada cidade brasileira tem uma área mínima que a lei permite desmembrar fora do perímetro urbano.
“Condomínio urbanístico”
De acordo com a minuta, a Prefeitura de Alto Paraíso de Goiás pretende criar um tipo de modalidade de parcelamento do solo chamada de “Condomínio Urbanístico de Unidades com Gestão Autônoma”. Segundo moradores, a medida poderá intensificar o boom imobiliário na cidade, que tem 7,7 mil habitantes, e aumentar o desmatamento na região, que também tem sofrido com incêndios no lixão e em outras áreas próximas.
Veja fotos do incêndio no lixão e na Chapada:

Lixão de Alto Paraíso de Goiás é tomado pelo fogoFoto: reprodução/Instituto Biorregional Cerrado

Moradores tentam apagar incêndio em lixão de Alto Paraíso de Goiás, na Chapada dos VeadeirosFoto: reprodução/Instituto Biorregional Cerrado

Fumaça de lixo tóxico toma conta de Alto Paraíso de GoiásFoto: reprodução/Instituto Biorregional Cerrado

Fumaça de incêndio em lixão de Alto Paraíso de GoiásFoto: reprodução/Instituto Biorregional Cerrado

População está preocupada com incêndio em lixão de Alto Paraíso de GoiásFoto: reprodução/Instituto Biorregional Cerrado

Voluntário em atuação no combate a incêndio na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Equipes de bombeiros rumo a combate a incêndio na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Combate a incêndio na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Bombeiros atuam no combate ao fogo na Chapada dos VeadeirosDivulgação/CBMGO

Bombeiro atua no combate ao fogo na Chapada dos VeadeirosDivulgação/CBMGO

Brigadista voluntário atua no combate a fogo na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Bombeiros combatem a incêndio na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Aeronave lança água para combater incêndio na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Aeronave lança água para resfriar solo na Chapada dos Veadeiros em 2021Luís Muller/Material cedido ao Metrópoles

Força-tarefa inclui brigadistas voluntáriosArquivo Pessoal

Mais de 100 brigadistas voluntários ajudam no combate às chamas na Chapada dos Veadeiros, em GoiásAndré Dib/Rede Contra Fogo

Experiência e treinamentos aumentaram a capacidade dos voluntários de auxiliar no combate aos incêndiosArquivo Pessoal

Cena registrada durante combate a incêndio florestal na Chapada dos VeadeirosAndré Dib/Rede Contra Fogo

Os voluntários são pessoas que escolheram a chapada para morar e que construíram um laço afetivo com a regiãoAndré Dib/Rede Contra Fogo

Brigadistas voluntários na Chapada dos Veadeiros viram noites no combate às chamas para salvar o CerradoAndré Dib/Rede Contra Fogo

Com treinamento e equipamento adequados, eles conseguem agir com maior efetividadeAndré Dib/Rede Contra Fogo

Eles começaram de maneira improvisada, agindo no desespero para salvar a vegetação e sem equipamentos adequados. Hoje, situação já mudouAndré Dib/Rede Contra Fogo

Bombeiros e brigadistas voluntários passaram a noite tentando conter as chamas na Chapada dos Veadeiros, em São João D'Aliança, em julho deste anoAmilton Sá / Rede Contra Fogo

Divulgação/Semad
Se virar lei da forma como está, o texto permitirá “a divisão de gleba em unidades autônomas destinadas à edificação residencial, às quais correspondem ao desmembramento em matrículas individuais na fração ideal de cada unidade autônoma”. Na prática, o parcelamento do solo também beneficiaria a propriedade do grupo do prefeito.
“Batalha”
O político se defende. “Este modelo de projeto é com base em estudo que está no início, mas vazou e está acontecendo isso aí só porque tenho uma área rural. Como aparece o meu nome [na escritura], tudo vira um cavalo de batalha”, afirma. Ele diz que a proposta visa “tentar resolver toda a ocupação irregular que existe na zona rural de Alto Paraíso de Goiás”.
Uma moradora ligada a um conselho municipal rebate. “A grande maioria da área que está prevista na lei não tem ocupação ainda”, ressalta ela, que pediu para não ser identificada por medo de possíveis retaliações. “Em várias áreas tem a ocupação [em situação irregular], de fato, mas não com a densidade que se pretende aprovar com essa proposta”, acrescenta.
O presidente da Câmara de Municipal de Alto Paraíso de Goiás diz que não recebeu qualquer projeto relacionado à expansão urbana e, assim como o prefeito, nega qualquer tipo de interferência para benefício próprio. “Não haverá influência no projeto, caso chegue à câmara”, afirmou. Segundo ele, a proposta foi enviada a conselhos municipais para discussão.
“A qualquer custo”
A presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema), Melissa Viana diz que a área proposta para expansão urbana “é muito grande, quase o dobro da que existe no município hoje”. “A maior parte é de propriedade privada. Dentro dessas áreas tem ocupações de todos os tipos, como residência e áreas para plantio e criação de gado”, observa.
Melissa, que também é presidente da associação de moradores do Eldorado, maior bairro de Alto Paraíso, destaca que a articulação para expansão urbana desordenada “atende à especulação imobiliária”. “É obvio que a gente sabe que Alto Paraíso precisa crescer e se desenvolver, mas não sem planejamento, a qualquer custo”, ressalta ela.
O presidente do Conselho Municipal de Turismo (Comtur), Moisés Nunes Neto, diz que não quer se manifestar sobre o assunto. Ele é ex-secretário municipal de Turismo e conselheiro das agências de viagens e operadoras do setor na cidade.
O promotor de Justiça Rodrigo Marambaia confirma que recebeu a denúncia específica contra o grupo do prefeito. “O MP instaurou procedimento, requisitou cópia das matrículas e a gente está apurando a situação”, diz.