Flamengo e Vasco foi bem mais divertido do lado de fora
Padrão Fifa: flamenguistas e vascaínos se confraternizaram em longas filas em frente ao estádio, enquanto o jogo do lado de dentro….
atualizado
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Pearl Jam ou Beyoncé. Flamengo ou Vasco da Gama. Pouco importa que som tu escutes, que time tu curtas. Já pode dar por certo: ou se chega horas antes do combinado ou se amarga uma filinha padrão Fifa às portas do Estádio Nacional Mané Garrincha.
Nossa querida arena custou módicos R$ 1,8 bilhão aos cofres públicos e, talvez por tamanha restrição orçamentária, tem apenas uma ou duas portas de entrada para o respeitável público. Todo o resto dela está permanentemente cercado por um alambrado de ferro que se estende por largos quilômetros. Sorte do prezado contribuinte é que jogo de futebol nenhum por estas bandas, e com estes preços praticados, daria conta de lotar as dependências do modesto estádio.
Então ontem à noite, o tal Clássico das Multidões (sic) levou apenas 26.917 almas à arena multiuso. Muito pouco para o tamanho das torcidas aqui envolvidas. Mas já o suficiente para fazer com que boa parte dos interessados tenha conseguido ocupar sua cadeirinha com a bola já rolando.
E, cá entre nós, Flamengo x Vasco estava bem mais divertido do lado de fora. Com as filas gigantes a se perderem em voltas pelo asfalto, flamenguistas e vascaínos acabaram resignadamente espiando a partida com os ouvidos. Alaridos e gemidos coletivos brotavam do colosso de concreto e inquietavam a rapazida do lado de fora. Os mais hipsters tentavam acompanhar e compreender essa trilha sonora através de twitters e snapchats. Os mais vintage redescobriam o radinho de pilha ou esticavam a vista até o gatonet de algumas das barraquinhas de bebidas & conveniências.
Pou. O Flamengo está em cima do Vasco, hein? Parece que o Martín Silva fechou a porteira. E o Guerrero está jogando? Bola para o Vizeu!… Ah, mas o menino Vizeu está no banco. #ForaMuricy
Cartografia da bola
Enfim vencida a precariedade administrativa de nossos promotores esportivos, o torcedor – que ali deixou ao menos R$ 57,50 + dois quilos de alimentos não-perecíveis – enfim poderia ter diante dos olhos tudo aquilo que já estava a ouvir de longe. E como não se deixar tomar por certa decepção?
Conforme já esmiuçamos aqui neste “Metrópoles”, Flamengo e Vasco brindaram a torcida candanga com muita correria e pouca bola. O empate em 1 x 1 foi um castigo para as intenções flamengas, um tanto mais preocupadas com a tabela do Campeonato Carioca do que o Vasco, invicto e tranquilão, seguindo na maciota.
O que se pôde ver ali das arquibancadas do Mané Garrincha, que escapava às transmissões televisivas do gatonet, era o panorama geopolítico da peleja, a cartografia do jogo de bola. Percebia-se claramente que o time de Muricy Ramalho estava diluído pelo gramado, uma atitude frouxa evidenciada pelos amplos espaços vazios deixados entre cada jogador vestido de vermelho e preto. Enquanto a equipe de Jorginho estava bem mais coesa e compactada, movendo-se em blocos, como pede o protocolo do futebol moderno.
Coitado do Paolo Guerrero. O atacante peruano já tinha passado o dia inteiro tentando cumprir a distância aérea entre Montevidéu e Brasília a tempo de chegar para o clássico. E quando entrou em campo, ele viu os companheiros o deixarem a deriva, perdido entre os beques vascaínos, sem conseguirem dele se aproximar com a eficácia e a frequência esperadas.
Esse desenho tático ficou evidente em meados do segundo tempo. Foi quando o Vasco melhor afinou sua última linha de defesa e foi lentamente subindo com ela em direção ao grande círculo, fechando os espaços para um Flamengo que já estava cansado das pernas. Quando a bola caía sob domínio do Fla, os jogadores simplesmente não tinham para onde prosperar, a linha vascaína avançando para cima deles enquanto os próprios companheiros se deixavam permanecer parados, em vez de se mexer para abrir espaços e dar opções de jogadas.
Muricy Ramalho terá trabalho para quebrar essa atitude. Seu time alterna momentos de ímpeto ofensivo, com escaladas um tanto afobadas ao ataque, e largos momentos de modorra e aparente cansaço tático, técnico, existencial. Já o Vasco parece estar bem tranquilinho com Jorginho. O time já vem jogando junto desde o ano passado e atualmente sobra entre seus pares no Rio de Janeiro, o que não quer dizer muito, convenhamos. Mas o Vasco, esta temporada, pode arriscar a sorte grande na Copa do Brasil enquanto leva o Campeonato Brasileiro da Segunda Divisão sem sobressaltos.
(Será?)