metropoles.com

Impacto da pandemia: transplantes caem para patamar de 2017 no Brasil

Falta de doadores e ausência de vagas em UTIs fizeram com que a taxa de transplantes despencasse após o início da pandemia de Covid-19

atualizado

Compartilhar notícia

Metrópoles/Arquivo
órgãos
1 de 1 órgãos - Foto: Metrópoles/Arquivo

Além de estar relacionada diretamente com a morte de mais de 290 mil brasileiros, a Covid-19 afeta as chances de sobrevivência de pacientes com doenças crônicas que precisam de transplantes de órgãos. Segundo dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), a quantidade de procedimentos dessa natureza realizados no ano passado ficou bem abaixo do esperado.

A expectativa era de cerca de 20 transplantes para cada grupo de 1 milhão de pessoas. O número atingido foi de 15,8 – patamar semelhante ao registrado em 2017 –, e o cenário para 2021 é ainda pior.

Em números absolutos, o país registrou 14.499 transplantes no ano passado. Em 2019, computou 24.257 procedimentos realizados. Ainda de acordo com a ABTO, a demanda de transplante de córnea em 2020, por exemplo, era de 18.913 cirurgias, mas somente 7.127 foram feitas. Dos 1.681 pacientes que necessitam de transplante de pulmão, apenas 65 conseguiram ser atendidos.

A região que mais fez transplantes foi a Sul, com 31,4 doadores efetivos para cada grupo de 1 milhão de pessoas. A Norte, em contrapartida, tem a pior média do país: apenas 2,1 doadores por milhão de habitantes.

A situação também se repetiu entre os pacientes pediátricos, apesar de menos afetados pelo coronavírus: a queda foi de 17% em relação ao ano anterior. Das 573 crianças que entraram na fila de transplante em 2020, 56 morreram enquanto esperavam pelo procedimento.

Relação direta com pandemia

Diretora da ABTO, Luciana Haddad explica que a pandemia é a principal responsável pelo impacto nas doações e nos transplantes no último ano. “A relação é direta. Observamos que, quando uma região estava enfrentando um momento pior com a Covid-19, as cirurgias também caíam”, destaca.

A falta de doadores é o que mais dificulta o andamento do processo. Com a pandemia, menos pessoas podem ser doadoras, e a maioria absoluta dos pacientes que falecem em decorrência do novo coronavírus não é elegível para doar órgãos. Pouco depois de constatado o óbito, é feito um exame de Covid-19. Se o resultado for positivo, o paciente é contraindicado para doar.

De acordo com a Nota Técnica nº 34/2020, do Ministério da Saúde, o doador que teve contato com casos suspeitos a menos de 14 dias também deve ser descartado. Ter tido suspeita clínica de Covid-19 há menos de duas semanas é outro impeditivo para a doação.

“Com todo mundo em casa, também cai a quantidade de acidentes automobilísticos e traumas, diminuindo ainda mais as possibilidades de doação. A quantidade de pessoas que precisa receber um órgão, em contrapartida, só aumenta“, assinala a médica.

Outro problema é a lotação das UTIs. Uma pessoa com morte cerebral, que pode ser doadora, precisa ser mantida pelas máquinas até que se façam exames de compatibilidade e o transplante possa ser executado. Porém, com o país à beira de um colapso hospitalar, os leitos de UTI estão cada vez mais escassos, e a preferência é para os pacientes com Covid-19.

“Nossa estrutura está mantida. Se houver doador, iremos fazer a captação o mais rapidamente possível”, enfatiza a diretora da ABTO. Segundo ela, no fim de 2020 houve recuperação na quantidade de transplantes, mas, em fevereiro deste ano, já foi percebida redução importante nos procedimentos. “A tendência é piorar, nossa expectativa é de que a quantidade de cirurgias fique bem abaixo da meta este ano”, afirma.

A médica explica que o paciente na fila do transplante, além de ser considerado grupo de risco para a Covid-19, tem risco de morrer de mais de 50% enquanto aguarda o órgão. A cirurgia é urgente. “A pessoa que necessita de um pulmão, de coração, não sobrevive ao coronavírus”, frisa Luciana Haddad.

0

Compartilhar notícia