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Derrotada, extrema direita recebe votação recorde na França

Macron viu sua vantagem sobre Marine Le Pen diminuir pela metade em relação ao segundo turno de 2017. Mas extrema direita fracassa novamente

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Macron e Le Pen se enfrentam no segundo turno
1 de 1 Macron e Le Pen se enfrentam no segundo turno - Foto: Getty Images

Marine Le Pen sofreu neste domingo (24/4) sue terceira derrota consecutiva nas eleições presidenciais francesas. Mas mesmo sendo mais uma vez ultrapassada por Emmanuel Macron, Le Pen tentou celebrar o resultado: nunca a extrema direita francesa conseguiu tantos votos numa eleição presidencial no país.

Em 2017, logo após ser eleito pela primeira vez, Macron prometeu que faria de “tudo nos próximos cinco anos para que eles [eleitores de Le Pen] não tenham mais motivos para votar nos extremos”. No entanto, ao longo do seu mandato, o eleitorado de extrema direita só cresceu.

Com 41,8% dos votos, segundo as primeiras estimativas – baseadas em boletins eleitorais –, Le Pen ampliou seu eleitorado em quase oito pontos percentuais em relação a 2017, quando também enfrentou Macron no segundo turno. Foram 3 milhões de votos a mais e a primeira vez que um radical de direita ultrapassou a marca de 40% dos votos.

No primeiro turno, Le Pen e Éric Zemmour, outro extremista de direita, já haviam conseguido 30% dos votos.

Cinco anos atrás, Le Pen havia ficado 32 pontos atrás de Macron no duelo. Desta vez, a diferença foi de 16,4 pontos. Em alguns momentos logo após o primeiro turno, os dois candidatos se viram separados por apenas quatro pontos em algumas pesquisas.

O quadro só começou a ficar mais confortável para Macron após o presidente adotar uma postura mais combativa no segundo turno e passar a cortejar eleitores indecisos, cedendo em vários pontos da sua agenda pró-mercado ao mesmo tempo que denunciava o programa extremista de Le Pen.

Em 2017, Macron sempre esteve pelo menos 20 pontos à frente de Le Pen em todos os cenários logo após o segundo turno. Macron também soube explorar fraquezas de Le Pen, especialmente no debate do segundo turno, quando mencionou as ligações da rival com a Rússia.

Se em eleições passadas a presença de um radical no segundo turno era garantia de vitória certa para um moderado, desta vez o pleito demonstrou que as forças de centro perderam um pouco da sua antiga força para barrar radicais, embora ainda tenham energia para obter uma vitória decisiva.

Ao conceder a derrota, Le Pen tentou agitar seus apoiadores com a escala da sua votação. “Nossa vontade de defender os franceses só foi reforçada (…) Nessa derrota, não posso deixar de ver uma esperança. (…) Eu prosseguirei com meu comprometimento com a França e os franceses”, disse.

Crescimento constante, mas ainda não decisivo

Numa perspectiva mais longa, a votação de Marine Le Pen mostra como a extrema direita se fixou como uma força relevante na paisagem política francesa. Em 1974, quando Jean-Marie Le Pen, o pai de Marine, lançou sua primeira candidatura presidencial, a extrema direita obteve apenas 0,75% dos votos no primeiro turno.

No entanto, em 2002, Jean-Marie Le Pen já havia conseguido conquistar 16,86% do eleitorado no primeiro turno, deixando o establishment político em choque ao superar os socialistas, à época uma das forças tradicionais da paisagem política francesa, impulsionado também por uma alta abstenção que castigou candidatos centristas.

Naquela ocasião, porém, o velho Le Pen acabou sofrendo um massacre na segunda rodada, ficando esmagadores 62 pontos atrás do então presidente conservador Jacques Chirac, que foi apoiado por uma “frente republicana” de diferentes forças políticas que se uniram em torno do seu nome para derrotar a extrema direita.

