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Deficientes visuais, atletas de Futebol de 5 conhecem o Mané Garrincha

O grupo teve a oportunidade de pisar no gramado do estádio, trocar experiências com o zagueiro Lúcio e ganhar camisas autografadas

atualizado

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1 de 1 capa-cegos - Foto: Andre Borges/Esp. Metrópoles

Imagine você, amante do esporte, poder apenas ouvir uma partida de futebol e deixar a imagem do jogo por conta da imaginação. Ter um ídolo, mas não saber como é a aparência dele. Pense em como seria amar um time de futebol, mas nunca ver a torcida lotar o estádio, porém, mesmo assim, se arrepiar ao ouví-la cantando. Uma das patrocinadoras da Copa América esteve, na última terça e quarta-feira (18 e 19/06/2019), gravando um vídeo promocional com três atletas de Futebol de 5 no Estádio Mané Garrincha. Eles também tiveram a oportunidade de conhecer o zagueiro Lúcio. A emoção dominou todos os sentidos de Bruno, Alexandre e Abraão.

Aos 30 anos, Bruno Gomes, nascido no interior de Minas, mora em Luziânia, trabalha como atendente acadêmico na secretaria de uma faculdade e ainda é atleta de Futebol de 5, modalidade destinada a pessoas com deficiência visual. Bruno perdeu a visão, aos 9 anos, devido a um tumor que atrofiou o nervo óptico. Ele conta como a sua vida mudou depois que veio para a capital.

“Foi tudo novo, porque na minha terra natal eu não andava sozinho, eu não usava bengala. Quando eu cheguei aqui em Brasília, tive de aprender a me deslocar sozinho.” Flamenguista e fã de Éverton Ribeiro, ele só conheceu o Futebol de 5 quando chegou ao Planalto Central, mas, antes, desenvolveu o seu jeito para praticar o esporte.

“Eu vestia uma sacolinha para poder ouvir o barulho da bola. Acabava com todas as sacolinhas de casa, chegava a comprar pacote de sacolinha para poder jogar”, conta Bruno, com bom humor.

No primeiro dia de gravações, os três atletas tiveram uma experiência tátil no interior do estádio com um tabuleiro tático, com o qual puderam aprender como os jogadores se movimentam em campo e como uma partida de futebol se desenvolve.

O treinador deles, Marcelo Ottoline, de 49 anos, explica a importância da prática: “O mais importante para o pessoal que não enxerga é construir um mapeamento mental do que está acontecendo. Eles criam na cabeça deles uma imagem daquilo que a gente está narrando. Então, ficar só na oralidade, que é como faz muito o locutor no rádio, dá uma dimensão.”

No segundo dia, eles estavam no Mané Garrincha novamente, mas não sabiam o que ia acontecer. “Tô no escuro hoje (quarta), não sei o que vamos fazer. Já me falaram que vai ter surpresa, eu não faço a mínima ideia do que pode ser.” Mal sabiam eles que, no mesmo ambiente, porém mais afastado, estava Lúcio, o zagueiro do pentacampeonato do Brasil.

O jogador contou que já vivenciou a prática do Futebol de 5. “Atuei de olhos vendados para saber como que é para eles, e foi legal. Para eles é mais fácil, porque já têm o costume, já estão habituados a jogar, a ouvir o som que a bola faz.”

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Surpresa!
Depois de quase 2 horas esperando o início da gravação, Bruno, Alexandre e Abraão foram chamados para o gramado do estádio. “Achei que já estava finalizando a surpresa e ainda não tinha nem começado. Foi muito emocionante!”, lembra Bruno.

O jogador apareceu, abraçou todos eles e entregou camisas do Brasil com o nome dos atletas em Braile. A altura de Lúcio surpreendeu os três. Alexandre, o mais baixo deles, brincou que não passaria por ele na defesa.

Marcelo ficou emocionado com o encontro. “Não dá… é bom demais. Feliz por eles!” e desabafou: “A gente se envolve muito com cada um. O Alexandre não pode mais jogar bola. Ele está com uma lesão séria no fêmur, provavelmente vai ter de fazer uma cirurgia para colocar prótese. Tem o Abraão, de 40 anos, também está próximo de parar de jogar e o Bruno, com uma série de dificuldades. Cada um, para estar aqui hoje, veio de ônibus.”

O local de treino deles é o Centro Integrado de Educação Física (CIEF), na 907/908 sul. As práticas acontecem às segundas, quartas e sextas. “Nós temos muitas dificuldades, você não faz ideia do tanto. É a bola para treinar, é o local, é não estar chovendo. Na hora de viajar, contar com a Secretaria de Esportes para poder atender o pleito com o programa de incentivo que eles têm, é arranjar uniforme e, enfim, é uma luta cotidiana”, diz o treinador.

Todas as barreiras que eles têm de quebrar na rotina tornam-se pequenas perto de momentos de encontro com alguém que representa tanto para eles, como Lúcio. “Não tem nada envolvido aqui que não seja o lado emocional e é de uma importância tão grande, que a gente não consegue mensurar. E dá um gás extra para continuar. Bota gás nisso! O Lúcio é inspiração como atleta.”

O zagueiro assinou a camisa de cada um e, após a finalização da gravação, seguiu no centro do campo conversando e trocando experiências. “A gente estava conversando sobre os campeonatos que a gente (os atletas deficientes visuais) participa, o que ele pretende fazer após encerrar a carreira. Ele disse que vai fazer uma visita no nosso treino, também, até para dar oportunidade para os outros atletas que não puderam estar aqui, de conhecer ele e se motivar, se dedicar mais ao futebol”, revelou Bruno.

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