metropoles.com

Dillo solta acordes de guitarra para tirar Brasília do coma musical

Um dos mais destacados guitarristas do país, músico crítica a apatia roqueira da capital, amordaçada pela lei do silêncio

atualizado

Compartilhar notícia

Dillo
1 de 1 Dillo - Foto: null

Diego Baravelli/Divulgação

Dillo é um nome que sopra do Centro-Oeste para os cantos do mundo como um dos melhores guitarristas do Brasil. Cada vez mais o instrumento sagrado do rock tem sido a bússola para ele navegar entre os mares do blues, do rock e da MPB. É sobre essas matrizes que o roqueiro, despontado em Taguatinga, debruça-se para compor temas do próximo álbum 100% instrumental.

Estou me reaproximando do blues, mas será um disco de rock cheio de Brasil e de África na receita, no qual a guitarra é a protagonista do álbum

Dillo
Dillo está em fase de pré-produção do novo álbum e terá 12 temas. O desafio do compositor é fugir do estereótipo de que discos instrumentais trazem músicas feitas por músicos para músicos, cheios de “virtuoses e malabarismos”.

Quero ir na direção contraria. Fazer canções simples que tocam o coração em vez do cérebro

Dillo
Neste domingo (15.01), Dillo estará em companhia do mestre Tom Zé na primeira edição do ano de “Todos os Sons”, no Parque da Cidade, a partir das 17h. O Metrópoles aproveitou um intervalo de ensaios e conversou com Dillo, símbolo da resistência rocker de um DF cada vez mais “pop-nejo”.

Como é fazer rock em tempos de domínio do “pop-nejo”?

A atitude rocker está domesticada. O rótulo rock se tornou algo que as pessoas adquirem em shoppings, em sites, nos programas de calouros da tevê. A postura rock foi diluída em chazinhos aromáticos.

Hoje, vemos crianças na televisão cantando Led Zeppelin, uma banda que se recusou a fazer programas de tevê 

Rock é algo sobre postura e não sonoridade. Passar anos e anos tocando em pubs os hits do rock não é nada rock. É manutenção conservadora de um estado permanente de colonização cultural. Talvez me identifique como personagem da resistência apenas pela minha indisposição à domesticação. Minhas músicas trazem temas indigestos, com arranjos pouco ortodoxos… Sou um vira-lata livre.

E onde fica Brasília nessa apatia?

Brasília não é mais Brasília. Aquela cidade que experimentamos nos anos 1980 não existe mais. Foi implodida pela explosão demográfica. Hoje, Brasília é uma cidade do interior de Goiás, onde há uma parcela da população rica em dinheiro e miserável culturalmente.

Os brasilienses consomem e aplaudem a chacina das artes de um modo geral

O excesso de culto a Brasília, capital do rock, dos anos 1980 impede que a cidade olhe pra si e perceba a sua música do aqui e agora?
Acho que esse culto aos mitos mortos atrapalha. Renato Russo deve rolar no caixão quando vê esses abutres se arvorando de sua obra para proveito próprio e imediato.

Basta conhecer a obra de Renato Russo para saber que ele nunca aprovaria coisas como hologramas e tributos com ares de seita e morbidez


Agora que Móveis Coloniais de Acaju acabou alguma promessa testemunhada por você?

Temos uma cena muito boa nesse exato momento explodindo na nova música brasiliense: Muntchako, Almirante, Rios, Scalene, Trampa, Silhoueta, Distintos, Brow Ha, Galopardo, Komodo, Bilis Negra… Só pra citar alguns. Tem muita coisa nova sendo produzida, mas o brasiliense médio rejeita o que não aparece no “Big Brother”.

Recentemente, ouvi uma banda do Gama que gostei, Chama-se Ternuria na Lua. Esse período poderá ser lembrado no futuro como o fim da era Móveis, mas uma janela para o futuro está aberta. A cidade vai olhar para dentro de si em algum momento. As pessoas vão passar por uma experiência de despertar de uma consciência crítica e vocacional. Em alguns anos, o país vai entrar nos trilhos, a confiança vai voltar, e, então, começaremos a provar da tese de que o Brasil é o pais do futuro.

Depois de a música mais tocada de 2016 ser “Meu Pau Te Ama” (“Deu Onda”) acabou uma era. Foi o fim

Apito final, estamos começando um novo ciclo. Não tem como piorar o senso do gosto comum. Já deu. Agora é esperar a semente brotar desse enxofre para um novo girassol brilhar num futuro breve.

Taguatinga ainda é o porão do rock do DF?

A cena de bares e de bandas anda tão adormecida em todo o DF que o fato de Taguatinga ainda ter uns cinco bares que tocam música ao vivo a torna notável entre as demais cidades do DF.

Diego Baravelli/Divulgação

Não é que Taguatinga seja uma cidade pulsante, é que as outras estão em coma profundo

A lei do silencio ajudou a jogar uma pá de cal nesse grande campo da desesperança.

Como está a sua ponte-aérea Brasília-mundo?

Fiz alguns shows por países um tanto distantes há pouco tempo. Austrália e Inglaterra, por exemplo, são pernas longas partindo de Brasília. Com esse disco instrumental, que está na barriga, pretendo circular ainda mais, pois o idioma musical vale para todos do mundo.

Japoneses e canadenses sentem a música do mesmo jeito. Tomara que eu amplie esse rolê


É possível continuar prospectando a carreira no DF ou a pecha de artista local fecha caminhos?

Desde que comecei a circular, deixei de me sentir um artista de Taguatinga. Sinto que sou um agente do mundo, um cigano, um tipo de bandeirante da música. Circular é fundamental, se não coalha. Já diz o ditado, “pedra que não rola, cria musgo”. Tem que meter o pé.

E isso de que santo de casa não faz milagre é parte da cultura do brasiliense comum que não consome o produto interno artístico


Com quem e o que você está dialogando musicalmente? Agora, vi o clipe “Mamãe Mamãe“, uma delícia, Vejo elos com o pop do Pará…

Tenho gravado bastante coisa para cinema. Atualmente, estou trabalhando na música do longa metragem “Améns”, do Jota Procópio. Gravei recentemente com Frejat, com Curumim. Estou colaborando para o novo disco do Joao Donato com o filho dele o Donatinho. Isso de “Mamãe Mamãe” flertar com a música nova do Pará pode ser parte da influência de alguns amigos: Pio Lobato e Felix Robatto, por exemplo. Felipe Cordeiro também elogiou bastante o clipe de “Mamãe Mamãe”.

Sinto-me inserido nessa cena, onde estão também Lucas Santtana, Siba, Otto, só que buscando manter minha identidade e meu caminho

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?