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Lêda Watson abre os ateliês dos amigos e faz um painel da arte brasiliense dos anos 1970 e 1980

Em cartaz na Caixa Cultural a partir de quarta-feira (25/11), panorama afetivo e histórico traz artistas seminais com Glênio Bianchetti, Milton Ribeiro e Milan Dusek

atualizado

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Sergio Almeida/Divulgação
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Lêda Watson vive e trabalha em Brasília desde 1973. Mais do que desenvolver uma notável e prolífica obra como gravadora, ao longo desse tempo, ela vem prestando uma grande contribuição às artes brasilienses ao manter turmas frequentes e sucessivas de aprendizes em seu ateliê.

Agora esse envolvimento didático e emotivo com a arte, tão caro à artista-professora, escapa de sua casa-ateliê no Lago Sul e abraça pessoas para além de seu grupo de alunos e amigos. A partir de quarta-feira (25/11), ela leva à Galeria Principal da Caixa Cultural a mostra “Brasília 12 Ateliês”, que ali fica em cartaz até 17 de janeiro.

Com a ajuda do curador Newton Scheufler, Lêda Watson traça um painel afetivo e histórico da arte feita em Brasília nas décadas de 1970 e 1980. Como o nome da exposição dá conta, trata-se de uma coletiva reunindo uma dúzia de importantes artistas desse período.

Temporada efervescente
“Foi um momento de efervescência nas artes plásticas de Brasília, do final dos anos 1970 ao final dos anos 1980. As coisas aconteciam, as pessoas trabalhavam muito, expunham muito”, lembra Lêda Watson. “Tendo vivido esse momento, estou sempre atenta aos movimentos que se seguiram. Houve uma época em que não havia nada acontecendo na cidade, hoje tem grupos fortes fazendo arte contemporânea. E o que me motivou a esse projeto foi justamente perceber o desconhecimento quase total, entre a juventude, entre os que fazem arte hoje, do que veio antes deles.”

Essa noção lhe ocorreu quando Lêda levou seu grupo de alunos para conhecer o ateliê caseiro de Lourenço de Bem no Lago Norte, um espaço notório por ser aberto para jovens e para aprendizes. Logo ela percebeu que muitos de sua turma ainda não estavam familiarizados com a obra de Lourenço. Então, na sequência, eles saíram visitando outros ateliês. Mestres como Glênio Bianchetti, Milton Ribeiro e Milan Dusek (foto ao alto desta página) abriram suas portas. No caso de Omar Franco, eles foram até a metalurgia de Taguatinga onde ele esculpe suas peças de metal.

Lêda Watson e seu grupo de aprendizes em visita ao ateliê de Milton Ribeiro
Lêda Watson e seu grupo de aprendizes em visita ao ateliê de Milton Ribeiro *Sergio Almeida/Divulgação*

 

Café e pão de queijo
Assim Lêda e seus alunos passaram pelos ateliês desses 12 artistas agora reunidos na Caixa Cultural. A saber… Glênio Biachetti, Milton Ribeiro, Milan Dusek, Luiz Costa, Ricardo Stumm, Darlan Rosa, Marlene Godoy, Lelo, Toninho de Souza, Betty Bettiol, Omar Franco e, claro, a própria Lêda.

Coube a Newton Scheufler, aluno de Lêda e curador desta exposição, selecionar três trabalhos representativos de cada um dos artistas escolhidos ao longo desses mais de três anos de visitas. Professor de Comunicação da Universidade Católica e artista plástico, Newton também assumiu o trabalho de escrever e editar o catálogo de “Brasília 12 Ateliês”.

“Entrei como bicão”, brinca Newton. “Eu já tinha aulas com Lêda e conhecia alguns desses artistas. Quem não conhece o Glênio Bianchetti? Mas eu não os conhecia pessoalmente, eu estava dando aulas na Católica e não frequentava o mundo das artes plásticas. Comecei a ir a esses encontros nas tardes de quarta-feira porque eram super agradáveis. Conversas descontraídas, com café e pão de queijo. Só depois virou trabalho para mim.”

