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Quando a literatura e o esporte se encontram o resultado pode ser bom

As imagens do rato de academia musculoso e ignorante e do CDF de óculos e raquítico ou gordinho são a expressão mais bem acabada de um preconceito que precisa ser quebrado

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Há um preconceito mútuo entre amantes da literatura e amantes de atividade física. Parece que leitores não podem ser ativos fisicamente e atletas não podem ser letrados. As imagens do rato de academia musculoso e ignorante e do CDF de óculos e raquítico ou gordinho são a expressão mais bem acabada desse preconceito.

Na Grécia Antiga, entretanto, esse distanciamento não existia. Não fazia sentido, aliás, já que o corpo sadio e a mente sã – e ativa – eram duas faces da mesma moeda. Mente sã em corpo são, ou “Mens Sana in Corpore Sano”, ou ainda “Anima Sana In Corpore Sano”, cujo acrônimo “Asics” dá nome à famosa marca de material esportivo, era uma ideia corrente – apesar de a expressão ter aparecido formalmente, e em outro contexto, no texto do poeta romano Juvenal.

Como no mundo moderno, porém, o que não faltam são preconceitos, o tema de hoje dessa coluna são livros que cruzam a fronteira entre esses dois campos: a literatura e o esporte, ou a atividade física.

Claro que os dramas psicológicos, políticos e sociais são temas mais propícios à literatura, já que têm uma carga simbólica mais pesada e apresentam mais conflitos, mas é possível juntar os dois mundos, especialmente a partir de boas histórias dentro do contexto esportivo

Obviamente existe uma profusão de produção literária sobre esporte, como livros técnicos “Veneno Remédio”, de José Miguel Wisnick, Cia das Letras, 2008 – um tratado sobre o papel do futebol na sociedade brasileira); biografias (“Estrela Solitária – Um Brasileiro chamado Garrincha”, de Ruy Castro, Cia das Letras, 1995); e autoajuda (“A Semente da Vitória”, de Nuno Cobra, Ed Senac, 2001), mas gostaria de abordar a ficção, as crônicas, os contos e os romances.

Começo com o livro-reportagem “La Doce – A história da torcida organizada mais temida do mundo”, de Gustavo Grabia (Panda Books, 2012). O título faz referência à torcida uniformizada do time Boca Juniors, da Argentina. Doce, em espanhol significa “12” e se refere ao que seria um décimo segundo jogador, além dos onze em campo, ideia que também deu origem à tradicional torcida corintiana “Camisa 12”.

Em “La Doce”, Grabia relata a violência que dominava, desde a década de 1960, as arquibancadas do estádio La Bombonera e se estendia para toda “La Boca”, o bairro onde fica o estádio, em Buenos Aires, sob domínio dos chefes da organizada. O poder da facção ultrapassava os limites do bairro e atingia autoridades do próprio governo argentino. Nem a máfia italiana esteve fora desse emaranhado. Eletrizante.

Em ambiente menos hostil, porém, em inglês, já que ainda não saiu a tradução, vale citar “Iron War – the Greatest Race ever Run”, em tradução livre: “A Guerra do Hawai – a mais fantástica corrida já disputada”, do jornalista Matt Fitzgerald (VeloPress, 2011). O livro conta toda a história, começando na infância de seus protagonistas e acompanhando-os até os dias atuais, do Campeonato Mundial de Ironman de 1989, quando Dave Scott e Mark Allen correram juntos, disputando palmo a palmo, por mais de oito horas, para completar a prova de triathlon (natação, seguida de ciclismo e uma maratona).

Para se ter uma ideia do nível dessa disputa, de lá para cá, depois de 27 anos depois, no mesmo local, o tempo em que os dois completaram a prova só foi batido por cinco ou seis outros atletas, mesmo considerando todo o desenvolvimento tecnológico, desde então, especialmente em relação às bicicletas.

Todos que testemunharam classificam como “insano” o ritmo que empregaram por longas oito horas. Um era o rei do Ironman, o outro era o príncipe. A prova de 1989 foi a transmissão da coroa. Não sem dor. Mesmo para quem não pratica esporte, vale a pena.

Mais leve, é o livro “Correria – Histórias do Universo da Corrida” (Ed. Arquipélago, 2016), do jornalista Sérgio Xavier Ferro, ex-editor das revistas Placar e Runner’s World, e atualmente na SporTV. Não é o primeiro livro dele sobre o mundo esportivo. Seu primeiro livro – “2:43:50 – Operação Portuga, cinco homens e um recorde a ser batido” – é sobre um grupo de amigos que se une em torno da superação de uma marca.

“Correria” é uma compilação de crônicas deliciosas sobre as corridas. Em vários contextos. Curtas e bem alocadas no mundo contemporâneo. É divertimento certo, mesmo para quem está dando suas primeiras passadas. As histórias sobre a logística e a camaradagem nas ultramaratonas (provas acima de 50km) são impagáveis e emocionantes. Não é auto-ajuda – de longe – mas dá um ânimo.

Em Brasília também temos nossos exemplos de diálogo entre a literatura e o esporte. O servidor do Senado José Mendonça de Araújo Filho, que também é mergulhador profissional, acabou de lançar “O Segredo que Mudou nossas vidas”, um romance ambientado no mundo do mergulho. Profundo conhecedor do tema – viajou pelo mundo todo e participou de quebras de recorde na modalidade – o autor trabalha com os elementos que conferem grande credibilidade à obra. As descrições das viagens, dos apetrechos e das nuances desse mundo são mais do que convincentes.

A narrativa é bastante dinâmica e grande parte do livro assume a forma de diálogos, o que o coloca em posição bastante privilegiada para virar obra de audiovisual. A diagramação faz uma brincadeira com o formato do livro, com a leitura na horizontal, que simula uma relação entre o céu e o mar. A primeira edição, bancada pelo próprio autor, já está quase esgotada. Muita gente já descobriu o segredo do livro. Além de uma nova edição, o autor trabalha num segundo título.

Também de Brasília é o livro “Quase Pisei”, de Roberto Klotz (Edição do autor, 2009), com crônicas sobre as caminhadas pelas superquadras brasilienses, mas também pelo exterior. Nesse caso, a atividade física é apenas pretexto para boas histórias. Um ótimo pretexto, aliás. É recorrente nas crônicas de Klotz uma pitada de sarcasmo no final. A cereja do bolo.

Agenda

– 20/9, terça, a partir das 19h, no Café Objeto Encontrado (102 Norte), lançamento do livro de poemas “Terminal”, do colunista aqui.

– 22/9, quinta, a partir das 18h, no Beirute da Asa Sul (109 Sul), lançamento do livro de poemas “Agrestina”, de José Sóter

– 24/9, sábado, a partir das 15h, na Livraria Cultura, no Shopping Casa Park, lançamento do romance “Um Anjo na Terra”, de Luana Barros.

Dedilhando Couro

dedilho poemas curtos

pra que se me distraia

o pensamento

atento em ti

enquanto termino

meu doutorado

sobre esse amor caído

(do céu)

a poesia me afina

me ensina as coisas certas

me lubrifica as dobras das portas

que se pedem pra ti abertas

ainda não sei se quero

todo esse esmero nascente

mas acho que bem me entendes

preto no branco… é pela pele

Melissa Mundim (na Antologia Poesia Nua)

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