Autismo: insistência da mãe por diagnóstico garantiu avanços da filha

O diagnóstico pode ser um divisor de águas para a autonomia da criança. No Brasil, infelizmente, ele costuma demorar

Érica Montenegro
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“Não exagera, não espera isso da sua filha. Já agradece que ela está falando.” Esta frase foi dita por uma neuropediatra a uma mãe que tem uma filha com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Eu atendo esta garotinha há anos e, além de falar, escreve e faz mil e uma outras coisas. Ela tem limitações, mas é independente, feliz e confiante. Você já imaginou o que se passa com uma mãe que ouve isso? Quais são os desafios? Com quem elas se amparam? O que de fato é possível se esperar?

Para responder a todas estas questões, gostaria de apresentar Helena, 9 anos, e seu lindo cordel:

Não sei o que é cordel
Mas sei o que é amizade
E ser gentil e atenciosa
E brincar com todos quando dá vontade
E respeitar quem não quer
Isso é viver em sociedade

Gosto de caminhar e de ler
Ajudar é a minha especialidade
Gosto muito de jogar e de andar de bicicleta
Gosto muito da minha sinceridade
Nem todos me entendem
Mas gosto da minha personalidade

Hyasmine, mãe da Helena, lutou, desde os 2 anos de sua filha, para que um neuropediatra batesse o martelo e pudesse esclarecer se sua filha tinha autismo ou “era apenas coisa da sua cabeça”. Hyasmine, como muitas outras mães, tinha esperança de que fosse um exagero de sua parte. Mas não era.

Se você é mãe ou pai de uma criança autista, saberá a duras penas que neuropediatras brasileiros dificilmente fecham diagnóstico antes dos 7 anos, diferentemente dos médicos dos Estados Unidos ou do Reino Unido. Nestes países os diagnósticos são feitos o quanto antes.

Este é um equívoco que precisa ser revisto. Quanto mais cedo for oferecido às crianças com TEA terapias adequadas, maiores são as chances de desenvolvimento. Outro ponto relevante é o seguinte: se seu filho não tem um diagnóstico, mas também não se identifica com outros pares de sua idade, seu filho fica em um limbo. Um limbo que pode ser cruel e solitário. E não é só o filho, mas a família.

De tal modo que saber os marcos de desenvolvimento no primeiro ano de vida é fundamental para que se possa distinguir o que é esperado ou não. O livro Transtornos da Aprendizagem – Abordagem Neurobiológica e Multidisciplinar esclarece: “São indicações absolutas para encaminhar imediatamente para avaliação mais detalhada quando:

• Não balbucia aos 12 meses,
• Não gesticula aos 12 meses – não aponta e não abana,
• Tem ausência de palavras com significado aos 16 meses,
• Não consegue fazer frases de duas palavras espontaneamente e não ecolálicas aos 24 meses,
• Sofreram alguma perda de linguagem ou habilidades sociais em qualquer idade.”

Faça como a Hyasmine, cobre um laudo para confirmar ou não o diagnóstico. Faça disso sua obsessão. Isso pode ser um divisor de águas para a autonomia e a felicidade do seu filho. Entretanto, não deixe que a falta do diagnóstico impeça o início das terapias e dos estímulos que o seu filho precisa.

A partir do diagnóstico, surgirão novos desafios e um deles que destaco é sobre suas expectativas de quando engravidou. São sentimentos dicotômicos, intensos e que precisam ser cuidados. Se apoie em outras famílias com crianças com autismo, participe dos grupos de apoio, faça terapia.

Nossos filhos, neurotípicos ou não, nos impulsionam a sermos melhores. Cada um com seus próprios desafios. A Helena sabe que não é fácil ser autista, quando sua mãe contou para ela, Helena disse “Não gostei não” e saiu do quarto.

Por mais que eu queria escrever e romantizar o diagnóstico, seria impróprio da minha parte. Pois, não há dúvidas de que é difícil, não há dúvidas de que algumas crianças desenvolverão poucas habilidades funcionais. Mas, você será capaz e sua filha ou filho te ensinará muito nesta trajetória. Não importa o diagnóstico, não importa se a caminhada será mais longa e difícil, o amor prevalecerá. Mas prepare-se para isso.

*Christiane Fernandes é pedagoga e psicopedagoga, especialista em dificuldades de aprendizagem pela Universidade de Brasília (UnB). É fundadora da Filhos – Educação e Aulas, empresa que atua na área de educação oferecendo aulas particulares em casa. Possui ainda MBA em Gestão Empresarial com Foco em Estratégia pela Fundação Getúlio Vargas

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