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Há 5 semanas, igreja holandesa faz culto para proteger imigrantes

Na Holanda, a polícia não pode atuar durante cerimônia religiosa para cumprir determinação de deportar família armênia

atualizado

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Captura família
1 de 1 Captura família - Foto: Reprodução/twitter

Cinco semanas depois de um pastor holandês ter iniciado o que parecia ser um serviço religioso completamente comum, o culto continua, como uma espécie de maratona de orações que envolve centenas de pessoas e não mostra indicações de esmorecimento.

A igreja Bethel, em Haia, está tentando impedir a deportação de uma família armênia que teve negado seu pedido de asilo depois de viver quase nove anos na Holanda, apesar de eles terem afirmado que estariam em perigo caso retornassem a seu país. As informações são do The New York Times.

A Bethel e a Igreja Protestante da Holanda, da qual ela faz parte, estão tirando vantagem de uma lei holandesa que, na maioria das circunstâncias, impede que as autoridades conduzam operações em um local no qual serviços religiosos estejam sendo realizados.

A estratégia deles é enganosamente simples: abrigar a família de imigrantes na igreja e garantir que haja um serviço religioso em curso o tempo todo. No começo, colocar a ideia em prática era um desafio logístico; algumas pessoas começaram a organizar uma escala, pedindo que pastores fizessem turnos e ocupassem horários vagos no cronograma.

Mas o esforço capturou a imaginação do país, e por isso foi se tornando mais fácil administrar o processo. “Já existem mais de 450 pastores, sacerdotes, diáconos e líderes religiosos de todo o país, e de toda denominação, que pediram para fazer parte da escala de serviços religiosos”, disse Axel Wicke, o pastor da Bethel, em entrevista na quinta-feira (29/11).

“Tivemos ajuda até do exterior, houve sermões em inglês, francês e alemão”, ele disse. “Isso nos comoveu muito. Muitas vezes vejo um pastor entregar o púlpito a outro, de denominação diferente, com a qual o primeiro nada teria a ver em termos litúrgicos”.

Ameaças
A família Tamrazyan, formada por pai, mãe e três filhos com 21, 19 e 14 anos, disse ter saído da Armênia depois de receber ameaças de morte por conta do ativismo político do pai. As pessoas que estão trabalhando com a família se recusaram a dizer em que causas políticas ele estava envolvido, ou quem poderia desejar atacá-lo.

A organização Freedom House classifica a Armênia, um pequeno país do Cáucaso, como “parcialmente livre”, com instituições democráticas, mas liberdade de expressão limitada. Derk Stegeman, um pastor da igreja protestante que vem servindo como porta-voz dos Tamrazyan, disse que eles estão conversando com as autoridades holandesas, e que existe alguma esperança de que o governo reverta sua decisão.

Lennart Wegewijs, porta-voz do Ministério da Justiça e Segurança holandês, que lida com questões de imigração, disse que não podia explicar a posição do governo. “Nossa política é não fazer declarações sobre casos individuais.”

Autoridades da Igreja Protestante da Holanda disseram que os pais não haviam dado entrevistas e que queriam ser identificados apenas pelo sobrenome, Tamrazyan, em parte para proteger familiares que ainda vivem na Armênia contra recriminações.

Mas Hayarpi, a filha mais velha do casal, falou publicamente. Em vídeo postado em setembro no Twitter, ela pediu que as pessoas apelassem ao governo em benefício de sua família. “Vocês têm o poder”, ela disse, em holandês. “Por favor, usem-no em nosso favor, e no de 400 crianças como nós. Somos inocentes”.

Asilo
Um tribunal holandês concedeu asilo à família no país. Stegeman disse que o governo recorreu da decisão e foi derrotado de novo, e fez novo apelo, igualmente infrutífero. Só na terceira apelação o governo obteve uma decisão de que poderia deportar a família.

“Eles passaram quase seis anos envolvidos em processos judiciais”, disse o pastor. “Agora estão agradecidos por se sentirem seguros”.

Nos termos da lei holandesa, o governo pode abrir exceções às leis usuais de imigração para acomodar famílias com filhos que tenham vivido na Holanda por cinco anos ou mais. Mas o governo, que rejeita a maior parte dos pedidos de exceção, se recusou a usar essa prerrogativa em benefício da família armênia.

As regras de imigração e asilo do país se tornaram um ponto contencioso politicamente, nos últimos anos, e os conflitos se agravaram desde a onda de imigração para a Europa em 2015 e 2016.

Depois que administrações anteriores foram acusadas de ser lenientes demais, o governo holandês formado no ano passado adotou abordagem mais dura, o que lhe vale críticas de outro tipo.

Em setembro, ordenou a deportação à Armênia de duas crianças que viveram a maior parte de sua vida na Holanda e não falam armênio. Mas uma onda de protestos levou as autoridades a lhes conceder residência.

A família que está na igreja Bethel inicialmente buscou refúgio em uma igreja de Katwijk, a cidade costeira em que vivia. Mas a igreja não tinha recursos para manter serviços religiosos 24 horas por dia, e temia ação de agentes de imigração.

Por isso, os Tamrazyan aceitaram o convite para usar um apartamento na igreja Bethel, uma construção de tijolos vermelhos aninhada entre edifícios baixos de apartamentos. Eles chegaram às 13h30 do dia 26 de outubro, disse Wicke, quando a maratona religiosa começou.

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