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Sem óculos, Honestino não foi reconhecido e fugiu de militares em 1968

Mesmo com policial dentro da Kombi na qual estava, líder estudantil conseguiu fugir do veículo e chegou a trocar tiros ao ser perseguido

atualizado

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Divulgação
honestino guimarães
1 de 1 honestino guimarães - Foto: Divulgação

O desaparecimento de Honestino Guimarães, em 1973, ao ser preso pela quarta vez durante a ditadura militar, ainda é um mistério. Até hoje a família não sabe como morreu o líder estudantil, que cursou geologia na Universidade de Brasília (UnB). Honestino é uma figura conhecida da história de Brasília e, agora, documentos recém-divulgados revelam novidades sobre a vida do rapaz, que foi visto pela última vez quando tinha 26 anos.

Os documentos sigilosos liberados pelo Arquivo Público do Distrito Federal no último dia 3 de fevereiro mostram que, mesmo sob forte vigilância do Estado, Honestino Guimarães conseguiu despistar as forças de repressão.

Em 19 de agosto de 1968, o jovem, que já era procurado pela polícia, fugiu dos captores ao não ter sido reconhecido por estar sem os óculos. Mesmo assim, passou por apuros. Naquela noite, uma barreira policial foi montada na estrada entre Belo Horizonte e Brasília, com o objetivo de interceptar a chegada de estudantes à capital federal.

Barreira na estrada
Uma Kombi com três jovens dentro foi parada pelos policiais. Um dos rapazes se identificou como José Miranda da Rocha. Na realidade, era Honestino, que estava com documentos falsos. Após checar os papéis e sem saber que estava com o líder estudantil nas mãos, o responsável pela barreira decidiu encaminhar os viajantes a uma unidade policial.

No relatório produzido posteriormente, o policial Jaime Aires Coelho afirmou que, embora os nomes dos ocupantes da Kombi não constassem nos registros policiais, decidiu enviar os jovens à “Central de Polícia” para que “se efetuasse uma triagem mais perfeita” sobre os detidos. Para Coelho, não havia “uma razão justificável para que eles ali estivessem todos juntos e viajando a Brasília”.

Para escoltar os jovens à Central de Polícia, foi designado o policial José Bibiano Valadão, que ficaria dentro da Kombi. Os outros dois agentes seguiriam a Kombi em uma viatura.

“Necessidade fisiológica”
Valadão sentou-se em um dos bancos traseiros do veículo, ao lado de um dos estudantes, enquanto os outros dois estavam na parte da frente. O percurso seguia tranquilo até o motorista parar o veículo.

O motorista deu sinal que iria parar a Kombi e foi logo acostando a mesma para, em seguida, para-la. O declarante (Valadão) perguntou por que ele tinha estacionado, tendo como resposta que o seu companheiro (José Miranda da Rocha) estava com vontade de fazer uma necessidade fisiológica. Sem a permissão do policial, o referido estudante abriu repentinamente a porta e por ela saiu, quase que correndo

Trecho de depoimento prestado pelo agente Valadão à Secretaria de Segurança Pública

Surpreso, Valadão ficou indeciso se corria atrás do estudante ou se ficava no carro para evitar que os outros ocupantes escapassem. Após um momento de hesitação, decidiu entrar no matagal em que o estudante tinha entrado.

Tiros na escuridão
Durante a perseguição, Valadão escutou disparos e se jogou no chão. Como resposta, sacou o revólver que carregava e disparou tiros para o alto. Depois do susto, tentou encontrar o jovem, mas na escuridão, desistiu.

Ao voltar para a barreira, Valadão e os companheiros relataram a fuga aos superiores. Após interrogarem os dois estudantes detidos, os militares descobriram que o fugitivo José Miranda da Rocha era, na realidade, Honestino Guimarães. Segundo os próprios policiais, eles não reconheceram o líder estudantil porque ele estava sem os óculos característicos.

“O declarante (policial) não conhece o estudante Honestino Monteiro Guimarães, apenas viu sua fotografia há vários meses e, no posto policial, o viu de longe. Na fotografia referida, Honestino estava de óculos e, quando da sua detenção, estava sem os óculos”, consta no registro da Secretaria de Segurança.

 

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Prisão e expulsão da UnB
A fuga naquela noite de 19 de agosto de 1968 apenas adiou a captura. Dez dias depois, a UnB foi invadida para que se cumprisse um mandado de prisão contra Honestino e outras lideranças estudantis. Em setembro, dois meses antes de concluir o curso de geólogo, foi expulso da universidade. No mês seguinte, conseguiu a liberdade por meio de um habeas corpus. A partir de então, entrou na clandestinidade.

A perseguição política fez com que ele se mudasse para São Paulo em 1969 e, posteriormente, para o Rio de Janeiro. Naquele período, foi vice-presidente e, depois, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE).

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Em 1973, acabou preso pela quarta e última vez, acusado de participar de revoltas armadas no Pará. Foi, então, levado para um presídio em Brasília. Mas, durante uma visita no Natal daquele ano, a mãe, Maria Rosa, não o encontrou no local. Até hoje, mesmo com os documentos divulgados, as circunstâncias da morte de Honestino Guimarães são desconhecidas.

Em 12 de março de 1996, a família de Honestino recebeu um Atestado de Óbito, no qual a data da morte constava como ocorrida no dia 10 de outubro de 1973. No entanto, o documento não especificava a causa da fatalidade.

Em 20 de setembro de 2013, Honestino foi oficialmente anistiado. A família pediu a retificação de seu atestado de óbito, para que nele constassem como causa da morte os atos de violência que sofreu quando estava sob a custódia do Estado.

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