metropoles.com

Mulheres que venceram o câncer buscam apoio para projeto de canoagem

Associação Canomama devolve autoestima, conforto psicológico e força física a mulheres mastectomizadas em Brasília. Saiba como ajudá-las

atualizado

Compartilhar notícia

Felipe Menezes/Metrópoles
Brasília (DF), 07/10/2016Grupo de mulheres mastectomizadas treinam canoagem para festival internacionalLocal: Clube No’ah (SCES Trecho 2, 2 – Asa Sul, DF – Clube da Adepol)Foto: Felipe Menezes/M
1 de 1 Brasília (DF), 07/10/2016Grupo de mulheres mastectomizadas treinam canoagem para festival internacionalLocal: Clube No’ah (SCES Trecho 2, 2 – Asa Sul, DF – Clube da Adepol)Foto: Felipe Menezes/M - Foto: Felipe Menezes/Metrópoles

O dia começa com um café da manhã à beira do Lago. Tem bolo de cenoura e café quentinho, adoçado com açúcar demerara. Em volta da mesa improvisada, nove mulheres fortes se abastecem antes de mais um dia de treino. Elas venceram o câncer de mama e reencontraram alento e forças – literalmente, inclusive – no esporte. Agora, se preparam para participar de um festival internacional de canoagem para afirmar que sim, há vida após o câncer. E que ela pode ser muito atlética.

Tudo começou com Larissa. Em 2014, aos 40 anos, a nutricionista se viu diante de um diagnóstico de câncer avançado, de um nódulo que ela pensava ser inofensivo. “Meu médico tinha certeza que não era nada. Quando entrei no consultório para o retorno da biópsia, ele só disse ‘Larissa, não deu bom, não”, se recorda.

A cirurgia para retirada da mama e esvaziamento dos linfonodos foi dias depois. Atleta desde os 9 anos, na época da descoberta da doença Larissa estava engajada na corrida de aventura e andava se dando bem na canoagem. Parou tudo para cuidar da saúde, mas nunca se desligou da sua turma de treinos pelo WhatsApp e pelas redes sociais.

Um dia, recebeu do seu mestre um recado. Uma pessoa da Abreast in a Boat, uma associação de canoagem para mulheres mastectomizadas, havia entrado em contato com ele para dizer que a América Latina ainda não tinha uma equipe como essa. “Larissa, essa missão é sua”, ele disse. Ela nem pensou.

Felipe Menezes/Metrópoles
Equipe Canomama com os professores no Noah, clube onde treinam hoje

 

“Abracei como minha causa. Falei ‘cara, se eu sobreviver a essa parada, isso aí é meu'”. Três meses depois do fim das sessões de quimioterapia, Larissa estava na água, já angariando mulheres para se juntarem a ela.

O projeto virou a Associação Canomama, ainda em fase piloto, que busca divulgar a importância da prevenção, mas também trazer de “volta à vida” mulheres depois de um tratamento que pode ser esgotante tanto física quanto psicologicamente. Por uma questão de meses não foram as primeiras da América Latina. Perderam para a Argentina. Hoje, são oito equipes no Brasil.

De lá para cá, o projeto atendeu 18 mulheres, a maioria delas recuperadas da chamada mastectomia radical, quando os linfonodos são esvaziados. Em alguns casos, a recomendação é pegar leve nos exercícios. Algumas chegam a escutar que jamais poderão sequer carregar a bolsa do lado operado.

Para formar a Canomama, uma equipe de médicos, educadores físicos, nutricionistas e fisioterapeutas oncológicos se juntou para garantir que elas tivessem o melhor resultado possível com segurança. Como a musculatura do braço se enfraquece depois da cirurgia e há risco de linfedema – quando a linfa se acumula no tecido, causando inchaço -, o fortalecimento muscular não apenas melhora a mobilidade, como impede que o líquido fique estacionado, o que causaria o edema.

Novo amor
A militar afastada Deyse Fernandes, de 35 anos, chegou ao projeto logo no primeiro dia. Ela conheceu Larissa em um grupo no WhatsApp de pacientes de câncer de mama. Era atleta nos tempos de Exército, mas uma lesão no joelho a tirou das pistas de corrida. Ao fim do tratamento, já sentia um comichão pela volta às atividades. No primeiro dia, a animação não lhe deu gás o suficiente. Remou 50 metros e pediu para parar.

“Quando pedi para parar, já estava chorando. Eu sentia dor no corpo todo, fraqueza”, lembra. Meses depois, bateu os 3,5 mil metros sem parar e ganhou os 12 kg que havia perdido com a doença.

Sempre fui moleca. Para mim, não era a doença que me deprimia, era o sedentarismo. Aqui, encontrei um novo amor. Minha autoestima melhorou.

Deyse Fernandes

Felipe Menezes/Metrópoles

O projeto conta ainda com histórias de quem nunca tinha tido qualquer intimidade com o mundo dos esportes. A professora Luciene Araújo, de 47 anos, passou pela doença em 2008. Tinha 40% de chances de sobreviver. No tratamento, recuperou a saúde, mas ganhou também 25 kg. Deles, já emagreceu 12 desde que se juntou ao Canomama.

Além da saúde, a gente começa o dia em sintonia com a natureza. E ganhamos amigas. A gente se vê no exemplo da outra. 

Luciene Araújo

Esporte e saúde
A oncologista Gabrielle Scattolin, do grupo Aliança, conta que a prática de atividades física depois do tratamento é recomendada, desde que com acompanhamento apropriado. “É importante inclusive para que elas mantenham o seu peso normal, porque o sobrepeso é um fator que pode influenciar no aparecimento e depois na volta da doença”, explica. “E, além do bem estar físico, ainda existe o bem estar psicológico pela prática”, continua.

Para canoagem, por exemplo, um exercício basicamente de braços, o tempo depois da cirurgia para o início da atividade é de 45 a 60 dias. Para atividades mais suaves, com 30 dias a paciente já costuma estar liberada. “A vida ficar normal. O câncer estigmatiza muito a pessoa, a deixa carimbada como uma pessoa doente. Mas ele é uma doença que tem cura”, diz a especialista.

Agora, a equipe da Canomama treina para tentar participar do festival internacional Ka Ora de Dragon Boat, modalidade em que 20 atletas remam juntas num bote, na categoria sobreviventes de câncer de mama. O festival, que é o primeiro do Brasil, será no próximo dia 23 de outubro, em Santos (SP).

Mas, como o projeto ainda está em fase piloto, elas têm contado com estruturas emprestadas para treinar. Hoje, o espaço cedido é do clube Noah, mas só até o dia do festival. Depois, elas ainda não sabem para onde vão. Além disso, elas ainda precisam de recursos para chegarem a São Paulo.

Felipe Menezes/Metrópoles

 

Para uniformes, hospedagem, alimentação e passagens para as atletas, Larissa calcula uma média de R$ 12 mil. Para que os treinadores possam acompanhá-las, R$ 15 mil. Fora isso, elas ainda precisam de dinheiro para tirar o projeto do status “piloto”.

Querem uma sede, canoas, coletes salva-vidas, professores e de pessoal para levar a parte administrativa para frente. “Hoje, temos fila de espera, mas não temos estrutura para atender essas mulheres. Se o projeto for implementado, atenderemos mais mulheres”.

Para ajudar:
Quem quiser ajudar, pode entrar em contato com a Larissa pelo telefone (61 99216-1806) ou por e-mail (larabrave@hotmail.com).

Compartilhar notícia