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Monte Castelo: revisitando a ação da FEB na 2ª Guerra Mundial

Glorioso feito, que completa 75 anos, representa, até esta data, a mais expressiva vitória militar da história do Brasil

Autor Henrique Luduvice

atualizado

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Reprodução/Exército Brasileiro
monte castelo
1 de 1 monte castelo - Foto: Reprodução/Exército Brasileiro

Em 21 de fevereiro de 1945, portanto, há exatos 75 anos, a Força Expedicionária Brasileira (FEB), constituída pela 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (DIE), assumiu, após intensos combates contra contingentes do exército nazista alemão, o controle de Monte Castelo, na Itália, um relevante marco na ação dos países aliados na Segunda Guerra Mundial. Este glorioso feito representa, até esta data, a mais expressiva vitória militar da história do Brasil.

Registre-se que, conforme narrativas consideradas referenciais, nos dias subsequentes àquele triunfo, mais precisamente entre 23 e 25 do referido mês, a FEB alcançou êxito na disputa por La Serra. Em 5 de março, efetivou a ocupação de Castelnuevo. A ofensiva da primavera abrilhantou páginas daquela insigne campanha, destacando-se, entre outras, a conquista de Montese. Depois da descida dos Apeninos, vieram o sucesso em Collecchio, o cerco aos adversários e, posteriormente, a imposição de rendição incondicional à 232ª Divisão Alemã em Fornovo.

Destaque-se que as tropas brasileiras, compostas por mais de 25 mil homens e mulheres, detentores de inegáveis capacidades, tais como coragem e valentia, cruzaram o Atlântico nos navios americanos General Mann e General Meigs, dependendo das disponibilidades, com as escoltas adequadas.

A Força Aeroterrestre Brasileira realizou, em seu percurso, inúmeras proezas nas lutas pela libertação de vilas e cidades italianas que se encontravam sob domínio do exército de ocupação.

Ressalte-se, porém, que este artigo objetiva não apenas reconhecer as honrosas passagens de bravura da FEB, assim como as de comandantes e militares já merecidamente distinguidos ao longo dessas sete décadas e meia, por suas dignas participações naquele Teatro de Operações.

Pretende-se resgatar adicionalmente, por dever de justiça histórica, as egrégias atuações do Pelotão de Petrechos e do Pelotão de Fuzileiros, respectivamente comandados, à época, pelos tenentes Dulcelino Tavares e Fredímio Trotta, na véspera e na madrugada do dia 21 de fevereiro de 1945, dia do ataque final a Monte Castelo.

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Com o intuito de propiciar uma melhor compreensão, deve-se mencionar que os citados pelotões pertenciam à 2ª Companhia que, na ocasião, era liderada pelo capitão Edson Ramalho, e fazia parte do 1° Batalhão, dirigido pelo major Olívio Uzeda, que integrava o 1° Regimento de Infantaria, conhecido como Regimento Sampaio, comandado pelo coronel Caiado de Castro.

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No contexto em tela, exige-se retratar que ao aludido 1° Batalhão, conforme meticuloso relato escrito por um daqueles heróis de guerra, material que até esta data mantinha-se exclusivamente no âmbito da família, “cabia conquistar as alturas de Fornace e Cota 875, situados imediatamente a Oeste de Monte Castelo. Havia, até então, a previsão de que o ataque seria desencadeado ao amanhecer de 21 de fevereiro de 1945, mediante confirmação”.

Mudança de planos

Ocorreu, no entanto, que o tenente Dulcelino Tavares, de acordo com memórias esculpidas com o próprio punho, foi chamado ao telefone de campanha por volta de 21h do dia 20 de fevereiro de 1945 pelo capitão Edson Ramalho, comandante da 2ª Companhia. No diálogo, foi explicitado que “o Comandante do 1° Batalhão decidira iniciar a conquista do objetivo de ataque da 2ª Companhia – Fornace – à noite, de surpresa, precedendo o ataque geral de todo o regimento”.