As conversas foram registradas em vídeo. Além desta mostra na Caixa Cultural e de seu catálogo, os planos de Newton e Lêda envolvem também a produção de um documentário e de um livro. ainda sem datas, prazos ou orçamentos.

A pedido do Metrópoles, Lêda Watson comenta um pouco sobre suas relações pessoais com cinco artistas desta exibição…

"Banco com Vaso" (1991): acrílico sobre tela de Glênio Bianchetti *Reprodução*
“Banco com Vaso” (1991): acrílica sobre tela de Glênio Bianchetti *Reprodução*

 

Glênio Bianchetti (1928-2014)
Gaúcho de Bagé, Glênio Bianchetti conviveu com os conterrâneos Glauco Rodrigues e Danúbio Gonçalves em sua juventude, antes de ter aulas com Iberê Camargo. Convidado por Darcy Ribeiro, veio para Brasília ser professor da UnB em 1962. Logo a intervenção militar poria fim a esse momento, mas Bianchetti ficou por aqui, tornando-se farol para ao menos um par de gerações de artistas brasilienses. E aqui deixou filhos e netos. Nesta mostra, está representado por três pinturas de diferentes décadas.

Glênio por Lêda: “Ele era adorável, não? Fomos amigos a vida inteira. Já nem me lembro exatamente quando nos conhecemos. Foi logo no meu início, quando cheguei aqui em 1973. Ele frequentava muito as mostras de arte e eu sempre ia ao ateliê dele no fim do ano, quando ele fazia aquela exposição anual de dezembro. Todo mundo ia para lá. Fiquei muito amiga dele, da mulher dele e das meninas. Uma das filhas dele trabalhou comigo no Museu de Arte de Brasília. Houve laços de artistas e houve laços afetivos muito grandes. Nunca participamos de aulas juntos, mas ele, Athos Bulcão e Rubem Valentim eram os primeiros a aparecer aqui em casa nas minhas festas de aniversário, todo 3 de janeiro”.

"Pequeno Arquiteto com Circo, n 2" (1986): óleo sobre tela de Milton Ribeiro *Reprodução*
“Pequeno Arquiteto com Circo, n 2” (1986): óleo sobre tela de Milton Ribeiro *Reprodução*

 

Milton Ribeiro (1922-2013)
Assaz simbólico, o carioca Milton Ribeiro nasceu exatinho durante a Semana de Arte Moderna de 1922. Formado pela Escola Nacional de Belas Artes, no Rio, viajou para Paris ainda jovem, onde frequentou o ateliê de André Lhote. Vivendo em Brasília desde a década de 1960, também a convite de Darcy Ribeiro, Milton foi pioneiro ao levar a capital federal para dentro de sua arte. Além de uma panorâmica da orla do Lago Paranoá, teve como tema as construções monumentais e os barracos dos candangos. Para esta mostra, entram três óleos da série “O Pequeno Arquiteto”.

Milton por Lêda: “Fomos muitos próximos, mas nossa relação de certa forma é ainda anterior do que eu poderia imaginar. Meu tio, Quirino Campofiorito, era professor de arte decorativa da Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Minha mãe era aluna dele e Beatriz, que seria mulher do Milton, também estava na turma. Então quando fomos visitar o ateliê do Milton, a Beatriz me disse que se lembrava de mim daquela época. Uma vez minha mãe apareceu comigo no meio de uma aula. Eu tinha 9 anos e ela não tinha com quem me deixar. Beatriz se lembrava desse episódio como se fosse recente”.