Nas duas décadas seguintes, a diferença entre moderados e a extrema direita foi diminuindo pouco a pouco. Marine Le Pen, em sua segunda campanha presidencial em 2017, ainda teve que enfrentar mais uma “frente republicana” que se uniu para apoiar Macron, mas esta já demonstrava fissuras em relação a 2002.

Apesar de ter ficado 32 pontos à frente de Le Pen cinco anos atrás, Macron não garantiu a mesma diferença esmagadora de Chirac, e ainda viu o quarto colocado naquele pleito, o idenpendente de esquerda Jean-Luc Mélenchon, recusar-se a endossar sua campanha no segundo turno. Em 2022, Mélenchon, que desta vez ficou em terceiro lugar, repetiu a postura e no máximo pediu para que seus eleitores não votassem na extrema direita ou em Le Pen.

“Normalização” e impopularidade de Macron ampliam eleitorado

O resultado de 2022 sinaliza que o programa de “desdiabolização” ou “normalização” imposto por Marine Le Pen ao Reagrupamento Nacional (RN), a sigla fundada originalmente por Jean-Marie como Frente Nacional (FN), conseguiu expandir sua base.

Com Le Pen no comando a partir de 2011, o RN passou a cortejar eleitores de zonas que sofrem com a desindustrialização da França usando muitas vezes um discurso com bandeiras da esquerda, focando em temas como salários, pensões e custo de vida.

Nesta campanha, Marine Le Pen dobrou a aposta no discurso socioeconômico, deixando muitas vezes em segundo plano a velha agenda xenofóbica e anti-UE do seu grupo político, com o objetivo de expandir a base e fornecer uma forma de populismo menos controverso – ainda que na superfície – para o eleitorado em geral.

A estratégia começou a se desenhar de maneira mais concreta ainda em 2015, quando ela expulsou seu próprio pai da legenda, após Jean-Marie mais uma vez provocar repúdio por minimizar o Holocausto.

Um segundo olhar no seu programa, no entanto, revela que as velhas pautas de extrema direita continuam lá, embora com vocabulário menos explícito. Em vez de defender um “Frexit”, Le Pen passou a falar em “renegociar tratados”. A saída da Otan havia virado “sair do comando unificado” da aliança, entre outros subterfúgios.

Ainda assim, o resultado mostrou que Le Pen conseguiu, efetivamente normalizar o RN para uma parte ainda maior do eleitorado. Ele ainda se beneficiou com desencantamento de parte do eleitorado com Macron – a reprovação do presidente chega a 58% – conseguindo superar Mélenchon no primeiro turno como a principal alternativa ao atual chefe do Executivo, pintado por críticos como um “presidente dos ricos”.

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Os limites de Marine Le Pen

No entanto, o bom resultado em 2022 – para os padrões do RN – pode ser uma faca de dois gumes para Marine Le Pen. Por um lado, a mantém como uma protagonista potencial para o pleito de 2027 – ela tem apenas 54 anos de idade – e serve de argumento para insistir no curso de “normalização” do partido.

Por outro lado, uma terceira derrota consecutiva e a persistente falta de uma vitória concreta pode reforçar as críticas de alguns segmentos da extrema direita, que ainda se mostram descontentes com a estratégia de suavização do discurso do RN. Apesar de ter tentado celebrar a “derrota”, a campanha também mais uma vez evidenciou algumas das limitações de Le Pen, especialmente sua falta de traquejo durante o debate com Macron, quando ela pareceu intimidada.

Neste pleito, Marine Le Pen ainda teve que lidar com a candidatura independente do polemista radical Éric Zemmour, que emulou o antigo estilo de Jean-Marie e tentou tomar o lugar de Marine como principal nome da extrema direita. Zemmour acabou desidratando ao longo da campanha, mas os 7% dos votos que recebeu evidenciaram o ensaio de um racha promovido por setores da direita radical. Esse descontentamento está presente dentro do próprio clã Le Pen e foi explicitado com o endosso que Zemmour recebeu da jovem deputada Marion Maréchal Le Pen, sobrinha de Marine, e uma das estrelas da extrema direita francesa.

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