Em seguida, houve a determinação de que “essa missão caberia a mim, para o que levaria a Seção de Metralhadoras do meu Pelotão de Petrechos Leves e um Pelotão de Fuzileiros. Como ainda não conhecia bem os comandantes de Pelotão e era eu o tenente que estava lá há mais tempo na companhia, mandou que eu indicasse o Pelotão de Fuzileiros. Surpreendeu-se quando indiquei o Pelotão do Trotta, uma vez que este acabara de assumir o comando e não conhecia profundamente seus comandados. Argumentei com entusiasmo, a coragem, o ardor combativo e o meu antigo relacionamento profissional com o Trotta, tendo o capitão concordado com minha convicção”. No telefonema, foi estabelecida mais uma recomendação: “Em caso de forte resistência, retornar à base de partida, para participar do ataque geral previsto para às 6h de 21 de fevereiro”.

Reprddução

 

De pronto, “reunimo-nos os dois tenentes e os sargentos dos dois pelotões e acertamos os detalhes da operação. Concluímos que deveríamos envidar todos os esforços no sentido de conquistar o objetivo à noite, uma vez que seria um grande sacrifício retornar à base de partida e iniciar o ataque geral ao amanhecer, com a tropa cansada. Conversamos com os nossos soldados e os estimulamos, ficando todos cientes da nossa missão e das condições de execução.”

A explanação de Tavares prossegue: “A distância a percorrer era cerca de 1.500 metros e eu conhecia bem o terreno, pois já estava na base de partida há dois dias e procurei assimilar os menores detalhes da nossa zona de ação. Partimos por volta das 23h, com um grupo de combate em 1º escalão e o restante em 2º. Os dois tenentes, Trotta e eu deslocamo-nos juntos, imediatamente atrás do 1° escalão, acompanhados dos nossos dois mensageiros, um com o rádio portátil transmissor e receptor e o outro desenrolando a bobina do fio telefônico, para comunicações com o Posto de Comando da Companhia”.

Em razão da dimensão deste texto, os próximos trechos, foram extraídos de forma sintética. “A progressão aconteceu, aproveitando as dobras do terreno e as próprias crateras feitas pelas explosões das granadas. O deslocamento de ar de uma delas arrancou o capacete do Trotta.” Muitos tiros ecoavam enquanto os pelotões avançavam na “terra de ninguém”, inclusive por parte das forças aliadas em “programa de preparação para o ataque matutino”.

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Surpresa

“Inesperadamente, um dos nossos soldados tropeçou em um fio esticado, ouviu-se forte estalido seguido de pequena explosão, que projetou uma espécie de foguete iluminando feericamente toda a área em que nos encontrávamos. Tratava-se de um dispositivo de alerta instalado pelo inimigo, que lhe permitia uma ótima visibilidade e, em consequência, a execução de tiros ajustados de metralhadoras. Tratamos todos de nos abrigar, deitados, aguardando a cessação do efeito iluminativo. Para feliz surpresa nossa, o inimigo não atirou sobre nós, significando que fora totalmente surpreendido, já a cerca de 100 metros da linha de crista onde estavam suas posições.”

A descrição minuciosa do tenente e concatenada do processo de ascensão ao alvo permite internalizar as situações de risco e tensão a que estavam submetidos os componentes daquelas unidades, colocadas, antecipada e estrategicamente, na linha de frente das ações. A narrativa segue:

“O dispositivo luminoso, se, de um lado, revelou ao inimigo a nossa presença, de outro, permitiu que descortinássemos o nosso objetivo, facilitando o rápido prosseguimento sobre ele. Rastejando, aproximamo-nos da crista e percebemos movimentos e vozes de soldados inimigos que, no entanto, não atiraram sobre nós. Como não os víamos, tivemos o ímpeto de lançar granadas de mão em sua direção, mas nos controlamos e não o fizemos, uma vez que isso poderia dificultar a nossa missão, conquistar Fornace. Ante a total surpresa, abandonaram as posições e desceram a contra-encosta na direção norte. Chegamos ao nosso objetivo e instalamos a nossa tropa em dispositivo defensivo quase que circular. Os alemães naturalmente se apavoraram quando verificaram, por ocasião do dispositivo luminoso, cerca de 50 soldados se aproximando de Fornace.”