"A Máscara" (2001): água-forte de Milan Dusek *Reprodução*
“A Máscara” (2001): água-forte de Milan Dusek *Reprodução*

 

Milan Dusek
Ainda adolescente, Milan Dusek chegou ao Rio de Janeiro. Sua família escapara de Praga às pressas pois naquele ano de 1939, a Segunda Guerra já estourava. Tornou-se artista ao frequentar o escultor polonês August Zamoyski e o pintor tcheco Iam Zack no Rio. Quando veio para Brasília, em 1978, trabalhou na Embaixada dos Estados Unidos. Mais tarde, se desligou de lá e pôde se dedicar integralmente ao trabalho como artista e como professor de arte. Três gravuras em água-forte fazem parte desta mostra.

Milan segundo Lêda: “Ele trouxe um mundo inteiro para Brasília. Sua gravura é de excepcional qualidade, pois ele é herdeiro dos mestres europeus da gravura com metal. Em seu ateliê, no Lago Norte, Milan recebia turmas para aulas de desenho e também de escultura. Ele também tinha um trabalho sério como pesquisador e criou um material muito próprio, uma espécie de argila que não precisa ir ao fogo. Durante o final dos anos 1970 e todos os anos 1980, nós tínhamos contato frequente. Muitos alunos dele foram alunos meus também, e inclusive ele chegou a dar aula de desenho com modelos humanos no meu ateliê”.

"Placa Maciça" (2012): encáustica de Marlene Godoy *Reprodução*
“Placa Maciça” (2012): encáustica de Marlene Godoy *Reprodução*

 

Marlene Godoy
A mineira Marlene Godoy notabilizou-se na cena brasiliense dos anos 1970 por se dedicar ao ensino da encáustica, uma técnica de gravura tão ancestral quanto difícil. Mas a artista também desenvolve trabalhos como pintora e desenhista, indo do figurativismo à abstração, do retrato ao mural, com frequência de temas religiosos e políticos. Estudou em Berlim, na Academia de Belas Artes, com Hann Trier. Participa desta mostra com três encáusticas da série “Placa Maciça”, de 2012.

Marlene por Lêda: “Ela desenvolveu uma técnica de encáustica para seu trabalho pessoal e teve o desprendimento de ensiná-la para muita, muita gente. Essa doação generosa de uma artista, eu valorizo demais. Tivemos um episódio difícil, no início dos anos 1980, quando uma intriga, uma maledicência de um conhecido nos abalou bastante. Mas, de certa forma, graças a esse mal entendido, nós duas acabamos por nos aproximar. E quando surgiu a ideia de fazer esta série de visitas e esta exposição, eu fiz questão de respeitar a artista e a professora, aquela que criou uma técnica e foi professora a vida inteira. Ela não para de trabalhar.”

"Computer Assisted" (1980): serigrafia de Betty Bettiol
“Computer Assisted” (1980): serigrafia de Betty Bettiol *Reprodução*

 

Betty Bettiol
Pioneira na arte computacional em Brasília, a paulistana Betty Bettiol trabalha desde o início dos anos 1980 com imagens geométricas geradas em computador. Mas sua participação na cena brasiliense vem de antes ainda. Em meados da década anterior, ela já despontava com seu trabalho em gravura com metal. Duas serigrafias, ambas criadas a partir do computador, e uma pintura em óleo sobre tela, deste ano, fazem parte desta mostra.

Betty segundo Lêda: “Conheci a Betty quando ela procurou o meu ateliê na 504 Sul, em cima do ex-Ponto Frio. Ela foi indicada para ter aulas comigo por um amigo em comum, o galerista Oscar Seraphico. Betty teve aulas por dois anos e meio, bem no auge do primeiro grupo de gravadores que criei aqui em Brasília. Logo viramos amigas pessoais e nos frequentávamos bastante, os dois casais. Saíamos para jantar e muitas festas eram dadas lá no próprio ateliê, com muita cerveja e muitos salgadinhos. Hoje me sinto realizada por ter contribuído no desenvolvimento e na profissionalização de uma verdadeira artista”.

De 25/11 até 17/1, na Caixa Cultural (Setor Bancário Sul , Quadra 4, Lotes 3 e 4; 3205-9448). Terça a domingo, das 9h às 21h. Entrada franca. Livre.

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