“Entramos em uma casa semidestruída que havia na localidade, instalamos o telefone na ponta dos fios que estendemos ao longo do trajeto e nos comunicamos com o nosso capitão, que aguardava aflito nossas informações. Dissemos-lhes que Fornace estava em nossas mãos, tendo o inimigo abandonado apressadamente suas posições; que aguardávamos ansiosamente a vinda do restante da companhia, pois temíamos contra-ataque alemão.”

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Exaustos, mas atentos

A realidade fática, mais uma vez, impunha-se ante àqueles combatentes. “Eram cerca de 3h de 21 de fevereiro e estávamos exaustos. O inimigo reagiu com tiros de morteiro sobre as posições que abandonaram, aparentando preparativos de contra-ataque”.

“O capitão, com o restante da 2ª Companhia, chegou a Fornace antes do amanhecer, de modo que quando o ataque geral teve início, às 6h, já estávamos de posse de Fornace, no flanco Oeste de Monte Castelo, apoiando a ação de outras companhias.”

“A operação sobre Fornace foi um êxito completo e de grande significado no conjunto geral do ataque a Castelo. Tivemos muita sorte, mas também controle e determinação, uma vez que, não tendo cessado os tiros que caiam em área, fomos autorizados, a nosso critério, a voltar para a base de partida, e não o fizemos. Além disso, apreendemos em Fornace materiais e armamentos, inclusive duas metralhadoras e um morteiro.”

Prosseguiu-se o ataque geral. Por volta das 18h, Monte Castelo já estava ocupado pelos 1° e 3° Batalhões do Regimento Sampaio. Caíra, assim, aquela fortaleza alemã nas mãos dos nossos soldados, para glória do Exército Brasileiro, que em ataques anteriores sofrera alguns revezes.

 

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A conquista de Fornace mereceu as maiores referências elogiosas de autoridades de diversos níveis. Os tenentes Dulcelino Tavares e Fredímio Trotta foram elogiados em Boletim pelo Comandante do 1º Batalhão. Receberam importante Citação de Combate, assinada pelo general Mascarenhas de Morais, comandante da Força Expedicionária Brasileira na Itália. Foram, ainda, condecorados com a Cruz de Combate de 1ª Classe, medalha destinada a premiar ações meritórias individuais em combates.

Além disso, comprovadamente no caso do tenente Dulcelino Tavares, o comandante da FEB enviou ofício com cópia da Citação de Combate ao prefeito da cidade de Propriá, onde ele nasceu, localizada em Sergipe, solicitando ampla divulgação na comunidade. O reconhecido jornalista Joel Silveira, correspondente de guerra junto à Força Expedicionária Brasileira, os citou com destaque algumas vezes, inclusive na edição comemorativa da Revista do Clube Militar de março/abril de 1975, comemorativa do 30º aniversário da FEB.

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Finalizando, consolida-se, com a exposição acima, este inédito registro histórico, que igualmente reconhece os tenentes Dulcelino Tavares e Fredímio Trotta, juntamente com cada um dos heroicos integrantes do Pelotão de Petrechos e do Pelotão de Fuzileiros, ambos pertencentes à 2ª Companhia do 1º Batalhão do 1º Regimento de Infantaria da Força Expedicionária Brasileira, por suas notáveis participações na Tomada de Monte Castelo, bem como na Segunda Guerra Mundial, contra o nazismo e em defesa da liberdade.

(*) Henrique Luduvice é engenheiro civil, ex-presidente do Crea/DF e do Confea. Sobrinho do Herói de Guerra Dulcelino Tavares.

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